sexta-feira, 24 de julho de 2020

Sobre o ateísmo ético

Sou Cristão, mas, nunca sequer imaginei que alguém desta profissão religiosa fosse defender tão bem o ateísmo. É um paradoxo muito interessante neste momento de nossa História, no qual, muitos cristãos e muitas igrejas cristãs decidiram apoiar uma espécie de “anticristo” em nome da família, da pátria e de Deus. 

Estão fazendo exatamente o inverso do que pregou Jesus de Nazaré, quando trouxe o Amor como o maior mandamento de todos: A Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo.

Ainda que se tratasse de inimigos, o Conselho do nazareno foi “amai vossos inimigos, pois , amar os amigos até os salteadores o fazem, qual seria o mérito disto, proclamou Jesus em suas andanças pela Galileia.

 

É por isto que indico este artigo, imperdível, dispa-se dos preconceitos e vá até o fim. Depois nos conte o que achou. (Carlos, O Divergente)

 

Sobre o ateísmo ético

 

Por Ivone Gebara

 

 

 

"Falar de ateísmo ético, ou seja, nos orientar na fonte do respeito ao outro não emanada de um ser todo poderoso à imagem de um modelo humano único pode nos abrir novas visões. O Infinito é bem mais do que o humano nas suas relações amorosas e nas suas relações éticas. O Infinito é incomensurável. As ações de Jesus nos Evangelhos apesar da maquilagem dos escritores, tradutores e intérpretes apontam para esse Infinito ético, capaz de convidar à mesa aqueles que nunca poderão convidar-me para retribuir meu gesto", escreve Ivone Gebara, filósofa, teóloga e religiosa, pertencente à Congregação das Irmãs de Nossa Senhora, que lecionou por 17 anos no Instituto Teológico do Recife (Iter).

 

Eis o artigo.

Estamos vivendo um difícil momento onde nossas emoções, talvez as mais tristes e violentas estejam à flor da pele. Estamos com raiva de uma porção de situações, de governos e desgovernos, de pessoas, de nós mesmas. Divisões se acentuam, opiniões se conflitam, ameaças de morte são feitas a quem ousar pensar de forma diferente dos xerifes do mundo.

 

Estamos sem saber quem seremos num futuro próximo ou se ainda seremos o que gostaríamos de ser. Todas/os estamos ameaçados por uma morte viral que toca não só pessoas, mas todas as instituições sociais e nelas também as instituições religiosasque inocentemente se acreditavam isentas desses perigos. “Desde o menor até o maior, todos eles são gananciosos; e desde o profeta até o sacerdote todos eles praticam a mentira. Cuidam da ferida do povo superficialmente, dizendo Paz, Paz! Quando não há Paz!” Jeremias 6,14. “Parai vossos caminhos e perguntai(...) qual é ocaminho do bem? Caminhai nele!” Jeremias 6, 16.

 

Qual é o caminho do bem?

 

Clamar insistentemente a Deus para que venha nos ajudar a sair dessa espécie de dilúvio coletivo não parece surtir efeitos imediatos. A morte se multiplica como fruto de ‘grande plantação’. Porém, uma vez mais em nossa História os pregadores políticos ou religiosos continuam preocupados em aparecer como aliados e representantes de Deus tentando ajudar os fiéis a fazer sua vontade. Mas que Deus seria este, tão lento em ouvir os clamores de seu povo? Que Deus é esse que não se comove com o sofrimento e a morte de milhares de pessoas? Que Deus é este vomitado pela boca de políticos, clérigos e fanáticos cada um tornando-o à sua própria imagem e semelhança?

 

Nessa situação inconfortável e triste, além do profeta Jeremias, me lembrei do filósofo judeu Emanuel Lévinas especialmente de algumas memórias de seu livro ‘Totalidade e infinito’ (Lévinas, Emanuel, Totalité et Infini. Martinus Nijhoff, La Haye, 1971). Lembro-me da distinção que evocava entre a religião do todo poderoso e a religião do Infinito. Floreio e reelaboro algumas ideias a respeito dessa distinção que me parece sábia e útil para o momento em que estamos vivendo, embora o contexto seja diferente.

 

A religião do deus todo poderoso é aquela em que a gente crê que Alguém, uma Pessoa divina com total poder nos fala e dirige nossas escolhas de vida e nossa História. Referimo-nos a ela como se fosse alguém de nossa convivência cotidiana afirmando: deus disse, deus mandou , deus escolheu, deus quer, deus fez, deus fará ou a negativa a cada afirmação. Nem nos damos conta de nosso atrevimento! A partir dessa imagem construíram-se doutrinas, maneiras de agir afirmadas como a vontade desse supremo e todo poderoso ser à nossa imagem. De certa forma fizemos e fazemos o todo poderoso caber dentro de nossos pensamentos e poderes, impomos a ele nossa maneira de ver o mundo e o afirmamos como a garantia de nosso caminho e das propostas que fazemos. É como se o todo poderoso me habitasse do meu jeito ou que fosse um eu idealizado e forte me ditando suas ordens e permitindo-me criar regras de conduta à minha imagem e semelhança, porém afirmando-as como provindas dele. Sem querer talvez, reduzo o todo poderoso a meu próprio desejo ou a um poder que concede a mim o que necessito individualmente. E, o todo poderoso deve então responder às minhas necessidades e até aos mais absurdos e recônditos desejosque acalanto. Nem me dou conta que o estou reduzindo a mim mesma, ao meu pequeno mundo e aos meus pequenos pensamentos. Nem percebo que meus desejos e sonhos são meus e podem até ser prejudiciais a outras pessoas e que coloco o todo poderoso num beco sem saída.

 

A partir dele também construo imagens de pessoas (santas/os, heróis, ilustres personagens) que segundo me disseram, seguiram sua vontade e que podem ser as minhas intermediárias nessa aventura de convencer o todo poderoso de minhas reais necessidades. Além disso, ao submeter-me a uma lei, a uma regra, a uma ordem provinda de alguma autoridade religiosa que o representa é como se estivesse submetendo-me ao todo poderoso, expressado em linguagem e imagem simbólica predominantemente masculina.

 

É nesse momento que encontro com o ateísmo ético ligado a ideia de Infinito de Lévinas. É difícil para nós seres finitos imaginarmos o Infinito. O máximo que fazemos é pensar o Infinito como contrário ou oposto à nossa finitude. Mas, mesmo assim este Infinito é dificilmente apreendido por nós individualmente visto que sabemos que nós seres vivos tivemos um começo e teremos um fim. Entretanto, falamos do Infinito e de certa forma o buscamos. Ele parece ter uma função positiva que é a de nos remeter à nossa própria ignorância, ao nosso limite visto que dizemos que ‘ele’ conhece tudo, sabe tudo e pode tudo em oposição a nós. Sem perceber temos a ousadia de personalizar o Infinito e de submetê-lo às nossas regras epistemológicas, morais, políticas, religiosas ou de convivência cotidiana. Tornamos o Infinito desejável reduzindo-o ao nosso desejo e ao que não somos.

 

Desta forma assimilamos o Infinito ao todo poderoso enquanto Lévinas parece distingui-lo. Ao assimilarmos ‘Deus’ apenas a uma qualidade humana, o assimilamos a nossos comportamentos mesmo se pela via negativa e estamos de certa forma na idolatria, isto é, reduzindo o Infinito aos ídolos ‘feitos por mão humana’ e que podem servir aos nossos próprios e limitados objetivos. Caímos novamente no registro do todo poderoso aquele que permite a existência dos poderosos chefões, dos ditadores, dos carrascos, dos que se excitam com o cheiro do sangue humano, dos que perseguem os diferentes, exploram os fracos, violentam mulheres e acreditam ser eles a lei para os outros. Reproduzimos os comportamentos dos que se julgam donos das verdades, donos das terras, exemplares da raça pura, gênero superior.

 

O Infinito não pode ser reduzido a nada e a ninguém. Só o silêncio diante de um céu estrelado ou o silêncio interior impedindo o domínio do pensamento podem vislumbrar a magnitude do mistério infinito do qual somos ínfimas partes. Silenciar é preciso... Silenciar para não ouvir meus pensamentos, para não perturbar essa tênue luz que se pode vislumbrar e que nos convida a algo diferente, algo que ainda não sabemos bem o que é.

 

Suspeito que Jesus de Nazaré, judeu, viveu algo parecido. Fomos nós os cristãos, por diferentes razões históricas que iniciamos a jornada de identificação de Deus ao homem, a tornar o homem Deus, a falar de Encarnação. Nem nos demos conta do quanto de exclusão e violência vivemos! Porém embora haja algo nesta identificação que parece cheia de sentido, na medida em que o infinito na estatura humana é fundamentalmente o infinito ético, temos que ser cautelosos. A História é testemunha dos massacres que realizamos em nome de nosso homem Deus!

 

Falar de ateísmo ético, ou seja, nos orientar na fonte do respeito ao outro não emanada de um ser todo poderoso à imagem de um modelo humano único pode nos abrir novas visões. O Infinito é bem mais do que o humano nas suas relações amorosas e nas suas relações éticas. O Infinito é incomensurável. As ações de Jesus nos Evangelhos apesar da maquilagem dos escritores, tradutores e intérpretes apontam para esse Infinito ético, capaz de convidar à mesa aqueles que nunca poderão convidar-me para retribuir meu gesto. Apontam para leprosos, paralíticos, cegos, famintos que abundam em nosso meio e que temos até medo de nos aproximarmos deles, porém é a partir deles que o reino dos céus da irmandade é experimentado. E, nessa dinâmica, ouso afirmar que o último suspiro de Jesus é a entrega ao Infinito que parece não ser o ‘pai todo poderoso’ sentado em seu trono de glória. É o ‘Abba’ (Pai) mais além da biologia humana, mais além do todo poderoso. Suspiro, grito, entrega última à misteriosa dinâmica da VIDA.

 

O todo poderoso pode dar ao homem o poder de dominar a terra, mas o Infinito sem um nome específico, pois é o Tudo para além de todos os nomes, apenas aponta para o faminto ou para a mulher sofrendo fluxo de sangue, para o apátrida, para o sem teto, para a menina triste e faz estremecer minhas entranhas mesmo que eu não faça nada por eles/elas. O Infinito pode apenas fazer tremer minhas entranhas diante da caça aos elefantes africanos, diante das queimadas nas florestas, diante da extinção de muitas vidas. O Infinito pode criar em mim a revolta em vista da restauração de vidas. Esse Infinito não promete nada, nem mesmo a libertação dos oprimidos, nem mesmo a felicidade eterna no final dos tempos. Apenas abala e atrai as entranhas humanas! Todas as compensações e justificações são pensamento nosso, discurso dos infelizes, tentativas de buscar a justiça e o céu para além da terra. Todas essas atitudes podem ser recuperadas pelos senhores dos tronos e dos templos.

 

Nosso tempo pessoal está exausto de mensagens do todo poderoso ou melhor, de muitos todo-poderosos se digladiando considerando-se quase eternos, convencidos de sua autoridade e esperando que seus filhos únicos legítimos herdeiros continuarão seu poder. Os ídolos, os nossos, nos dão segurança e consolo, mas são ao mesmo tempo perigosos porque nos impedem de buscar os outros/as livremente, nos impedem de nos darmos as mãos, de tecer redes uns para os outros e com os outros. Instauram um clima de medo reciproco e de beligerância continua atacando-nos mutuamente e prometendo aos pobres os benefícios de uma futura terra fértil e a estabilidade capaz de suprir as necessidades básicas de todos os cidadãos e cidadãs sem distinção de raça, gênero e classe. O todo poderoso promete, o Infinito silencia e convida dentro de nós a olhar os lírios do campo, a dar a mão aos caídos e a dividir o pão e a casa.

 

Já não temos forças para acreditar nas fantasias anunciadas como se fossem realidades. Já não temos mais energia para cantar hinos guerreiros e nem para saudar suas bandeiras que ficticiamente representam as matas que eles mesmos destroem e o ouro que eles exploraram deixando a terra ferida e ensanguentada e o azul dos céus que poluíram e o profundo das águas que sujaram. Já não aguentamos mais ver tantas cruzes espalhadas sem ressurreição e tantas bençãos dadas para exaltar poderosos!

 

De que serve a minha ira momentânea? De que serve minha heresia confessada? De que serve meu palavreado inconformado de ver tanto desperdício acumulado e tanto futuro matado no presente? Talvez apenas sirva como consolo fugaz como quem dá um último grito ou relembra uma canção de amor onde faltam algumas estrofes ou faz uma poesia para se sustentar ao mesmo tempo no sentido e no não sentido.

 

Nenhum auxilio virá do Deus todo poderoso criador do céu e da terra! Nenhum auxílio virá de seu único filho, primogênito de toda criação! Nenhum auxílio virá do Espírito Santo, pássaro apavorado com nossas espingardas apontadas para seu peito nas florestas tropicais. Todos se originam do modelo do ‘todo poderoso’!

 

“Filha de meu povo, veste-te de saco, revolve-te no pó e lamenta, uma lamentação amarga...” Jeremias 6,26.

 

A indiferença atravessa terras, céus e mares, enquanto os cofres se enchem de ouro, moedas de prata roubadas são escondidas nas vestimentas e milhares morrem de fome. Milhões de pessoas continuam rondando pelas ruas à procura de roupa, abrigo e comida... E ricos celeiros transbordam!

 

A mentira continua a dar substância aos crimes. Mistura-se ao pão cotidiano de forma a envenenar a criança, o jovem e o velho com suas maledicências vestidas de veracidade possível. E não se teme jurar pelo ‘todo poderoso’ afirmando que se está a falar a verdade, que não somos autores dos crimes que nos acusam e nem sequer violentamos as multidões de desterrados. Não se hesita em jurar sobre a Bíblia, em buscar nela justificações, em fazer procissões com ela como testemunha das ações do ‘todo poderoso’. E para coroar convicções e para que elas continuem a nos darpretensiosas seguranças, muitos nos oferecem para depósito os números de sua conta bancária!

 

De que nos serve o todo-poderoso? Serve talvez para iludir-nos em relação às nossas dores ou talvez para deixar-nos iludir por esperanças vãs pronunciadas apenas por seus filhos legítimos? Inventam artifícios, maneiras de viver sem consciência do necessário bem comum, apegam-se as suas próprias mentiras e a sua ignorância acreditando que todos/as se dobrarão ao que dizem.

 

Sem o todo poderoso talvez o frágil rosto do outro possa me lembrar do meu. Talvez possa tornar-me cada vez mais a mão estendida, o pão dividido, a terra plantada em conjunto, a terra limpa em mutirão, a educação abrindo novos caminhos. Talvez possa tornar-me água pura que sacia a sede, casa habitada por todos. Sem o todo poderoso e suas hierarquias representativas posso ter mais liberdade para criar de mãos dadas algo mais aconchegante, mais alegre e livre, apesar dos medos e inseguranças. Talvez sem ele, não teríamos outra saída a não ser respeitarmo-nos e tocar ternamente nossos corpos para simplesmente viver como interdependentes na Infinitude comum que nos toca.

 

Haverá algum sentido nessa demência intuída e escrita que me acomete? Não sei. Confesso a minha dúvida como confesso minha simpatia pelo silencioso Infinito.

 

A Infinitude, o infinito é sem cara fixa porque provém de milhões de anos luz, provém da evolução de muitos seres que são impossíveis de lembrar e resgatar. A Infinitude é sem limite, sem fundo, sem uma única espessura. Tem muitas formas e expressões. Nos envolve e nos convida a viver com respeito mútuo apenas esse instante em que por acaso estamos juntos. Por acaso estamos juntos nesse mesmo tempo da terra comum. Por acaso temos só esta chance de estarmos vivos e degustar do sabor da vida como ventura de hoje para hoje.

 

Por que roubar uns dos outros esse instante de prazer que é estar vivo agora? Por que eliminar dos outros o direito ao instante e prometer a vida eterna em troca? Ganância! Ilusões! Estamos cheios de ilusões fantasiando nossa realidade tão bela e tão provisória. Mesmo se algumas ilusões são atraentes e as vezes até momentaneamente necessárias elas não podem ser a finalidade única de nossas vidas.

 

Medrosos por nossa incômoda orfandade redescoberta, abandonados pelos padrastos que se sucedem, enterramos a nossa fé na humanidade nos escombros de devoções idólatras e dos sonhos vãos. Seria possível acreditarmos na Infinitude para além dos totalitarismos? Seria possível não reduzirmos a grandeza do que existe a um pensamento criado, inventado e que pretende submeter o mundo ao seu ego hierárquico? Seria possível resgatar o Infinito em nossas tradições? Ternamente, suspeito que sim.

 

Há que provar do cálice silencioso da Infinitude. Há que aprender e ensinar as infinitas sabedorias dos povos. Há que orar em silencio acolhendo tudo o que é na sútil percepção que temos de sua presença. É ela que nos revela um segredo difícil de aceitar... É o segredo de sermos apenas guardiães momentâneos uns dos outros, efêmeros guardiães do planeta apenas nesse instante, o instante de cada vida. Já não somos mais ‘a medida de todas as coisas’ como disseram os antigos filósofos, já não somos mais o centro do universo apesar de nossas descobertas e de nossa ciência. Somos apenas entre e com outros, na aventura de ser apenas pó e ao pó voltar!

 


domingo, 12 de julho de 2020

O Mundo no Vendaval da Crise!



O Capital espalha destruição e miséria pelo planeta 

afora, independentemente da região e do continente, 

confira, nesta excelente analise de conjuntura de Emílio 

Gennari que temos o prazer de publicar em nosso blog






 Emilio Gennari                                  

Enquanto a pandemia semeia fartas doses de sofrimento pelas perdas de vidas humanas, a recessão desperta angústias e revoltas cujo potencial de questionamento da ordem começa a aparecer em vários paises.
Os atos contra o racismo e os protestos motivados pela fome trouxeram à tona as faces visíveis da desigualdade com as quais a sociedade se acostumou a conviver em tempos de crescimento econômico, mas seguem pouco nítidas as relações de produção que precisam do racismo para manter a exploração.
Limitadas em seu alcance por não interromperem a produção da riqueza, as pressões que vêm da base da pirâmide social têm recebido o apoio de inúmeras personalidades, cujas condenações abrangem as atitudes costumeiras das pessoas e os abusos dos agentes do Estado.
Por importantes que sejam na hora de amplificar a indignação popular, estas posições acabam fortalecendo a idéia de que o racismo a ser vencido está em múltiplos aspectos da vida social, sobretudo do comportamento individual, sem fazer referência a estrutura econômica da sociedade.
Por toda parte, a elite não poupa esforços para que o capital saia da tempestade com o menor dano possível às suas estruturas de dominação. Neste navio que traça os destinos da humanidade, é fundamental que os passageiros da terceira classe não saiam do porão; que chefes e prepostos cuidem para que seu isolamento seja quebrado apenas para garantir os serviços essenciais à navegação ou limpar as acomodações dos andares superiores; e que os sistemas de vigilância impeçam qualquer tentativa de alterar o porto de destino.
Aposta-se que o medo do naufrágio, a coerção diante das tentativas de levantar a voz, as cestas de mantimentos e algum dinheiro para diminuir a fome sejam medidas suficientes para convencer a maioria a se resignar diante da má sorte. No fundo, trata-se de limitar o descontentamento às queixas pelos atrasos crônicos no atendimento das demandas dos necessitados e de fortalecer a confiança em governantes que não titubeiam em fazer com que, para salvar os lucros empresariais, a luta pela sobrevivência ande de mãos dadas com as chances de contrair um vírus mortal.
Entre a destruição da vida e os protestos de quem não aceita morrer calado, os acontecimentos apressam o passo da conjuntura e transformam o presente em instante fugaz cujo sentido escapa à compreensão da maioria. Sob o ritmo frenético que a realidade impõe, o nosso estudo busca medir o pulso da crise para entender os desafios que a classe precisa enfrentar na construção do seu projeto de sociedade.

1. Qual será o tamanho da destruição?

Apesar dos limites das projeções econômicas diante da evolução da pandemia, vale a pena resgatarmos os cenários que as instituições internacionais desenham para estimar o tamanho da destruição da riqueza mundial causada pela recessão em curso.
Iniciaremos nossas reflexões comparando as tendências de crescimento do PIB das principais economias divulgadas pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), entre os dias 10 e 24 de junho de 2020. Vejamos o que dizem os números: 1

Quadro 1: Estimativas do FMI e da OCDE para o PIB de 2020

Países

PIB 2020 - OCDE

PIB 2020 - FMI

Estados Unidos

- 7,3%

- 8,0%
Zona Euro

- 9,1%

- 8,0%
Japão

- 6,0%

- 5,8%

China

- 2,6%

1,0%

Índia

- 3,7%

- 4,5%
Rússia

- 8,0%

- 6,6%
México

- 7,5%

- 10,5%
Brasil

- 7,4%

- 9,1%
Mundo

- 6,0%

- 4,9%
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da OCDE e do FMI

O quadro 1 revela que, em 2020, as perspectivas para o PIB Mundial flutuam entre uma queda de 4,9% e de 6%, sendo que a China é a única grande economia em relação à qual as duas instituições apresentam cenários opostos. Segundo o FMI, o país encerraria o ano com um crescimento de 1% em relação a 2019, enquanto, para a OCDE, devemos esperar uma retração de 2,6%.
Além do impacto da pandemia nos mercados locais, a diferença entre as duas estimativas tem como base a importância da demanda mundial na economia do gigante asiático. Se, de um lado, faltam dados que permitam compreender as perdas acumuladas pela China em 2020, de outro, sobram estimativas em relação ao comércio mundial.
O relatório do FMI, por exemplo, constata que no primeiro trimestre, as trocas comerciais internacionais sofreram uma queda de 3,5% ante o mesmo período de 2019 e as projeções entre abril e junho indicam um encolhimento de 11,9% em relação aos mesmos meses do ano passado.2
Ainda de acordo com o FMI, o PIB mundial seguiria uma trajetória de queda até o final de julho, quando iniciaria um lento processo de recuperação que traria uma pequena melhora ao comércio mundial, beneficiando as exportações da China.
No extremo oposto, temos os cálculos que a Organização Mundial do Comércio (OMC) divulgou no início de abril, apontando que as trocas internacionais encolheriam 12,9%, em relação a 2019, caso o PIB mundial apresentasse uma queda de apenas 2,5%. Contudo, no cenário pessimista de um recuo de 8,8%, o fluxo do comércio cairia 31,9% na mesma base de comparação.3
Ao projetar uma retração de 6% na produção da riqueza mundial, a OCDE aposta em um cenário intermediário quanto às trocas comerciais e, de conseqüência, em relação ao seu impacto na economia chinesa.
Os primeiros sinais deste efeito negativo podem ser vistos no valor das compras externas do país. Vale lembrar que a China precisa importar uma quantidade considerável de mercadorias para abastecer tanto o consumo interno, como o mercado exportador. No mês de abril, as compras chinesas de produtos estrangeiros encolheram 14,10% em relação ao mês de março deste ano. Em maio, o desempenho da economia não apresentou sinais promissores, à medida que as importações sofreram mais uma queda de 8,90% em relação ao mês anterior, provando o forte esfriamento da economia.4
As projeções da OCDE são mais pessimistas do que as formuladas pelo FMI também em relação à Rússia. Além da dificuldade de termos notícias precisas em relação ao avanço da pandemia no território russo e, portanto, do impacto na sua economia, as estimativas dos preços futuros dos hidrocarbonetos têm grande importância na definição do PIB de 2020. É fato que o barril de petróleo bruto é cotado, em média, a um preço 34% inferior em relação aos doze meses anteriores, enquanto o gás natural amarga uma perda de 38%, na mesma base de comparação5 e estes são os principais produtos de exportação do país.
Para o FMI, a constatação de que os preços da energia se estabilizaram após os cortes na extração, é um sinal positivo para a economia mundial e para os países produtores. Mas a OCDE parece focar na parte vazia do copo meio cheio descrito pelo FMI ao estimar um impacto maior dos preços reduzidos e da diminuição das vendas dos hidrocarbonetos na economia russa que depende da exportação destas commodities para sustentar o seu crescimento.
As estimativas do Fundo Monetário Internacional são mais otimistas para a Zona Euro e para o Japão, mas não para os Estados Unidos, onde os temores de uma nova onda de contágio levam a apostar em um aprofundamento dos problemas econômicos do país. As notícias de um possível novo fechamento das atividades em algumas regiões saíram após a divulgação do relatório da OCDE, publicado quando tudo indicava que a economia estadunidense estava reagindo aos primeiros passos da volta à normalidade e a ameaça de um novo lockdown não passava de uma possibilidade distante.
Em relação à Índia, México e Brasil, o FMI estima uma recessão bem mais profunda da que havia sido prevista pela OCDE. Aqui também as datas dos estudos influem em seus resultados. Nas semanas anteriores ao relatório da OCDE, os governos deixavam pairar a possibilidade de um impacto menor da Covid-19 no desempenho econômico do país em função da proximidade do pico das contaminações e da subsequente estabilização. Na contramão das expectativas que animavam o otimismo na retomada das atividades econômicas, o forte avanço no número de mortes e contaminações em junho despertou os temores de um agravamento da pandemia nos próximos meses.
Optamos por detalhar alguns elementos que subjazem às projeções relacionadas à conjuntura internacional a fim de mostrar a volatilidade dos elementos sobre as quais se baseiam e a dificuldade de prever quando as economias atingirão o nível mais baixo da queda para iniciar uma nova fase de crescimento. Manter os olhos abertos diante dos fatores que marcam os passos da crise vai ajudar a entender não só a gravidade dos problemas econômicos que o mundo herdará, como os movimentos que as relações comerciais vão traçar no tabuleiro da geopolítica mundial.
A nota comum aos dois relatórios diz respeito à necessidade de não poupar esforços para reduzir os danos irreversíveis que podem se abater sobre as economias de cada país. Na recessão causada pelo coronavírus, não há nenhum bloco econômico cujo crescimento seja suficientemente forte para ajudar a contrabalançar as perdas impostas pela crise. Além disso, estamos diante de uma queda bem mais profunda do PIB das principais economias mundiais em relação às crises do pós-guerra, de um mercado de trabalho onde o desemprego destruiu um número considerável das vagas criadas até o início da pandemia e a precariedade de quem vivia na informalidade revela agora seus efeitos devastadores na renda e nas condições de vida de mais da metade da força de trabalho mundial.
Para termos uma idéia das dimensões do desastre provocado pela crise, lançamos mão do relatório que a Organização Internacional do Trabalho divulgou no dia 30 de junho. De acordo com as estimativas da entidade, no primeiro trimestre de 2020, o corte de horas trabalhadas corresponde à perda de 155 milhões de empregos em tempo integral (48 horas por semana), 5,4% a menos em relação ao primeiro trimestre de 2019. Entre abril e junho, os cálculos da OIT estimam mais uma redução equivalente à extinção de 400 milhões de vagas em tempo integral, 14% a menos ante os mesmos meses de 2019.6
Segundo o levantamento divulgado no final de maio, 60 em cada 100 trabalhadores viram suas rendas caírem em função da pandemia. A situação era mais grave entre os informais, à medida que 75,8% deles tiveram seus ganhos fortemente atingidos em função do isolamento social e houve sérios atrasos no recebimento da ajuda governamental.
De acordo com o mesmo documento, a diminuição da renda do trabalho causada pela crise fez com que a parcela de pessoas com ganhos mensais abaixo de 50% da média salarial de cada país aumentasse 34 pontos percentuais em nível mundial e 56 pontos percentuais nos países mais pobres.7
Para as instituições internacionais que regulam as chances de acumulação do capitalismo mundial, esta situação merece cuidados redobrados, não pelas perdas de vidas humanas e sofrimentos, e sim por agravar a situação das empresas.
No relatório divulgado em 14 de abril, o FMI calculava que, no primeiro trimestre de 2020, os custos impostos aos governos pela crise do coronavírus haviam demandado cerca de 14 trilhões de dólares, entre desonerações fiscais, empréstimos a juros subsidiados, compra de ações de empresas em dificuldade financeira, auxílio às famílias em situação de vulnerabilidade e gastos adicionais no setor de saúde. 8
Em maio, registramos que o governo da França aprovou um plano de socorro emergencial no valor de 430 bilhões de euros (483 bilhões de dólares).9 Em junho, foi a vez do Banco Central Europeu disponibilizar mais 600 bilhões de euros (732 bilhões de dólares) para comprar títulos da dívida emitidos pelo tesouro dos 17 países que adotam a moeda única a fim de ampliar o crédito e as operações estatais de compra de ações que sustentam as empresas em dificuldades financeiras.10
Em meados de junho, o Banco do Japão anunciou a injeção de um trilhão de dólares para apoiar a retomada do crescimento e, segundo a agência de notícias Bloomberg, o presidente dos EUA prepara um pacote de um trilhão de dólares em obras de infraestrutura, enquanto o Banco Central do país quer iniciar um amplo programa de compra de ações de empresas com problemas de caixa.11
Esta avalanche de dinheiro público revela a gravidade da crise, à medida que, em menos de seis meses, as operações para manter vivo o capital demandaram uma quantia pouco inferior aos 18 trilhões de dólares gastos pelos estados, entre junho de 2008 e maio de 2009, o período mais crítico da recessão anterior.12 Tudo indica que, até o fim do ano, será necessário um volume adicional de recursos públicos para fazer com que, em 2021, a economia mundial possa entrar num processo de recuperação.13
Com base nos gastos já efetuados, o relatório do FMI prevê um aumento de 10 pontos percentuais do déficit público mundial, em 2020, e um acréscimo de 18,7 pontos percentuais do endividamento interno em relação ao patamar registrado em 2019. Para termos uma idéia do tamanho do estrago provocado pela recessão, o mesmo estudo lembra que, na crise de 2009, o aumento do déficit público ficou em 4,9 pontos percentuais enquanto a dívida interna global aumentou 10,5 pontos percentuais sempre em relação ao nível do ano anterior.14
A nosso ver, esta realidade faz com que duas possibilidades simultâneas se perfilem no horizonte da saída da crise. A primeira diz respeito a um forte processo de privatização das estatais e de abertura a uma exploração predatória dos recursos naturais a fim de abastecer os caixas dos Estados. A segunda, o capital e o Estado vão aproveitar do desemprego e das precárias condições de vida dos trabalhadores para aprofundar a exploração do trabalho e eliminar os poucos direitos sociais que ainda restam. Claro, sempre em nome da necessidade de reduzir o déficit público, investir e gerar empregos.

2. A economia cai...mas as bolsas sobem. Por que?

Assim como as Bolsas de Valores são as primeiras a detectar a chegada da crise, é nelas que ganham corpo as apostas quanto à retomada da economia e as perspectivas de lucros das empresas.
As operações de compra e venda de ações têm sua valorização medida em pontos e cada índice reúne as ações de um determinado grupo de empresa. Sempre que a pontuação cresce em relação ao dia anterior significa que a procura por esses títulos de propriedade aumentou acima da oferta, elevando o seu valor. Quando, apesar de algumas quedas intermitentes, este movimento de alta se mantém com certa estabilidade durante algum tempo, os agentes econômicos vêem nas bolsas o reflexo da confiança dos investidores no desempenho da economia e a melhora das perspectivas de lucro das empresas.
Por outro lado, quando há mais investidores tentando vender do que comprar, os preços das ações caem e, com eles, também se reduz a pontuação em relação à que havia sido apurada no dia anterior. Longos períodos de queda, ainda que alternados por pequenas elevações, indicam um aumento da incerteza que, a depender do tamanho das perdas e da permanência do declínio descrita pelos índices, pode apontar a chegada de uma crise.
Seguir o movimento da Bolsa ao longo do tempo oferece a possibilidade de prever com alguns meses de antecedência o comportamento da economia real e, nela, o desempenho das empresas. A sensibilidade das Bolsas de Valores guarda relação tanto com o fato de que é nesse âmbito que os investidores apostam quantias elevadíssimas da riqueza mundial, quanto com a crescente internacionalização da sua produção. Uma catástrofe natural que atinja importantes redes de suprimento das empresas em qualquer lugar do planeta ou eventos econômicos, políticos e sociais que alterem as projeções de crescimento da economia em países com uma participação significativa no PIB mundial terão reflexos imediatos no comportamento das Bolsas.
Por se tratar de “apostas” baseadas em elementos reais e humores momentâneos do mercado, e devido à presença de investidores interessados apenas em ganhar dinheiro especulando com o preço das ações, não é incomum que a dinâmica de compra e venda registre um descolamento entre os lucros futuros, projetados pelos índices, e os que são realmente possíveis nas condições em que a economia se encontra. A divulgação dos balanços trimestrais das empresas, cujas ações são cotadas na Bolsa de Valores, funciona como um termômetro que indica se a economia está aquecendo ou esfriando. È sobre esses dados que os investidores ajustam os próximos passos.
No momento em que escrevemos, a produção da riqueza mundial está encolhendo em ritmos que variam de um país a outro em função da gravidade da pandemia, da fase em que esta se encontra, da forma como ela atinge as atividades de alguns setores da economia e das possibilidades de negócios que oferece a outros. Apesar das projeções negativas do PIB mundial, a partir de abril, as principais bolsas de valores apresentaram uma recuperação invejável diante das perdas acumuladas em fevereiro e março de 2020.
Para termos uma idéia deste processo, vamos comparar o maior nível de pontos atingido nos dois primeiros meses do ano, quando a pandemia se apresentava como uma ameaça localizada e distante, com o menor patamar alcançado em março e com a posição consolidada no dia 26 de junho deste ano:15

Quadro 2: Variação dos índices das bolsas de valores entre 01/01 e 12/06 de 2020

Bolsas de Valores
Ápice jan-fev
Maior queda
Posição 26/06
Ápice x 26/06
Dow Jones - EUA
29.423
18.592
25.016
- 14,98%
S&P 500 – EUA
3.373
2.237
3.009
- 10,79%
Nasdaq Composite – EUA
9.817
6.861
9.849
0,33%
STOXX Eur. 600 – Zona Euro
430
280
358
-16,74%
DAX – Frankfurt Alemanha
13.789
8.442
12.089
- 12,33%
CAC 40 – Paris França
6.104
3.755
4.910
- 19,56%
FTSE MIB – Milão Itália
25.447
15.315
19.124
- 24,85%
IBEX 35 – Madri Espanha
10.083
6.107
7.177
- 28,82%
Nikkei 225 – Japão
24.083
16.553
22.518
- 6,50%
CSI 300 – China
4.204
3.530
4.139
- 1,55%
Bovespa - Brasil
119.528
63.570
93.834
- 21,50%
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados referentes à evolução de cada índice

O quadro 2 comprova que o impacto da pandemia na evolução dos negócios representados pelos índices considerados teve diferenças significativas a depender das estruturas de saúde destinadas a enfrentá-la, da realidade econômica de cada país, da possibilidade de obter uma vacina antes do esperado, do volume de recursos outorgados pelo Estado a fim de reduzir os danos produzidos pela recessão, das perspectivas de retomada das atividades após o fim do distanciamento social e dos temores relativos a uma nova onda de contágio com os primeiros passos da volta à normalidade.
Com base nesta somatória de fatores, as perdas registradas entre o ponto mais alto da valorização e o que os operadores chamam de fundo do poço flutuou entre 30,11% do índice Nasdaq Composite, que mede as ações das principais empresas de tecnologia dos Estados Unidos, e a Bovespa que sofreu a queda mais significativa entre os índices considerados com seus 46,81%.
A única exceção ficou por conta da China, o primeiro país a enfrentar a pandemia com medidas que bloquearam drasticamente as atividades econômicas, mas também o primeiro a voltar à normalidade dos negócios quando o coronavírus ampliava seu efeito devastador no mundo todo.
O índice CSI 300 mostra bem esta realidade por ser o único a ter dois ápices seguidos de duas quedas. Após atingir os 4.204 pontos em 13 de janeiro deste ano, caiu para 3.688 no dia 3 de fevereiro (-12,26%); ultrapassou a marca de janeiro no dia 5 de março, quando alcançou os 4.207 pontos, e voltou novamente ao fundo do poço 18 dias depois, quando a pandemia paralisava as atividades econômicas em amplas regiões do planeta, ao marcar 3.530 pontos (-16,08%).
O fato de o país deter mais de 50% da produção mundial de material hospitalar16 e de ser um grande fornecedor de tecnologia da informação fez com que a elevada demanda de produtos desses setores compensasse parcialmente as perdas amargadas em outros, reduzindo a desvalorização das empresas locais. O comportamento do mercado externo no segundo semestre de 2020 ainda é definido como bastante sombrio pelas autoridades da China que, no momento, não vêem as exportações como elemento capaz de dar alento à recuperação econômica do país.
Quando comparamos as posições alcançadas no dia 26 de junho deste ano com o ápice atingido em janeiro-fevereiro de 2020, percebemos que o índice Nasdaq ultrapassou em 0,33% o pico alcançado em janeiro, seguido pelo CSI 300 e pelo Nikkei, enquanto Itália, Espanha e Brasil amargam perdas superiores a 20%. No caso do Brasil, apesar de a pandemia estar fugindo do controle, o fato de a Bovespa ter recuperado mais da metade dos pontos perdidos em março passado guarda relação com o nível dos preços das principais commodities destinadas à exportação.17
Contrastante com as perspectivas negativas de crescimento traçadas pelas instituições internacionais e com o preço do ouro que se mantém 27,93% acima do patamar de junho de 2019, o otimismo que animou a recuperação das bolsas ganhou fôlego com a divulgação de indicadores econômicos melhores em relação aos esperados.
Na Zona Euro, por exemplo, na passagem de abril para maio, a taxa de desemprego subiu de 7,1% para 7,3% quando era esperado um índice não inferior aos 8%. No mesmo bloco econômico, a redução de 11,7% das vendas do varejo em abril mostrou um quadro bem menos pessimista em relação a uma queda entre 15% e 22,3% que o mercado estimava para o mesmo mês.18
Na China, as vendas do varejo em maio deste ano registraram uma queda de apenas 3% em relação ao mesmo mês do ano passado.19
As notícias dos Estados Unidos foram ainda melhores. Após registrar uma taxa de desemprego de 14,7% em abril, a mais alta desde o fim da Segunda Guerra Mundial, os operadores das bolsas de valores temiam que, em maio, ela se aproximasse dos 20%. Mas o Departamento do Trabalho estadunidense criou um clima de euforia ao anunciar que a economia havia criado dois milhões e meio de novas vagas, levando o desemprego local a 13,3%. A melhora do mercado de trabalho refletia uma limitada, porém importante, retomada das atividades econômicas, à medida que a indústria registrava o maior número de vagas criadas (255.000), seguida pelos serviços profissionais (127.000) e pelos empregados em atividades financeiras (33.000).20
O avanço da riqueza dos bilionários estadunidenses colocou a cereja no bolo das comemorações. Entre o início da pandemia nos EUA, no dia 18 de março e o dia 20 de maio, a fortuna combinada dos bilionários americanos aumentou nada menos do que 565 bilhões de dólares, 19% a mais em relação ao montante que possuíam no período anterior ao início do distanciamento social, num sinal inequívoco de que a realidade criada pela pandemia fez muito bem aos lucros de muitas grandes empresas.21
Vamos sair agora do mundo dos negócios para conhecer o que está ocorrendo entre as pessoas cuja maior façanha é conseguir recursos para matar a fome.

3. Uma visita aos pobres dos países ricos

Começamos nossa viagem pela Espanha onde, entre março e maio deste ano, a cidade de Madrid se tornou, ao mesmo tempo, o epicentro da pandemia e o lugar de uma visão típica das nações onde a fome é sempre de casa.
Nos bairros operários da capital do país, havia filas enormes de pessoas que ficavam até 7 horas em pé para ter acesso a um prato de comida ou a uma sacola de alimentos. De acordo com um levantamento realizado pela Câmara Municipal, uma em cada 4 famílias precisa de ajuda para ter acesso a produtos de primeira necessidade. As mais atingidas pela pobreza são as famílias dos desempregados e dos trabalhadores que, antes da pandemia, viviam de contratos precários ou trabalhavam por conta própria.
Sem renda em função do bloqueio das atividades, sem seguro desemprego e sem constarem dos programas municipais de renda mínima, estas famílias só podem contar com a solidariedade da vizinhança ou com a disponibilidade de alimentos em instituições de caridade para matar a fome. Mas, com o fechamento dos restaurantes que doavam as sobras das refeições e as coletas de alimentos oferecendo magros resultados, estas instituições enfrentam várias dificuldades para atender uma demanda que, nas primeiras semanas da pandemia, já havia aumentado 36%.
Enquanto empresas e bancos receberam uma ajuda que superou os 130 bilhões de euros logo no início do isolamento social, foi somente no início de junho que o Parlamento espanhol aprovou o programa de Renda Mínima da Vida Familiar, destinado a atender 850.000 famílias em situação de vulnerabilidade social a um custo total de 3 bilhões de euros. Para as empresas, o socorro imediato e generoso do Estado. Para as necessidades dos pobres, os tempos da burocracia.22
As cenas de Madrid se repetiram em Milão, a cidade mais atingida pelo coronavírus, e em muitas outras localidades da Itália onde a pandemia provocou uma grande perda na renda conseguida com trabalhos precários e informais. Em função disso, de acordo com a Coldiretti, a principal entidade sindical italiana vinculada aos pequenos agricultores, 700.000 crianças e adolescentes do país vivem em domicílios onde as famílias enfrentam sérias dificuldades para colocar comida na mesa.
Mas além da solidariedade, o agravamento da pobreza e a evolução da pandemia geraram tensões que levaram a enfrentamentos entre os próprios pobres.
Na cidade de Mondragone, entre Roma e Nápoles, moradores autóctones que viviam de trabalhos precários antes da crise hostilizaram imigrantes, vindos da Bulgária, que residem no mesmo bairro e vivem num grau de pobreza ainda maior. As queixas de que, ao violar o lockdown para trabalhar nos plantios dos fazendeiros locais, os imigrantes estariam espalhando o vírus se transformaram em gritos que acusam estes trabalhadores de estarem “roubando” os empregos que poderiam tirar os autóctones do sufoco causado pela recessão. Uma manifestação espontânea, ocorrida no dia 25 de junho, reuniu cerca de cem pessoas em frente ao conjunto habitacional onde moram os búlgaros. Houve insultos, hostilidades e agressões de ambos os lados e só não produziram algo pior pela intervenção da polícia.23 Há momentos em que a mescla de xenofobia e desespero faz os pobres se digladiarem entre si, enquanto os ricos contemplam a possibilidade de reduzir ainda mais o pagamento pelo trabalho em suas lavouras.
As filas de pessoas à espera que entidades ligadas a igrejas e ONGs beneficentes distribuam doações de comida também foram longas na Suíça. No sábado, dia 16 de maio, em Genebra, cerca de 1.500 pessoas desnudaram a pobreza que, antes da pandemia, era escondida pelas imagens dos hotéis luxuosos, das mansões, das vitrines de relógios transformados em jóias e dos bancos em cujos escritórios é proibida a entrada de clientes cuja fortuna é inferior a um milhão de dólares.
A recessão causada pela pandemia fez emergir a realidade dos imigrantes e das famílias carentes que, na fase anterior, ganhavam a vida nas cozinhas de hotéis e restaurantes, limpando mansões ou em qualquer serviço que permitisse ganhar o pão de cada dia.
Na cidade onde os bancos guardam as contas secretas dos magnatas e os cofres lotados de dinheiro, barras de ouro e diamantes abrigam o fruto da exploração do trabalho mundial, as filas da fome expõem os rostos envergonhados dos que a crise privou do pouco que conseguiam.24
Da Europa passamos aos Estados Unidos. No país que viu o patrimônio dos bilionários atingir patamares inesperados em plena recessão, milhões de pessoas que viviam de atividades informais, de trabalhos temporários ou de tempo parcial perderam seus empregos até o início de junho e mergulharam num período de crescentes dificuldades econômicas.25 Sem perspectivas de encontrar uma ocupação para garantir o seu sustento, passaram a depender da solidariedade de vizinhos e instituições para matar a fome.
Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA, antes do início da pandemia, cerca de 37 milhões de estadunidenses enfrentavam situações de insegurança alimentar em função da renda incerta ou extremamente baixa proporcionada por seus trabalhos. Em função disso, muitos deles recebiam a comida oferecida gratuitamente por instituições de caridade e pelos Bancos de Alimentos.
De acordo com uma pesquisa realizada pela Universidade de Washington na segunda quinzena de março deste ano, as entidades que faziam doações de alimentos haviam recebido pelo menos o dobro do número de pedidos registrados no mesmo período de 2019, sendo que, nas regiões mais atingidas pela pandemia, a demanda chegava a ser cinco vezes maior.26
A resignação e a aparente calmaria diante do massacre provocado pela recessão foram parcialmente sacudidas pelas manifestações que ganharam as ruas dos EUA depois da morte de George Floyd, um afro-americano de 46 anos, desempregado, cujos últimos instantes de vida foram vistos no mundo inteiro.
“Não consigo respirar”, dizia George ao ser assassinado, no dia 25 de maio, por um policial branco que esmagava o seu pescoço sob o joelho, depois de tê-lo rendido devido à acusação de um lojista que afirmava ter recebido uma nota falsa de 20 dólares como pagamento da compra por ele efetuada.
“Não consigo respirar” foram as palavras que homens e mulheres de todas as etnias gritaram e gravaram em faixas e cartazes nas manifestações em repúdio ao racismo que percorreram o mundo.
Grande parte da mídia apontou como problema central os protocolos que regulam as abordagens policiais de suspeitos de terem cometido algum crime, a necessidade de melhorar o treinamento dos agentes e de eliminar as manifestações de racismo presentes nas cidades estadunidenses.
Não negamos que tudo isso seja necessário, mas há um aspecto que chamou a nossa atenção: por que os afro-americanos transformaram as últimas palavras de George no grito de sua própria revolta? A quem interessa que a dinâmica mutante, mas sempre presente, do racismo oriente as relações sócio-econômicas de um país que é considerado a maior democracia do planeta e faz do sonho americano a idéia que atrai pessoas do mundo todo? Concretamente, por que os afro-americanos não conseguem respirar no país onde nascem, crescem, trabalham e morrem?
Repare que não estamos falando de imigrantes sem documentos que se sujeitam a tudo para ganhar a vida e poderem enviar às suas famílias no exterior os recursos que poupam, e sim de cidadãos que gozam de todos os direitos civis reconhecidos pelo Estado desde o final dos anos 60, quando a segregação foi eliminada da legislação estadunidense.
Um primeiro indício de resposta vem do próprio Martin Luther King para o qual não bastava combater a segregação, era necessário eliminar a injustiça social que a sustenta. Esta posição não era fruto de conjecturas abstratas e sim da reflexão sobre as mudanças na realidade do trabalho que vinham ocorrendo nos anos em que a luta contra a segregação alcançava seu patamar mais elevado.
Conforme estudo realizado por Sérgio Lessa,27 nas décadas de 50 e 60, a opção da elite de flexibilizar a discriminação racial visava responder à necessidade de manter baixos os salários dos operários especializados brancos. Ao impedir o acesso dos negros a determinadas funções no ambiente fabril num período de forte crescimento econômico, o racismo havia se transformado em obstáculo à acumulação. O desenvolvimento e a ampliação da indústria fordista precisavam de um número crescente de trabalhadores preparados para assumir as tarefas mais importantes do processo produtivo e a escassez desta força de trabalho, tipicamente composta por brancos, fazia com que os salários aumentassem, encolhendo as possibilidades de lucro.
Transformar negros em operários especializados levou a criar um grande número de trabalhadores prontos a assumir estes postos e fez os salários destas profissões caírem. Os ordenados dos negros permaneceram num patamar inferior ao dos brancos e isso manteve o racismo como um meio poderoso para dividir a classe trabalhadora. Isolados e humilhados pelos representantes das empresas, com inúmeras dificuldades de relação com os colegas brancos e tendo suas reivindicações raramente acolhidas pelos sindicatos, os afro-americanos passam a viver numa sociedade que mescla igualdade de direitos legais e segregação econômica.
Após a crise de 1974-75, a reestruturação do trabalho fabril promovida pelas mudanças tecnológicas altera as funções especializadas e eleva o desemprego. Este processo se soma ao crescente número de imigrantes e à possibilidade de as empresas transferirem suas atividades para países onde encontram uma força de trabalho farta, salários baixos, acesso fácil às matérias-primas e baixa conflitualidade sindical. Graças a estes ingredientes, temos um processo pelo qual a classe trabalhadora perde sua capacidade de manter os direitos conquistados e os afro-americanos vêem definhar as possibilidades de reduzir a segregação econômica na qual se encontram.28
De acordo com o Economic Policy Institute, antes da pandemia, para cada 100 dólares ganho por um estadunidense branco, um afro-americano recebia apenas 73 como pagamento do mesmo trabalho. Esta diferença cria as condições materiais para que a taxa de pobreza entre os negros seja 2,5 vezes maior em relação à dos brancos. 29
Do mesmo modo, os dados levantados pela sucursal de Cleveland do Federal Reserve Bank provam que a desigualdade nos ganhos das duas etnias se manteve praticamente inalterada ao longo do tempo. Segundo esta sucursal do Banco Central dos EUA, em 2019, a riqueza média das famílias brancas era 6,5 vezes maior do que a média constatada entre as afro-americanas, uma diferença muito semelhante em relação à que existia em 1962.30
Para manter esta realidade, o racismo mostra sua presença desde os processos de seleção dos candidatos a uma vaga. Em 2016, as Universidades de Toronto e de Stanford realizaram um estudo mostrando que os afro-americanos que tentavam esconder nos currículos enviados às empresas o fato de serem negros tinham mais que o dobro de chances de serem convocados para uma entrevista com os possíveis empregadores em relação àqueles que declaravam abertamente a cor da pele.31
A discriminação que marca presença nos salários e nas condições de vida, determina também as diferenças nos níveis de empregabilidade dos indivíduos.
Durante uma crise econômica, este último elemento faz toda diferença. Como vimos, as estatísticas sobre o desemprego nos EUA durante o mês de maio anunciavam que, com a reabertura parcial da economia, a taxa de desemprego oficial havia caído de 14,7% em abril para 13,3%. Entre os negros, porém, os números não revelavam nenhuma melhora ao mostrar que o desemprego havia passado de 16,7% para 16,8% entre abril e maio.32
Com uma renda menor e uma dificuldade maior de encontrar emprego, os afro-americanos acabam morando em bairros onde a pobreza prepara o terreno para a criminalidade ampliar seu raio de ação. Com a incerteza marcando o cotidiano da vida, a fronteira entre viver em meio a mil dificuldades pelos parcos ganhos de um trabalho honesto e a oportunidade de conseguir um pouco mais graças ao crime se torna tênue e porosa. O envolvimento das pessoas em situações violentas aumenta e, com elas, aumenta também o estigma do preconceito.
Segundo a Pew Research, em 2018, de cada grupo de 100.000 afro-americanos, 1.501 estavam presos, quase o dobro em relação aos hispânicos (797) e cinco vezes e meia maior do que os brancos não hispânicos (264). Apesar de terem caído cerca de um terço em relação a 2006, as taxas de detenção dos negros acabam alimentando o círculo vicioso que eleva a pobreza e a marginalização.
Neste cenário cuja origem está na segregação econômica, não causa estranheza que o preconceito ganhe asas entre as forças policiais. De acordo com o estudo da Universidade de Northwestern, os negros têm 2,5 vezes mais chances de morrerem nas mãos da polícia do que os brancos.33 Nos EUA, como no Brasil e em muitos outros países, ser negro é sinônimo de ser suspeito, o que, no entender dos agentes do Estado, acaba justificando o uso de medidas mais duras.
As desigualdades econômicas também se refletem fortemente nos cuidados com a saúde. Entre os negros, são muito mais freqüentes os casos de diabetes e de doenças ligadas à alimentação e às precárias condições de vida. De acordo com os Centros de Controle e Prevenção de doenças (CDC, pela sigla em inglês) 34, os negros com idades entre 18 e 49 anos têm duas vezes mais chances de morrerem de problemas cardíacos do que os brancos, e os da faixa entre 35 e 64 anos têm 50% mais possibilidade de sofrer de hipertensão. Em função disso, não é de estranhar que, segundo estas entidades, os negros estadunidenses representem 22,9% das mortes pela Covid-19, apesar de serem apenas 13,4% da população.
Resumindo, podemos dizer que o racismo foi e continua sendo um elemento poderoso no processo de acumulação. De um lado, permite pagar, sistematicamente, salários inferiores aos que são recebidos pelos brancos. De outro, cria as condições que alimentam o preconceito e ocultam os mecanismos econômicos que sufocam os negros em estruturas de dominação raramente visíveis a quem só percebe o racismo quando a ação covarde de um policial desperta indignação. Nesta realidade, as medidas que se destinam exclusivamente a alterar os protocolos de abordagem da polícia, como as que foram assinadas por Donald Trump, não passam de mudanças cosméticas que, por necessárias que sejam, não alteram a coluna vertebral do racismo.

4. A crise entre os pobres da América Latina

Dos Estados Unidos, passamos ao nosso continente, onde vamos olhar de perto a realidade da Colômbia, do Peru e do Chile. Optamos por estes países pelo fato de seus governos terem sido fiéis seguidores do receituário neoliberal, pelos baixos índices de desemprego registrados antes da crise e pelas diferentes formas nas quais suas populações reagem ao agravamento dos problemas sociais criados pela pandemia.
A Colômbia é um país com cerca de 49 milhões e meio de habitantes, sendo que 38,7% deles sobrevivem com uma renda inferior aos 5 dólares e 50 centavos diários que definem a linha da pobreza.35
Em março deste ano, o Departamento Administrativo Nacional de Estatística (DANE) afirmava que o desemprego atingia apenas 2 milhões e 969 mil pessoas e que, em função da recessão causada pela pandemia, este número havia subido para 4 milhões e 82 mil, em abril.36 Trata-se, sem dúvida, de um aumento considerável, mas, infelizmente, passa longe de representar o drama vivido pelos trabalhadores colombianos.
De fato, em agosto de 2019, o próprio DANE calculava que a informalidade atingia 62% dos ocupados nas áreas urbanas e 84% dos que trabalham nas regiões rurais. Temos, portanto, uma situação dramática à medida que mais de dois terços da população do país não conta com nenhuma forma de proteção social diante da perda dos rendimentos do trabalho. 37
Em Soacha um bairro na periferia de Bogotá, capital do país, o DANE estima que 60% dos seus moradores vivem na pobreza, um índice bem maior do que a média nacional. Aqui a informalidade é de casa e as condições de vida andam sempre de mãos dadas com a insegurança. Conforme o relato de uma moradora, “o que conseguimos em um dia, o gastamos no outro”. Ou seja, mesmo sem a pandemia, basta um nada para que a família se veja obrigada a cortar uma das três refeições por falta de comida.38
Nesta realidade, uma quarentena que prevê o fechamento total das atividades tem um impacto devastador, ainda mais quando é decretada sem que o governo conceda subsídios e ajudas para minorar a fome.
Foi por este motivo que, impedidas de trabalhar desde o dia 19 de março, milhares de pessoas foram às ruas das cidades colombianas no dia seguinte exigindo uma renda básica para as famílias pobres enfrentarem a pandemia. Os protestos se concentraram em Bogotá e manifestações menores ocorreram também em Cali, Medellín e outras localidades do interior do país. Na capital e em San Cristóbal a tropa de choque foi encarregada de dispersar os protestos dos grupos de trabalhadores informais, desempregados e imigrantes que pediam recursos para terem o que comer.
Dias depois, o governo respondeu à crise com um pacote de 15 bilhões de dólares. Desse total, o valor da ajuda alimentar destinada às famílias pobres (sacolas com arroz, lentilhas e farinha) não passou de um milhão e 800 mil dólares. O presidente se comprometeu também a emitir 500 mil bônus com valores mensais entre 45 e 110 dólares aos lares mais necessitados e suspendeu os pagamentos das contas de abastecimento de energia e água.39
O sinal de que estes recursos servem a bem pouco está nas janelas de Soacha e de muitos bairros das cidades colombianas, onde as famílias mais necessitadas penduram um trapo vermelho para sinalizar as casas onde as pessoas mais precisam da solidariedade para poder comer.
A idéia nasceu espontaneamente como uma resposta aos apelos da primeira dama do país que, no início da pandemia, pediu à população que pendurasse na janela a bandeira nacional, como símbolo do entusiasmo de um povo engajado na luta contra o vírus. À medida que a realidade dos pobres passa longe da possibilidade de viver o isolamento nos moldes típicos das classes abastadas, o pano vermelho na janela passou a representar um pedido de socorro e um símbolo de protesto contra a política governamental. 40
No dia 15 de abril, em Soacha e em outros bairros da capital, bem como em Medellín e Ciénaga as pessoas saíram às ruas para protestar agitando esses panos vermelhos, batendo panelas e cantando o hino da Colômbia. A quarentena havia sido ampliada até o final de abril e, dos 500 mil bônus prometidos pelo governo, apenas 280 mil haviam sido entregues até aquele momento. Além de ser uma mixaria, a ajuda para aliviar a fome estava atrasada. 41
Nesse dia, estações do sistema de transporte público da capital foram ocupadas pelos manifestantes, rodovias foram bloqueadas, panelaços foram ouvidos em Bogotá e nas principais cidades do país e ocorreram tentativas de saques aos supermercados. A tropa de choque foi chamada e não poupou recursos para dissolver as manifestações.
Mas esta não é a única violência que preocupa ao olharmos para a Colômbia. Na contramão de uma queda de 16% dos homicídios registrados no país inteiro durante o primeiro quadrimestre de 2020, o levantamento realizado pela Fundação Idéias para a Paz revela que, neste período, foram assassinados 49 líderes sociais, um aumento 53% em relação aos primeiros quatro meses de 2019, e as agressões praticadas contra eles registraram um crescimento de 10%.42
Estamos falando de dirigentes sindicais e de líderes comunitários, camponeses, e indígenas, ou seja, de pessoas cujo contato direto com o povo pode transformar descontentamento em ação coletiva por mudanças. A nosso ver, não há dúvidas de que se trata de um recado dos donos do poder a quem deseja fazer ecoar o grito dos pobres por justiça.
Da Colômbia, passamos ao Peru, país que, com seus 32 milhões e 900 mil habitantes, foi considerado uma “estrela em ascensão” pelos economistas liberais do mundo inteiro. Vejamos o porquê.
De acordo com o Banco Mundial, entre 2002 e 2019, o PIB do país cresceu em média 4,6% ao ano. Neste período, o PIB per capita passou de U$ 2.021 para U$ 6.941. Graças a este crescimento, a taxa de desemprego caiu de 5,84% em 2002 para 3,93% em 2018.
O Peru encerrou 2019 com um PIB de quase 229 bilhões de dólares, reservas cambiais de 68 bilhões e 44 milhões de dólares, inflação anual em 2,80%, déficit público e dívida interna que correspondem, respectivamente a apenas 1,6% e 26,8% do seu Produto Interno Bruto.43
No campo da saúde pública, ainda de acordo com o Banco Mundial, o país passou de um investimento correspondente a 2,3% do PIB em 2000, para 3,2% em 2015 (último dado disponível), o que fez o gasto per capita pular de U$ 123 para U$ 414 no mesmo espaço de tempo, um aumento de 336,58%.44
Por esses números, deveríamos encontrar um país preparado para enfrentar a pandemia, ainda mais que a primeira resposta governamental aos desafios por ela colocados impressionou o mundo das finanças com seus 26 bilhões de dólares.45
Mas o brilho dos números que fazem a felicidade dos economistas liberais esconde duras realidades. Em primeiro lugar, é preciso dizer que o forte crescimento do país ao longo das últimas décadas, além da expansão da extração de petróleo se deve, sobretudo, ao forte aumento da mineração de ouro, cobre, zinco, chumbo e estanho. Os produtos deste setor, em 2019, representaram 9% do PIB, 60% dos dólares recebidos com as exportações, 20% da receita total arrecadada através do Imposto de Renda, empregando apenas 220.000 pessoas.46
Do mesmo modo, é grande o peso da agricultura entre os produtos vendidos a outros países. Não podemos esquecer que o Peru é campeão na exportação de abacates, uvas e aspargos, produzidos em terrenos de cultivos destinados a satisfazer desejos alimentares de outros povos, e não as necessidades da população local.
Ao apostar nestes investimentos, o Peru acabou se tornando fortemente dependente das exportações de produtos primários para ter acesso aos dólares que permitem ao país importar o que precisa para fazer sua economia funcionar. Esta dependência é ainda forte em relação à China que compra 70% do cobre peruano e todo o ouro extraído pelas suas multinacionais que atuam no país.47
Se, de um lado, os ganhos com a venda das commodities minerais fizeram a felicidade de empresários e governantes, de outro, além da devastação do meio-ambiente, elevaram os problemas de saúde causados pelo acúmulo de poeira nos pulmões dos trabalhadores. Quando somamos a esta realidade as precárias condições de vida dos vilarejos onde moram os mineiros, a proximidade na execução das tarefas típicas do seu trabalho e o fato de estas não terem sido interrompidas mesmo após a detecção do contágio nas mineradoras temos como resultado a preparação de um terreno fértil para as formas mais devastadoras da Covid-19.
A baixa taxa de desemprego medida pelos institutos governamentais esconde uma realidade aterradora. Longe de termos postos de trabalho que oferecem alguma proteção social, os anos de crescimento econômico deixaram quase intocada a informalidade que caracteriza o mercado de trabalho do país.
Em 2004, cerca de 80 em cada 100 trabalhadores não possuíam nenhum vínculo formal de emprego. Este número desceu a 65 em cada 100, em 2018, o patamar mais baixo registrado pelas pesquisas; e, em 2019, a informalidade voltou a subir, alcançando 71%.48 Ou seja, 71 em cada 100 pessoas sobrevivem com aquilo que conseguem ganhar dia após dia e não têm acesso a nenhuma forma de proteção social.
Em meados de março, o governo do Peru criou um bônus de 760 sóis peruanos (U$222) a ser pago a 6 milhões e 800 mil lares mais pobres. O valor total desta ajuda que não cobre as necessidades ocasionadas pela falta de trabalho soma pouco menos de um bilhão e 510 mil dólares. Quem fez o país crescer com o suor do seu rosto tem que se contentar com apenas 5,8% dos 26 bilhões de dólares em recursos emergenciais que o governo liberou no início da pandemia.49
Podemos ter uma idéia melhor da condição de vida da maioria da população quando saímos dos parâmetros monetários que definem a pobreza para entrarmos nas casas das pessoas comuns. De fato, quando a economia cresce, pode não ser tão difícil ganhar o correspondente a mais de 5 dólares e 50 centavos por dia, mas isso não significa que as famílias contam com condições de vida melhores e mais estáveis.
Neste sentido, é interessante reparar que, apesar da taxa de pobreza ter caído de 58,7%, em 2004, para 21,7%, em 2018, de acordo com a Pesquisa Nacional de Lares, realizada pelo governo em 2019, apenas 21,9% das famílias peruanas têm geladeira e somente 38,1% dos adultos têm uma conta bancária.
Em relação à pandemia, a soma de trabalho informal, impossibilidade de guardar certa quantidade de alimentos e falta de conta bancária para receber o bônus do governo obrigou uma multidão de pessoas a romper o isolamento para ganhar alguma coisa, ir aos mercados comprar comida ou aguardar a vez de ser atendido em longas filas diante dos bancos. Isso sem contar que, para 11,8% das famílias peruanas, o distanciamento social soa como uma piada de mau gosto, à medida que a pobreza obriga seus mais de cinco componentes a morarem em um único cômodo.50
A realidade que descrevemos se traduz nos índices de mortalidade do vírus que variam a depender das regiões do país. De acordo com o mapa da pandemia da Universidade John Hopkins, dos EUA, atualizado em 19 de junho, no Peru, a taxa média de letalidade por Covid-19 é de 3% dos infectados, mas atinge 6,53% nos locais mais pobres, como Ica, 600 km a sul da capital.51
Apesar da elevação dos gastos governamentais a partir de 2000, as redes de saneamento básico e de saúde pública permanecem extremamente frágeis. Em Lima, a capital do Peru, o abastecimento de água é oferecido por cerca de 19 horas diárias,52 enquanto em Iquitos, uma cidade na região norte do país, a água potável está disponível somente durante 5 horas, inviabilizando os cuidados com a higiene pessoal.
Ao longo da pandemia, numerosos hospitais públicos do Peru registraram falta de leitos e de equipamentos para atender os pacientes atingidos pela Covid-19. A lotação das UTIs disponíveis ocorreu também em Lima onde o governo precisou invocar o direito constitucional de expropriar os privados em casos de segurança nacional ou necessidade pública para que as clínicas particulares reduzissem pela metade as tarifas cobradas para aceitar os pacientes da rede pública.53
Mas, por difícil que seja a situação em muitas unidades de saúde é em Iquitos, cidade-sede do hospital regional, que encontramos uma das situações mais gritantes.
Além de não haver medicamentos suficientes para os doentes internados, há uma grande concentração de contaminados que recebem o atendimento possível nos corredores e no pátio externo do hospital. Os mortos pela Covid 19 são guardados em sacos e amontoados no necrotério onde passam dias até serem sepultados. Do lado de fora, os parentes aguardam pacientemente a liberação dos corpos em filas intermináveis.
A ajuda que chega da capital vem a conta-gotas e os médicos aconselham os parentes dos novos contaminados a ficarem em suas casas, ainda que haja risco de morte, à medida que não há como prestar a eles nenhum cuidado hospitalar.
Em busca de uma solução, o governo local distribuiu cilindros de oxigênio aos que tentam a cura em seus lares, mas até esse gás tão comum e tão precioso no tratamento da Covid-19 anda em falta. E, frequentemente, as pessoas precisam vender o que têm para poder comprá-lo junto a algum fornecedor privado. 54
No Peru, as filas do desespero impressionam pelo cumprimento e pelas histórias de quem busca nelas um fio de esperança ou, simplesmente, a possibilidade de dar o último adeus a um ente querido. Este longo rastro de dor prova, mais uma vez, que crescimento econômico não é sinônimo de bem-estar para a maioria da população que, neste momento, trata seus sofrimentos com doses generosas de resignação.
Passo a passo, chegamos ao Chile que, em 2019, viu seu PIB somar mais de 282 bilhões de dólares, manteve a dívida interna em 27,9% deste valor e se orgulhou de ter apenas 4,4% dos seus 19 milhões de habitantes abaixo da linha da pobreza. 55
Mas a posição invejável que o país ostentava com esses dados começou a ser questionada pelas manifestações em repúdio ao aumento da passagem do transporte público ainda em outubro do ano passado. A ampliação e o prolongar-se da revolta popular revelavam uma indignação que os manifestantes expressavam com a frase: “não é por trinta pesos, é por trinta anos”. Trinta anos de desigualdade, de fragilidade das formas de proteção social, de promessas não cumpridas, de baixos salários, de endividamento familiar para custear estudos e cuidados médicos, de precarização do trabalho para 30-40% das famílias, sim, trinta anos que haviam criado uma bomba-relógio cujo detonador foi acionado pelo aumento das passagens.56
Os protestos encurralaram o governo do Presidente Sebastián Piñera, forçando-o a marcar um referendo para decidir a elaboração de uma nova Constituição para o país. Em meados de março, a pandemia silenciou a voz dos inconformes. O Estado de emergência que instaurou o isolamento social, impôs o toque de recolher e colocou uma ostensiva presença policial nos espaços urbanos, tirou o povo da rua e agravou a situação de quem vivia na corda-bamba.
Com o centro de Santiago fechado às atividades não essenciais e o aumento do desemprego, as classes média e média-alta perderam 32% da renda enquanto os setores mais vulneráveis partilharam a mesa com a fome ao ver seus ganhos caírem 72%.57
As medidas econômicas de Sebastián Piñera mostraram desde o início quem seria beneficiado pela ação do Estado. No final de março, o Presidente do Chile anunciou o primeiro pacote de estímulo à economia no valor de 11 bilhões e 700 milhões de dólares. Sob a pressão da oposição, este montante incluía três parcelas de um auxílio emergencial para as famílias mais pobres no valor de 65.000 pesos chilenos (cerca de R$ 440,00), em junho, de 55.000 pesos (R$ 380,00), em julho, e uma última contribuição de 45.000 pesos (R$ 310) em agosto. Ou seja, enquanto o socorro às empresas era imediato, a fome do povo devia esperar dois meses e meio para encontrar algum alívio.
Em abril, Piñera anunciou novas medidas para enfrentar a pandemia que previam um fundo de 2 bilhões de dólares destinados a beneficiar quase 2 milhões e 600 mil trabalhadores informais sem acesso ao seguro-desemprego e uma linha de crédito de 24 bilhões de dólares com garantia estatal para micros, pequenas e médias empresas.58
No dia 13 de maio, as autoridades chilenas pediram ao FMI um empréstimo de 23 bilhões e 800 milhões de dólares, destinado exclusivamente a socorrer as empresas.59
Sob o peso desta realidade, em meados de maio, cerca de 200 pessoas realizaram um protesto no centro de Santiago para fazer ouvir o seu desespero. Lançando mão do decreto que impede a reunião de mais de 50 pessoas no mesmo local, o governo ordenou que os manifestantes fossem dispersos por uma duríssima intervenção policial.
Mas a repressão não sacia a fome e nem cala a indignação que nasce dela. Nos dias seguintes, enfrentamentos com a polícia e barricadas foram registrados também nas cidades de Antofagasta, Concepción e Valparaíso. Em 18 de maio, centenas de moradores de El Bosque, um pequeno município a sul de Santiago, romperam o confinamento e saíram às ruas para protestar. Houve saques e confrontos com a policia que se encerraram com 22 pessoas detidas.
No dia 20, a bota da repressão esmagou um protesto em La Pintana, outro município operário na periferia de Santiago. Segundo a prefeita Claudia Pizarro, 88,9% dos cerca de 177.000 habitantes vivem na pobreza e 14% deles se amontoam em habitações de até 12 metros quadrados. Basta isso para entender por que as pessoas foram para a rua gritando “preferimos morrer de coronavírus que de fome”.60
Também em La Pintama, os manifestantes ergueram barricadas, enfrentaram a polícia que lançou mão de todos os meios para sufocar a revolta dos famintos. Como cantava Violeta Parra na música “La carta”, “em minha pátria não há justiça, os famintos pedem pão, chumbo lhes dá a milícia”.
É interessante reparar que, em algumas áreas da região metropolitana de Santiago, a ajuda do narcotráfico chegou antes daquela que havia sido prometida pelo Estado. A distribuição de cestas de alimentos às famílias das regiões controladas pelas gangues se uniu à solidariedade dos vizinhos para proporcionar uma refeição às famílias desamparadas.61 Até meados de junho, apenas 57% das famílias mais pobres da capital e das áreas adjacentes haviam recebido algum tipo de ajuda (bônus em dinheiro ou cesta de alimentos) do governo.62
Diante do agravamento da pandemia, no dia 15 de junho, Sebastián Piñera prorrogou o Estado de exceção por 90 dias. Policiais e militares farão respeitar o isolamento social, controlarão as permissões de quem está nas ruas, fiscalizarão o transporte público e irão impor o toque de recolher. Sabendo que de cada 100 trabalhadores dos níveis sócio-econômicos mais baixos apenas 28 podem trabalhar a partir de suas casas, não é difícil imaginar o que irá acontecer.63
Para assegurar o respeito às normas legais, o senado chileno aprovou, no dia seguinte, uma lei que estabelece multas entre 300 mil e 10 milhões de pesos (de 2.034 a 67.800 reais) e penas que variam de 61 dias a 3 anos de prisão para quem descumprir a quarentena, não respeitar as medidas sanitárias prescritas pelas autoridades ou não retirar a autorização para sair de casa emitida pelo poder público.64
Agora, os pobres podem escolher entre morrer silenciosamente em suas casas, ou apodrecer em prisões superlotadas por tentarem ganhar o pão de cada dia ou por teimar em fazer ouvir o seu grito de revolta.
As nossas visitas a algumas realidades dos países ricos e da América Latina mostram que, além dos negros estadunidenses, os pobres do mundo inteiro também não conseguem respirar. Preocupada com o desemprego e a falta de pão, a grande maioria deles não percebe a relação entre suas privações e a riqueza que dorme nos cofres empresariais à espera de novas oportunidades para se multiplicar com o seu suor e a sua penúria.
A indignação expressa nos protestos ainda se concentra em condenar atitudes individuais e coletivas, em denunciar abusos de governantes e forças policiais, em reivindicar o básico que a falta de trabalho está negando, mas ignora as relações de exploração e o papel nada neutro do Estado no jogo da acumulação capitalista.
Como um cachorro que morde a pedra, e não a mão que a lança, os protestos mordem medidas e atitudes que despertam raiva e indignação, mas não ameaçam as engrenagens que as sustentam e que se alimentam delas para lubrificar as relações de poder.
As contradições gritantes desta crise econômica não cessam de oferecer estímulos a uma reflexão mais profunda, de convidar os trabalhadores e as trabalhadoras do mundo inteiro a apostar numa ação que arranque o mal pela raiz.
Uma ação que começa com a construção de organizações capazes de transformar em realidade a frase que as lutas do passado entregaram aos protestos do presente: “não haverá paz enquanto não houver justiça”.

Brasil, 01 de julho de 2020.


1 O relatório completo da OCDE encontra-se disponível em: https://www.oecd.org Acesso em 11/06/2020. O relatório completo do FMI encontra-se disponível em: https://www.imf.org/em/Publications Acesso em 25/06/2020.
2 As porcentagens relativas à queda do comércio mundial constam no mesmo relatório do FMI em: https://www.imf.org/em/Publications Acesso em 25/06/2020.
3 O relatório completo encontra-se disponível em: https://www.wto.org/english/news_e/pres20_e/pr855_e.htm Acesso em 25/05/2020
4 A queda no valor das importações foi calculado pelo autor a partir dos dados da balança comercial divulgados em: https://www.ceicdata.com/pt/country/china Acesso em 11/06/2020. As porcentagens relativas à queda do comércio mundial constam do relatório do FMI em: https://www.imf.org/em/Publications Acesso em 25/06/2020.
5 Dados divulgados em: https://pt.tradingeconomics.com/commodities Acesso em 25 de junho de 2020
6 Em: https://ilostat.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/documents/briefingnote/wcms_749399.pdf Acesso em 01/07/2020.
7 Em: https://ilostat.ilo.org/global/topics/coronavirus/impacts-and-responses/WCMS_745965/lang--es/index.htm Acesso em 25/06/2020.
8 Em: https://www.imf.org/em/Publications Acesso em 25/05/202
12 Dados publicados na versão impressa do Diário do Comercio e da Indústria em 25/06/2009.
13 Infelizmente, não é possível saber a porcentagem destinada para salvar as empresas e para socorrer as pessoas, seja no que diz respeito ao atendimento hospitalar, como na forma de ajuda imediata diante da perda do trabalho e da forte redução da renda. Mais adiante, apresentaremos o que conseguimos neste sentido ao relatar a situação de alguns países.
14 Em: https://www.imf.org/em/Publications Acesso em 25/06/2020.
15 Dados extraídos de: Dow Jones: https://g.co/kgs/uBXUwX ; S&P 500: https://g.co/kgs/tM5Q47 ; Nasdaq Composite: https://g.co/kgs/UJUQDQ ; Stoxx Europe 600: https://g.co/kgs/pbWpec ; DAX: https://g.co/kgs/Zjg8Dy ; CAC 40: https://g.co/kgs/r2pME5 ; FTSE MIB: https://g.co/kgs/qkuEvo ; IBEX 35: https://g.co/kgs/snvd6m ; Nikkei 225: https://g.co/kgs/z5wbBW ; CSI 300: https://g.co/kgs/5Z2Q2R ; Bovespa: https://g.co/kgs/me6XSA Todos os acessos foram realizados em 13/06/2020.
16 Em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52465757 Acesso em 30/06/2020
17 O minério de ferro com teor de 62%, por exemplo, registrou um aumento de preços de 12,44% entre 27 de maio e 26 de junho, mas ainda amarga uma perda de 13,58% em relação ao patamar de 27 de junho do ano passado. No mesmo período, a soja teve um aumento de 1,88% em relação ao mês anterior, mas ainda apresenta um recuo de 2,32% ante junho de 2019; e a carne de boi conheceu uma valorização de 3,26% nos últimos 30 dias e de 32,19% em relação a 27 de junho de 2019. Dados divulgados em: https://pt.tradingeconomics.com/commodities Acesso em 13 de junho de 2020.
22 As informações apresentadas estão disponíveis em:
- https://brasil.elpais.com/economia/2020-05-29/espanha-aprova-renda-minima-vital-para-850000-familias.html
Todos os acessos foram realizados em 13/06/2020.
23 Os acontecimentos foram retratados na reportagem de Dario Del Porto, Gli scontri di Mondragone tra italiani e bulgari – “Noi a casa, loro lavorano”, publicada no jornal diário La Repubblica, edição impressa de 26/06/2020, pg 3.
25 Idem.
27 Em: LESSA, Sérgio. Capital e Estado de bem-estar socialo caráter de classe das políticas públicas­. ED. Instituto Lukács. São Paulo, 2013, pg. 73-74
28 idem

30 Idem.

31 Idem.
33 Idem.
34 Idem.
35 Dados publicados em WORLD BANK, Macro Powerty Outlook country-by-country – analyses and projections for the developing world. Abril de 2020. Disponível em: https://worldbank.org/en/publication/macro-powerty-outlook Acesso em 26/06/2020
36 Em: https://pt.tradingeconomics.com/colombia/unemployed-persons Acesso em 20/06/2020
37 Em: https://www.esquerdadiario.com.br/Protestos-na-Colombia-Duque-decreta-quarentena-sem-realizar-medidas-sociais Acesso em 21/06/2020.
38 Em: https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-52349231 Acesso em 10/06/2020.
39 Dados divulgados em:
- https://correio.rac.com.br/_conteudo/2020/04/agencias/928089-manifestantes-exigem-comida-e-outras-ajudas-diante-da-pandemia-na-clombia.html
- https://www.dw.com/pt-br/pa%C3%Adses-da-am%A9rica-latina-precisam-gastar-mais-para-enfrentar-recess%C3%A3o/a-53076084
Todos os acessos foram realizados em 21/06/2020
40 Em: https://brasil.elpais.com/internacional/2020-04-18/a-fome-como-bandeira.html Acesso em 18/06/2020
41 Em: https://correio.rac.com.br/_conteudo/2020/04/agencias/928089-manifestantes-exigem-comida-e-outras-ajudas-diante-da-pandemia-na-clombia.html Acesso em 21/06/2020
43 Dados divulgados em: https://www.bancomundial.org/es/country/peru/overview#1
- https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-52104166
- https://www.ceicdata.com/pt/indicator/peru/nominal-gdp
- https://www.ceicdata.com/pt/indicator/peru/unemployment-rate
- https://www.indexmundi.com/g/g.aspx?c=pe&v=71&l=pt
- https://www.bbc.com/mundo/noticias-48050868
Todos os acessos foram realizados em 19/06/2020.
44 Em: https://www.worldbank.org/em/news/press-release/2019/01/31/proyecto-creacion-de-redes-integradas-de-salud-beneficiara-a-203-millones-de-peruanos Acesso em 19/06/2020.
45 Dados publicados em :
- https://brasil.elpais.com/economia/2020-05-24/pandemia-apaga-os-tres-farois-economicos-da-america-latina.html
- https://brasil.elpais.com/economia/2020-06-08/brasil-mexico-e-peru-arrastam-america-latina-para-sua-maior-recessao-desde-que-ha-registros.html
Acessos realizados em 10/06/2020.
46 Em: https://www.bbc.com/mundo/noticias-52371359 Acesso em 18/06/2020.
47 Em: https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-52104166 Acesso em 19/06/2020.
48 Em: https://www.bbc.com/mundo/noticias-48050868 Acesso em 18/06/2020.
49 Em: https://www.bbc.com/mundo/noticias/america-latina-52748764 Acesso em 19/06/2020.
50 Idem.
51 Em: Acesso em 20/06/2020
52 O dado se refere ao ano de 2013 e consta do panorama do Banco Mundial atualizado em 11 de outubro de 2019. Disponível em: https://www.bancomundial.org/es/country/peru/overview#3 Acesso em 19/06/2020.
53 Em: https://www.bbc.com/mundo/noticias-america-latina-53185216 Acesso em 27/06/2020
54 Copilamos nos parágrafos anteriores as notícias relativas à cidade de Iquitos publicadas em: https://www.bbc.com/mundo/noticias/america-latina-52670889 E em: https://www.bbc.com/mundo/noticias/america-latina-52413260 Acessos em 19/06/2020.
55 Dados publicados em WORLD BANK, Macro Powerty Outlook country-by-country – analyses and projections for the developing world. Abril de 2020. Disponível em: https://worldbank.org/en/publication/macro-powerty-outlook Acesso em 26/06/2020
57 Os dados foram publicados na síntese da pesquisa IPSOS/ESPACIO PÚBLICO, Como se vive la cuarentena em la región metropolitana?, realizada na região metropolitana de Santiago do Chile entre os dias 12 e 16 de junho de 2020. Em: https://www.espaciopublico.cl/category/publicaciones Acesso em 26/06/2020.
59 Dados publicados em:
- https://br.sputniknews.com/americas/2020051315575666-em-meio-a-pandemia-chile-pede-us-238-bilhoes-ao-fmi/
Acesso em 17/06/2020.
61 Idem.
62 Dado publicado em: IPSOS/ESPACIO PÚBLICO, Como se vive la cuarentena em la región metropolitana? O relatório completo da pesquisa está disponível em: https://www.espaciopublico.cl/category/publicaciones Acesso em 26/06/2020.
63 Idem.
64 No momento em que escrevemos, esta lei aguarda apenas a sanção presidencial para entrar em vigor. Maiores informações através do link: https://www.senado.cl/aumento-de-sanciones-para-quienes-no-cumplan-cuarentena-pasa-a-tercer/senado/2020-06-16/173146.html Acesso em 25/06/2020.