“A
quien dijo que todo está perdido yo vengo
ofrecer mi corazón” (Mercedes Sosa)
Nosso
plano para este fim de ano era simplesmente desejar a todos que nos leram ou
nos leem um feliz natal e um 2017 maravilhoso e promissor.
Infelizmente
a conjuntura não tem colaborado, Portanto, enviamos um,
mapa e uma bussola como o presente. É o melhor que podemos ter quando os
mares estão agitados e os caminhos são desconhecidos.
Além
disto, oferecemos nosso coração e nossa mente e a disposição de caminhar ombro
a ombro com todos que procuram construir uma sociedade que tenha a
solidariedade e cooperação como princípio e não a competição e a exploração.
Que venha
2017.
NORTE
“Salta
aos olhos que, para obter a porcentagem máxima, é necessário trabalhar 49 anos.
Trocado em miúdos, um jovem que ingresse no mercado de trabalho com carteira assinada
aos 16 anos pode se aposentar aos 65 com os 100% da média prevista pelo sistema
geral da previdência se ele não tiver enfrentado um único mês de desemprego” (Emilio Gennari).
“Imagine que o jovem tenha começado a contribuir aos 23 de idade e
decida completar os 49 anos de contribuição. Isso significa que o benefício
integral sairá quando ele já estiver com 72 anos. Ou seja, um mês depois dos 71
anos e 11 meses da esperança de vida média dos homens do país. As perspectivas
melhoram no caso de uma mulher que, nas mesmas condições e esperando viver pouco
mais de 79 anos, ainda poderia apostar em gozar de 7 anos de aposentadoria” ( Emilio Gennari)
“Os dados revelam que dez mil brasileiros aumentaram para
172.000 o número de pessoas com fortunas que superam um milhão de dólares. Um
sinal de que, como viemos constando ao longo do tempo, a crise continua fazendo
bem aos setores abastados da população” (Emílio Gennari)
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Emilio Gennari – Educador Popular
E-mail:
epcursos@gmail.com
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Crise ou estagnação?
A
poeira levantada pela vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos
Estados Unidos mergulhou o mundo numa nuvem de especulações, incertezas e
temores. O alvoroço assim produzido impede de olhar com objetividade para os
movimentos da economia que moldarão e limitarão os projetos a serem concretizados
a partir da sua posse, em 20 de janeiro. No momento, Trump alterna recuos e
opções arrojadas, apostas que, aparentemente, contradizem os rumos da política
externa dos democratas e escolhas de auxiliares cujas posições minam as linhas
atuais das pastas que irão assumir a fim de calar as vozes destoantes que vierem
a se erguer contra o seu governo. Seja como for, é cada vez mais claro que as
propostas de campanha devem passar pelo crivo das consequências e redesenhar as
expectativas criadas no seu eleitorado. Ainda que bem orquestrado, o circo da
política não escapa às leis da economia e aos poderosos interesses que estão em
jogo. Três exemplos ajudam a ilustrar o desafio de acertar as promessas de
palanque com os números da realidade:
1. Se forem
concretizadas as propostas de redução dos impostos das empresas, das pessoas
físicas e sobre a repatriação de capitais, o novo governo dos EUA não terá
recursos para bancar os programas de infraestrutura e modernização das forças
armadas anunciados na campanha eleitoral. E, se a opção para aumentar a
disponibilidade de fundos recair sobre os cortes nas áreas sociais, é possível
que o impacto das medidas alimente contra ele o descontentamento que levou
muita gente a escolhê-lo como presidente.
2. No início de
dezembro, Trump interveio junto a administração do estado de Indiana a fim de
garantir a isenção fiscal de 7 milhões de dólares para a Carrier, produtora de
equipamentos de ar condicionado e calefação do grupo United Tecnologies, que ameaçava
levar 1000 empregos para a cidade de Monterrey no México. Apesar de garantir
momentaneamente a não desativação desta unidade, o grupo ainda pretende
transferir para o país vizinho 1300 empregos de outras plantas na que se
configura como uma chantagem para obter benefícios do estado sem oferecer
nenhuma contrapartida, uma vez esgotada a margem de manobra do poder público.
Resta saber qual é o limite que Trump estabelecerá para situações como estas
que devem encompridar a lista de “empresários pedintes” em busca de meios
fáceis e rápidos para ampliar os lucros à custa da sociedade.
3. Se os
impostos sobre os produtos importados vierem a se concretizar nos níveis
anunciados na disputa eleitoral, os preços ao consumidor devem subir bem acima
dos 2% almejados pelo Banco Central. Ao encolher o consumo das famílias, esta
medida provocaria mais descontentamento do que esperanças de assistir à
reconstrução do sonho americano projetada com a futura substituição das
importações por uma improvável indústria local voltada a produzir o que hoje é
comprado no exterior.
Enfim,
teremos que esperar a posse para ponderar até a que ponto os rugidos de Trump
se transformarão em miados de gato, darão vida a realidades preocupantes ou se
aproximarão das promessas de palanque. Enquanto isso, dirigimos nossas atenções
ao caminho errático da economia mundial.
Sem
contar com pesados investimentos do Estado para sair da recessão, a evolução da
economia mundial se parece com o trajeto percorrido por um bêbado que volta pra
casa: ora vai para um lado...ora para outro...para...cambaleia...ameaça cair...se
mantém em pé a duras penas...vomita parte do excesso ingerido e continua
seguindo seu traçado tortuoso. Alguns dados do segundo e terceiro trimestre
deste ano ajudam a visualizar esta realidade.
Nos
EUA, o período de abril a junho apresentava uma economia à beira de uma nova
crise econômica. O crescimento do PIB em 1,4% ante o mesmo período de 2015
tinha como frágil base de sustentação uma alta de 4,3% nos gastos dos
consumidores, ao mesmo tempo em que os investimentos registravam uma queda de
9,7% e os lucros corporativos encolhiam pelo 5º trimestre consecutivo em
relação aos mesmos meses do ano anterior. Por sua vez, os números do terceiro trimestre
mostravam um cenário mais animador. O PIB havia crescido 3,2% refletindo um
aumento de 10% nas exportações, investimentos em alta de 1,4%, gastos dos consumidores
crescendo 2,1%, a formação de estoques nas empresas pela expectativa de aumento
da demanda futura e lucros corporativos em leve alta, sempre ante o mesmo
período de 2015. Ou seja, uma situação em que os elementos positivos ganhavam
dos negativos apurados no segundo trimestre.
No
Japão, os últimos 22 meses até outubro foram marcados por um encolhimento das
exportações que, no décimo mês de 2016, apontou para uma retração de 16,5% ante
outubro de 2015. À medida que as vendas externas representam cerca de 40% do
PIB, a redução das exportações produziu uma queda nos investimentos que,
somente no segundo trimestre, voltaram a crescer 0,2% em relação ao primeiro,
apesar de o Banco Central local manter uma taxa de juros negativa. Graças à
injeção de U$ 274 bi do governo, a uma pequena elevação dos gastos dos
consumidores e à redução do ritmo de queda das exportações, o PIB do terceiro
trimestre registrou uma elevação de 1,3% em termos de volumes produzidos em
relação ao mesmo período de 2015, mas os investimentos caíram 0,4% e as
empresas optaram por reduzir seus estoques. Esta situação de aumento da
produção, retração das exportações, elevação do consumo das famílias e fragilidade
dos investimentos fez com que outubro registrasse a oitava marca seguida de deflação
com uma queda de 0,4% em relação ao índice de preços do mesmo mês de 2015. E isso
numa realidade em que as estatísticas registram apenas um milhão e 950 mil
desempregados (o patamar mais baixo dos últimos 22 anos) e o governo garante
que os lucros empresariais estão em níveis recordes.
Mais
sensível aos altos e baixos nos preços do petróleo e ao encolhimento das
exportações, a União Europeia mostra um cenário de incerteza onde o aumento da
inflação em 2017 não se dará por uma retomada sustentável do crescimento, mas
pela elevação dos custos da energia e do transporte. Estes elementos devem
reduzir o consumo das famílias e ter um impacto negativo sobre os investimentos,
apesar dos incentivos do Banco Central europeu e da taxa de juros negativa. De
acordo com as estimativas disponíveis, em 2016, a União Europeia deve registrar
um crescimento de 1,7% e uma inflação anual de 0,3%. Em 2017, o PIB deve
crescer 1,5% com uma inflação anual de 1,4% e só em 2018 promete voltar a 1,7%,
mantendo o custo de vida no mesmo patamar do ano anterior.
Na
China, os dados oficiais indicam que a política de elevação dos salários, expansão
do crédito, cortes na produção, investimentos em serviços e na infraestrutura vem
dando resultados animadores apesar da forte queda das exportações. Entre os
principais indicadores, sublinhamos:
Ø De janeiro a novembro deste ano, as exportações
caíram 7,5% e as importações recuaram 6,2% em relação ao mesmo período de 2015.
O encolhimento reflete a diminuição do ritmo de crescimento do comércio mundial,
os ajustes internos para adequar a economia a esta desaceleração e as mudanças
na política econômica do governo que visa ampliar o setor de serviços e frear a
redução do PIB com obras de infraestrutura.
Ø De acordo com a Comissão Nacional de Desenvolvimento
e Reforma, o país atingiu em outubro a redução de 45 milhões de toneladas na produção
de aço bruto prevista para 2016 e, até dezembro, deve finalizar o corte de 250
milhões de toneladas na extração de carvão, eliminando dois fatores que, ao produzir
excedentes, pressionavam os preços ao produtor rumo à deflação. Apesar deste
resultado positivo, a China ainda enfrenta problemas de excesso de capacidade
produtiva cuja solução demanda prazos bem maiores.
Ø De janeiro a outubro, os Investimentos Estrangeiros
Diretos somaram U$ 103,9 bi, (0,2% a mais em relação ao mesmo período de 2015),
a maior parte dos quais foi para o setor de serviços, e o total investido no
país cresceu 8,3% ante os primeiros dez meses do ano passado. As medidas de
proteção à propriedade que o governo anunciou em novembro buscam sustentar a
manutenção dos níveis investimento para compensar a desaceleração da construção
civil e do complexo industrial ligado às exportações.
Ø Sempre de janeiro a outubro, as vendas do varejo,
apresentaram um aumento médio de 10% ante o mesmo período de 2015. Entre os
itens mais significativos desta alta está a venda de carros, vans, ônibus e
caminhões que cresceu 15%, uma porcentagem bem superior aos 3,9% da comparação entre
os primeiros dez meses de 2015 e os de 2014.
Ø Setembro foi o primeiro mês, desde março de 2012, em
que a deflação dos preços ao produtor foi substituída pela inflação de 0,1%,
indicando que os cortes para ajustar oferta e demanda estavam dando resultado. Esta
situação foi confirmada em novembro, quando o índice de preços ao produtor
subiu 3,3% ante o mesmo mês de 2015. Com mais setores saindo da deflação, os
lucros industriais ganham impulso e as empresas têm mais dinheiro para quitar
as dívidas que somam U$ 18 trilhões e ainda alimentam as preocupações dos
investidores em relação a um possível calote.
Ø Após cinco quedas seguidas e uma saída líquida
estimada em U$ 530 bilhões, as reservas internacionais do país fecham novembro
em 3 trilhões e 52 bilhões de dólares, o menor nível desde março de 2011. O
resultado sugere que as saídas de capitais se intensificaram além do previsto,
o que explica as recentes medidas de Pequim no sentido de ampliar o controle
sobre os fluxos de dólares a fim de estabilizar a cotação da moeda local. Os
temores de uma forte saída de dólares continuam em alta diante da possibilidade
de o Banco Central dos EUA vir a aumentar a taxa de juros.
Resumindo,
a China parece manter a desaceleração do crescimento do seu PIB nos patamares
planejados apesar do comportamento instável da economia mundial. Mas este
movimento que impede uma piora da situação interna não fará desta economia uma
âncora contra as possibilidades de uma nova crise mundial.
Aos
elementos apresentados e às incertezas quanto aos rumos dos EUA após a posse de
Donald Trump, precisamos acrescentar dois fatores que, a nosso ver, contribuem
para aumentar as dúvidas em relação a 2017:
1. Os preços do petróleo. Mantidos artificialmente
baixos graças a uma produção acima da demanda, os valores cobrados pelo barril nos
dois últimos anos levaram muitas empresas que haviam investido na extração de
petróleo de xisto a fecharem as portas; prolongaram a dependência dos EUA em
relação à Arábia Saudita (que pressentia uma redução da ajuda militar
estadunidense enquanto aumentavam as tensões na fronteira com o Iêmen);
contribuíram para a redução dos investimentos no setor e acirraram as
preocupações com a saúde financeira dos bancos que haviam emprestado dinheiro
às corporações petrolíferas. Por outro lado, o petróleo barato encolheu os
preços da energia, derivados e transportes, conteve os custos dos produtos
agrícolas e, com isso, acabou liberando mais dinheiro dos consumidores para gastos
que seguraram o desempenho das economias centrais atingidas pela redução no
ritmo dos investimentos. Com o corte de um milhão e 760 mil barris por dia,
acertado entre os países produtores, esta situação começa a se inverter. De
acordo com as estimativas disponíveis, se o preço médio do barril em 2017 ficar
em U$ 58, os valores cobrados pelos alimentos aumentariam 3,8%, sem contar os reflexos
sobre as cadeias produtivas que dependem do petróleo. Com o consumo em queda e
a possível elevação do endividamento das famílias, dificilmente teremos uma expansão
dos investimentos capaz de contrabalançar os efeitos negativos do preço do
barril na economia mundial.
2. Estímulos dos governos e juros negativos em vários
países centrais não conseguem acelerar o fraco crescimento da economia mundial.
E não é pra menos. O endividamento médio mundial é de 225% do PIB do planeta,
sendo que 66,5% deste total são do setor privado na forma de hipotecas e
empréstimos corporativos. Acrescente as políticas de austeridade dos estados e
suas dificuldades em ampliar os investimentos diante das perdas na arrecadação
e entenderá porque, apesar da disponibilidade de crédito barato, governos e
bancos centrais não conseguem obter os resultados esperados. Por outro lado, a
permanente situação de incerteza aumenta o protecionismo e eleva as pressões do
mercado em direção a novos cortes nos direitos dos trabalhadores a fim de
reduzir os custos de produção e ampliar a competitividade sem encolher as
margens de lucro.
Diante
destes elementos, o Banco Mundial projeta um crescimento de 2% do PIB em 2016
com tendência a manter o mesmo nível em 2017. Por sua vez, a Organização
Mundial do Comércio reduziu de 2,8% para 1,7% as projeções de crescimento de
exportações e importações para o ano em curso, número que tende a encolher em
2017.
Nada
aponta que a economia mundial fortaleça seu caminho rumo ao crescimento sustentado,
ao mesmo tempo em que os ajustes em vários setores parecem equacionar oferta e
demanda. Daí a dúvida expressa no título do nosso texto: estamos a caminho de
uma nova crise já em 2017, conforme anunciado no início do ano, ou teremos um
período de estagnação dos níveis de crescimento econômico que vai manter a
situação de “bêbado voltando pra casa” que descrevíamos na introdução deste
texto? O jeito é ficar de olhos bem abertos.
Enquanto
aumentam as incertezas no horizonte mundial de 2017, no Brasil, o tempo vem
confirmando que a opção pela recessão não leva ao equilíbrio das contas
públicas e promete déficits acima do esperado. À medida que os cortes de gastos
e investimentos dos governos não são compensados por investimentos privados, pelas
exportações ou pelo consumo das famílias, a economia dá poucos sinais de que,
no próximo ano, o país sairá do atoleiro. Acrescente a
isso o fato de que a cada 4 reais que circulam na economia, 1 real vem dos
dispêndios sociais do governo e perceberá que a Proposta de Emenda
Constitucional que visa conter os gastos públicos vai atuar como freio e não
como acelerador do crescimento, conforme vem sendo alardeado.
Alguns
números ajudam a esboçar o quadro sombrio que anunciamos:
1. De acordo com o IBGE, de janeiro a setembro deste
ano, o PIB acumula uma queda de 4%, sendo que os investimentos em capital fixo
do terceiro trimestre encolheram 8,4% em relação ao mesmo período de 2015. Com
a realidade desmascarando o jogo dos números apresentados após a posse de
Temer, de janeiro a outubro, a indústria registra uma queda de 7,7% em relação
ao mesmo período de 2015 e a própria Confederação Nacional da Indústria admite
que a recuperação do setor virá apenas em 2018. Ao que tudo indica, em 2016, a
recessão deve apontar para uma queda do PIB acima de 3,5% e as projeções para
2017 despencaram de 1,6%, na posse de Temer, para algo entre 0 e 0,5%.
2. Sob o peso da recessão e da manutenção das
desonerações para as empresas, a arrecadação federal de janeiro a setembro
deste ano caiu 7,4% em relação ao mesmo período de 2015, já descontada a
inflação. Por sua vez, o déficit público de 2016 deve se manter nos limites
estabelecidos graças aos impostos e multas sobre repatriação de capitais que
proporcionaram uma arrecadação adicional de 46 bilhões e 800 milhões de reais.
A janela da repatriação deve ser reaberta entre fevereiro e junho de 2017, mas não
promete arrecadar mais do que 15 bilhões de reais. É importante sublinhar que
os valores retidos pela receita federal são menores do que os ganhos destes
recursos ao serem aplicados em operações financeiras ou em algum setor da
economia local. Por outro lado, a soma de impostos, taxa de juros negativa,
inflação e riscos oriundos da recusa em abrigar dinheiro de origem duvidosa adotada
por alguns paraísos fiscais, como a Suíça, implicava em perdas anuais e aumento
da insegurança para os mesmos investidores que resolveram repatriar parte dos seus
capitais.
Além de pressionar a execução
orçamentária e forçar a ulterior contenção dos gastos públicos, a queda da
arrecadação reduz o teto da Lei de Responsabilidade Fiscal para o reajuste dos
salários dos servidores e encolhe ainda mais os investimentos do Estado. A
gravidade do problema depende do quanto e quando a arrecadação pode aumentar e
a SELIC cair dos atuais 13,75%, possibilitando a redução do montante pago pelo
governo em juros e amortizações da dívida interna. O quadro de incerteza se
amplia quando, aliada à redução da produção, encontramos uma elevação dos
preços da gasolina e do diesel que vão empurrar para cima os índices de
inflação, um diretor do Banco Central que é um fiel representante dos
interesses dos banqueiros e uma opção pela recessão como saída do atoleiro que
força o movimento sindical a recuos ainda maiores em termos de defesa dos
poucos direitos que restam.
3. De acordo com o Ministério do Trabalho, entre
janeiro e outubro, foram eliminados 751.816 empregos com carteira assinada. A
taxa de desemprego do terceiro trimestre, medida pelo IBGE, ficou em 11,8% e
deve atingir 12,3% em março de 2017. O resultado de
julho a setembro poderia ser ainda pior não fosse a desistência em procurar
emprego de 1 milhão e 200 mil desempregados que elevaram a população inativa ao
nível recorde de 64 milhões e 642 mil pessoas. Sob o peso das
demissões, o salário médio de admissão, descontada a inflação, caiu de R$
1.394,61 nos primeiros 9 meses de 2015 para R$ 1.368,57 do mesmo período de 2016,
ou seja, 1,9% a menos. Com o encolhimento geral dos salários, o volume de
vendas do varejo ampliado (que inclui veículos e motos, partes e peças e
material de construção) caiu 9,2% em relação aos primeiros nove meses de 2015.
4.
Diante do tamanho da recessão, não
surpreende que o montante gasto em investimentos públicos e privados continue encolhendo
e os prazos para a recuperação econômica se ampliando. É possível visualizar o
resultado produzido por esta catástrofe no levantamento anual do Ranking
Mundial de Competitividade do Fórum Econômico Mundial. Pelos números deste ano,
o Brasil ocupa o 81º lugar num grupo de 138 nações, 6 posições a menos em
relação a 2015 e uma perda de 33 posições ante 2012, quando o país ocupava o
48º lugar.[1] Num
momento em que o protecionismo e a competição se acirram, a perda de
competitividade do país eleva o tamanho do arrocho que será necessário para
melhorar a colocação da produção local no mercado mundial. E aqui nos deparamos
com um círculo vicioso insolúvel à medida que, entre os principais motivos
pelos quais as empresas não investem em modernização dos equipamentos está o
fato de que o custo do trabalho no Brasil é muito barato. A terceirização e a ulterior precarização dos contratos
somadas à recessão e ao caráter rentista da nossa elite sufocam a possibilidade
de a plataforma tecnológica do país dar um salto compatível com os desafios da
competição internacional.
5. O resultado positivo da balança comercial é mais um
retrato do tamanho da recessão que assola o país do que um sinal de saída da
situação difícil em que o Brasil se encontra. De janeiro a novembro de 2016, o
superávit soma 43 bilhões e 282 milhões de dólares, sem dúvida um valor
considerável quando comparado ao desempenho dos anos anteriores. Mas há um problema:
o saldo positivo do comércio exterior é obtido graças a uma queda de 3,3% das
exportações e a uma redução de 22% das importações, a primeira é fruto da
situação do mercado mundial e da falta de competitividade das nossas
mercadorias; e a segunda soma às razões anteriores a pesada retração da
economia local. Graças à redução do que é vendido e comprado dos demais países,
em 2016, o Brasil deve registrar a menor participação no comércio mundial com
um índice de 0,7%.
6. Entre tantos números negativos, o relatório do banco
Credit Suisse de 2016 revela que as coisas andam de vento em popa para uma
parcela bem reduzida da população. Os dados revelam que
dez mil brasileiros aumentaram para 172.000 o número de pessoas com fortunas
que superam um milhão de dólares. Um sinal de que, como viemos constando
ao longo do tempo, a crise continua fazendo bem aos setores abastados da
população.
Sob
esta perspectiva assombrosa, a notícia pela qual o governo Temer vai investir 2
bilhões e 70 milhões de reais para retomar 1100 obras paralisadas em 1071
municípios não passa de uma miragem enganadora em termos de investimentos e de
estímulos à geração de emprego. Por outro lado, à
ameaça de impugnação da chapa Dilma-Temer, cujo processo deve ser julgado em
2017, se somam as graves denúncias de corrupção e desvios que podem levar o
presidente a cair antes de abril do próximo ano. Os elementos políticos
e econômicos que fervem sob os pés de Temer desempenham o papel da faca colocada
no seu pescoço, pronta a degolá-lo caso não atenda às expectativas do mercado e
atrase as reformas prometidas no plano “Uma ponte para o futuro”.[2] Não por
acaso, um dia após a divulgação da proposta de reforma da previdência, a Câmara
dos Deputados já emitiu um relatório favorável na comissão de Constituição e
Justiça e se apressa a costurar saídas aproveitando da dispersão dos movimentos
sociais contrários, própria das festas de final de ano.
Enquanto
isso, o judiciário está tomando a dianteira na preparação de um terreno
favorável à ulterior flexibilização dos direitos trabalhistas diminuindo o
papel e a importância dos sindicatos como representantes dos trabalhadores e
elevando as pressões e ameaças para que aceitem o que vier a ser oferecido nas
mesas de negociação. A tendência de alijar os sindicatos
nas relações entre capital e trabalho ganhou impulso com os Acordos de Participação
nos Lucros e Resultados que podem ser negociados e assinados por trabalhadores
e empresários á revelia das entidades representativas, ampliando o espaço para
que as normas de acesso a esta parte do salário variável possibilitem abrir mão
de direitos conquistados em convenções coletivas.
Se
isso não bastasse, no final de agosto deste ano, uma decisão do Tribunal
Superior do Trabalho diz que empresas e funcionários podem negociar diretamente
condições de trabalho caso o sindicato se negue a continuar uma negociação em
curso.
Recentemente,
um ministro do Supremo declarou o fim da ultratividade dos contratos de
trabalho. Ou seja, a validade do acordo coletivo de trabalho vigente se encerra
na data-base e se um novo acordo não tiver sido assinado neste prazo, a categoria
vai ficar só com os direitos previstos pela CLT. Isso implica na possibilidade
de as empresas negarem itens já concedidos e pressionarem as direções sindicais
para que aceitem propostas inferiores sob a ameaça de perder os direitos que
constam do acordo anterior.
Último,
mas não menos importante diante de um funcionalismo cujas lutas marcaram as
campanhas salariais dos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal se posicionou
a favor do desconto dos dias parados em função da greve dos servidores públicos
na clara tentativa de reduzir a adesão desses trabalhadores aos movimentos
paredistas que vierem a ser realizados.
A
proposta de reforma da previdência encaminhada à Câmara dos Deputados reafirma
com todas as letras que o governo não está interessado em analisar as causas
incômodas do que ele aponta como um “déficit previdenciário insustentável”, em
mexer com as forças armadas (que representam 45% do déficit do setor público),
em reduzir as isenções que, em 2016, devem somar 56 bilhões e 400 milhões de
reais e nem em coibir as formas de sonegação empresarial das contribuições
previdenciárias.[3]
Além
desta postura já esperada e denunciada, a visão que subjaz à elevação da idade
mínima para obter 100% da média de todas as contribuições revela a perversidade
dos critérios que a elite usa na nova forma de estabelecer o acesso aos
benefícios. Salta aos olhos que, para obter a
porcentagem máxima, é necessário trabalhar 49 anos. Trocado em miúdos, um jovem
que ingresse no mercado de trabalho com carteira assinada aos 16 anos pode se
aposentar aos 65 com os 100% da média prevista pelo sistema geral da previdência
se ele não tiver enfrentado um único mês de desemprego. Quanto mais ele
adiar o seu ingresso em função dos estudos ou dilatar o prazo das contribuições
por ter ficado sem trabalho, mais precária ficará a sua aposentadoria e, para
obter a porcentagem máxima, terá que trabalhar um período correspondente aos
atrasos acumulados. E aqui, alguns números e um punhado de considerações ajudam
a entender a perversidade do projeto:
1. Imagine que o jovem tenha começado a
contribuir aos 23 de idade e decida completar os 49 anos de contribuição. Isso
significa que o benefício integral sairá quando ele já estiver com 72 anos. Ou
seja, um mês depois dos 71 anos e 11 meses da esperança de vida média dos
homens do país. As perspectivas melhoram no caso de uma mulher que, nas mesmas
condições e esperando viver pouco mais de 79 anos, ainda poderia apostar em
gozar de 7 anos de aposentadoria. Trabalhar
durante quase meio século no Brasil é bem mais do que os 43 anos exigidos, por
exemplo, na França e na Alemanha onde as condições de trabalho são bem menos
desgastantes e a esperança de vida média atinge, respectivamente, os 82 anos e
6 meses e os 80 anos e nove meses. O plano de reforma do governo pressupõe um
trabalhador que ganha mais do que o suficiente para assegurar condições de vida
dignas e trabalha em ambientes com baixo desgaste físico e psíquico, o que, na
média, é um verdadeiro absurdo. Trabalhar 49 anos para correr o risco de não se
aposentar levará a uma previdência superavitária à medida que muitos vão
contribuir e bem poucos conseguirão chegar à porcentagem máxima da média fixada
em lei.
2. Em 1º de dezembro passado, o IBGE divulgou uma nova
estatística pela qual, no Brasil, a expectativa média de vida para homens e
mulheres aumentou para exatos 75 anos, 5 meses e 26 dias. O que causa
estranheza é o fato de que esta elevação ocorre após dois anos de dura
recessão. È como se o desgaste nas condições de vida e de trabalho da ampla
maioria da população ajudasse a prolongar a esperança de vida no lugar de
encurtá-la. Algo absurdo sob todos os sentidos. Por isso perguntamos: qual é a
relação entre renda e expectativa de vida que o instituto usa para chegar a
este número que influi diretamente no cálculo dos benefícios a serem pagos à
maioria da população que se esfola em troca de baixos salários? Que critérios
são usados para produzi-lo? Por que o IBGE não projeta a expectativa de vida
dos brasileiros de acordo com a renda média dos trabalhadores, o que, por
sinal, seria bem mais correto para termos uma projeção de quem e quantos terão
mais chances de completar as condições plenas de acesso aos benefícios
previdenciários?
3. A fim de reduzir custos, é comum as empresas cortarem
empregados com os salários mais altos e com mais de 40 anos de idade. Isso dificulta
a sua volta ao mercado de trabalho e faz com que eles parem de contribuir.
Sendo assim, basta pouco para perceber que os prazos mínimos fixados para a
obtenção dos benefícios, em suas respectivas proporções, vão excluir um número
crescente de trabalhadores e trabalhadoras do acesso aos mesmos e impedir que
tenham condições mínimas para sobreviver na velhice.
4. A perspectiva pela qual a reforma amplia os prazos e
corta os benefícios também pode ser constatada na forma de cálculo do benefício
máximo a ser recebido. Pela regra atual, baseada na soma da idade com o tempo
de contribuição (a fórmula 85/95), o benefício integral é calculado em 80% da
média dos 18 maiores salários. Pela reforma que acaba de ser encaminhada a
porcentagem de 100% da média, cumpridos os 49 anos de contribuição e passados
os 65 de idade, é calculada sobre todos os salários de contribuição. Este mecanismo
faz com que, na maioria dos casos, as bases de cálculo do benéfico final sejam
inferiores ao que seria obtido pela regra vigente. Ou seja, a não ser que o
salário de contribuição tenha ficado sempre no mesmo patamar ou bem próximo
deste, algo muito difícil de ser conseguido nas condições do mercado de trabalho
brasileiro, o 100% da média de todas as contribuições tende a representar um
valor quase sempre inferior aos 80% dos 18 maiores salários de contribuição.
Nenhuma
das realidades que viemos apresentando até o momento é desconhecida aos autores
da reforma da previdência, mas a opção da elite para se apropriar de mais um
pedaço dos recursos do Estado à custa dos trabalhadores não conhece limites que
não sejam impostos pelo avanço das lutas em todos os setores da sociedade. Mas
aqui também não faltam problemas.
Passado
o impeachment da presidente Dilma, sindicatos e partidos progressistas que
chamaram de golpistas pessoas, partidos, movimentos e instituições que se
colocaram a favor do seu afastamento ainda não realizaram uma avaliação criteriosa
dos elementos que tornaram possível o impeachment e não produziram mobilizações
à altura da gravidade do momento. Acusar a mídia, a Federação das Indústrias de
São Paulo e as atuações dos magistrados como principais artífices é chover no
molhado e não vai corrigir as falhas no trabalho de inserção e organização
popular dos setores progressistas acumuladas ao longo dos anos.
Se
isso não bastasse, as alianças costuradas em cerca de 1400 municípios entre
partidos que se opuseram ao impeachment e os que votaram pelo afastamento da
Dilma, e que, portanto, merecem o apelido de “golpistas”, semearam desânimo e
dispersão entre as forças que haviam lutado contra o impeachment e criaram mais
confusão em relação a planos e posições a serem assumidos diante das investidas
da elite.
E isso
num momento em que somar forças e construir uma identidade capaz de fortalecer
a resistência dos trabalhadores para ações de longo prazo é de vital
importância para a classe poder reconstruir, sob os escombros das derrotas, os
passos que visam frear um projeto de país que assenta suas bases num
trabalhador barato e ainda mais explorado.
Brasil,
11 de dezembro de 2016.
[1] Pelo mesmo relatório,
as primeiras dez posições são ocupadas por: Suíça, Cingapura, EUA, Holanda,
Alemanha, Suécia, Reino Unido, Japão, Hong Kong e Finlândia. No grupo dos
BRICS, a China ocupa o 28º; a Índia o 39º, a Rússia o 43º, a África do Sul o
45º e o Brasil o 81º.
[2]
Falamos deste plano na nossa análise de 11 de março de 2016: “2016: mais um ano
amargo – o Brasil na tempestade”.
[3]
Tratamos desse tema na análise de julho, “Sacrificar os pobres para engordar os
ricos”.
Boa noite, Emilio. Você, como sempre, muito preciso e embasado na realidade concreta, sem descurar da teoria, mas procurando usar uma linguagem acessível, de educador popular.
ResponderExcluirSenti um pouco a falta das pesquisas que o Martins tem esboçado no boletim Critica da Economia, que talvez enriquecesse ainda mais a tua análise, assim como a dele seria enriquecida com a tua, principalmente por que está "dispersa" em vários boletins, enquanto a sua está condensada num texto unico unitário e coerente.
Boa noite Acrísio. repassaremos seu comentário ao Emilio. Estamos seguros de que ele ficará mito contente com seu retorno. Caso queira poderá entrar em contato com ele pelo email que acompanha o post. Nós do NORTE. sempre divulgamos os textos do Emílio por meio de nosso blog conselhodaclasse. Nossa intenção é subsidiar os trabalhadores da Educação e de toda a classe trabalhadora com textos que contribuam para a criação e o estímulo de uma cultura anticapitalista de militantes e de membros de nossa classe em geral. Diivulgue se achar interessante. Grato por ler e comentar. abs. NORTE. Existem outros textos do Emílio no blog.
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