Por Emílio Gennari
Os
números da violência assustam. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança
Pública de 2016, 58.383 pessoas foram assassinadas ao longo do ano passado, uma
a cada 9 minutos. De 2011 a 2015, as mortes violentas somaram 278.839, quantidade
que supera as 256.124 da guerra na Síria.
Em
termos estatísticos, o Brasil se destaca também pelo alto número de policiais
que matam, que morrem e que tentam tirar a própria vida. Sempre em 2015, a
atuação da polícia brasileira acumulou 3.345 mortes, 45% das quais ocorreram
nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente com 848 e 645
pessoas alvejadas.
De 2009
a 2015, 733 agentes foram assassinados em serviço e outros 1839 durante as
folgas ou trabalhando em bicos. Em relação aos suicídios, apesar de não
existirem estudos de âmbito nacional, a pesquisa realizada pelo Centro
Latino-Americano de Estudos da Violência e Saúde da Fundação Osvaldo Cruz, com
policiais fluminenses, civis e militares, constatou que o sofrimento psíquico
atingia níveis preocupantes em 33,6% dos soldados da PM entrevistados e em
20,3% dos agentes da Polícia Civil, sendo que na PM a taxa de suicídios era 7,2
vezes maior do que a média da população brasileira.[1]
Na
mídia, criminalidade, violência e segurança pública são temas que andam de mãos
dadas. Em volta deles, reportagens e debates de todos os tipos invocam mais treinamento
e rigor das forças policiais. Sob a pressão dos acontecimentos, vítimas e
culpados trocam de lugar no banco dos réus. Os holofotes apontados para o dedo
que aperta o gatilho focam a gota que faz o vaso transbordar e mergulham nas
sombras por ela produzidas os complexos problemas que encheram o vaso e prometem
gerar ocorrências ainda mais assustadoras.
Bastam
poucas perguntas para visualizar o tamanho do abismo que permanece intocado:
Qual é a eficácia real de uma segurança pública baseada na força em áreas onde o
Estado prima pela ausência na hora de garantir os direitos básicos à saúde,
trabalho, moradia e educação? É possível resolver “à bala” a violência cuja origem
deita raízes na marginalização social? Em que medida, ao apresentar o cotidiano
como uma guerra de todos contra todos, a mídia banaliza a violência a ponto de
contagiar as relações entre as pessoas?
Em que
referência simbólica se baseia a imagem do policial ideal, preparado, destemido
e que nunca erra? O que significa para um agente em carne e osso viver em
situação de risco e obedecer a ordens superiores mesmo quando estas contrariam
sua percepção do cotidiano? Que parâmetros lhe permitem optar pelo uso da força
e dosar a intensidade com a qual vai empregá-la? Como demarcar a fronteira
entre a legitimidade da coação, autorizada pelo Estado, e a violência policial
numa realidade ameaçadora e imprevisível? Quantas são as chances de um policial
sob pressão fazer a “escolha certa”?
Responder
a estas, e outras, perguntas não é parte de um esforço que visa justificar o comportamento
deste ou daquele ator social, seja ele policial, criminoso ou manifestante, e,
menos ainda, procura fazer com que o culpado mude apenas de endereço ao passar
de quem apertou o gatilho a quem deu as ordens.
Perguntar
o porquê do por que da realidade é um passo necessário para trazer à tona
aspectos que costumam permanecer nas sombras e sustentam os acontecimentos que
condenamos. Sem a pretensão de esgotar o debate, nossas breves reflexões buscam
apenas trazer à luz algumas peças deste imenso quebra-cabeça.
1.
Violência, mídia e senso comum.
Não é de
hoje que as pessoas encontram nos meios de comunicação um espaço no qual se
identificam em termos de ideias, valores e critérios que permitem compreender a
realidade. A sintonia que se estabelece entre leitores, ouvintes e
telespectadores com determinadas publicações e programas tem como elo o perceber
que as próprias ideias e vivências são parte de um universo mais amplo.
Constatar que há mais gente pensando ou fazendo a mesma coisa é fonte de segurança
e atua como critério de “verdade”. Assim, dizer que “deu no rádio, no jornal,
na TV ou na internet” acrescenta às convicções do indivíduo uma comprovação
quase indiscutível de que se trata de algo partilhado e veraz.
Para
obter este resultado, é importante que as manifestações e posições de um
determinado veículo de comunicação dialoguem com o senso comum, o façam evoluir
sem provocar reações frontais e criem uma sensação de identidade que desativa a
capacidade de refletir criticamente sobre o conteúdo apresentado. Fisgar um
determinado público alvo e fazê-lo sentir “em casa” impede que o indivíduo sequer
perceba os três crivos pelos quais passam as notícias desde a narração primária,
produzida pelas testemunhas, ao momento em que são divulgadas:
1.
O
interesse da fonte em relatar e omitir determinados aspectos do ocorrido;
2.
A
ideologia e a política do grupo editorial que definem o que deve ser sublinhado
e omitido;
3.
As
características do leitor, ouvinte ou telespectador que acompanha programas e
produções e que, como assinalamos acima, precisa encontrar no sentido divulgado
de um acontecimento os elementos que renovam sua fidelidade à mídia em questão.
A
“verdade”, comprovada por imagens, sons e afirmações devidamente montadas, é o
resultado da mescla de elementos que se descolam do acontecimento inicial e, ao
reforçar ou relativizar determinados aspectos, torna dispensável a busca das
causas profundas que lhe deram origem ou define como inaceitáveis as
explicações obtidas a partir delas.
O nível
de ambiguidade aumenta quando o que está em foco são as cenas de violência e
brutalidade criadas pela atuação do tráfico, pelas incursões policiais nos seus
territórios ou pelas agressões a manifestações de protesto. Frequentemente
mesclado a imagens e diálogos impactantes que alimentam a sensação de desamparo,
o sentido dado às notícias procura qualificar a mídia como intérprete do
sentimento coletivo que pede ao Estado medidas enérgicas para resolver os
problemas apresentados. E, como as aparências sempre dão razão às aparências, a
solução não pode ser outra: uma polícia que não dá moleza, bem treinada,
equipada com o que tem de melhor, capaz de distinguir os “bons” dos “maus” em
qualquer teatro de operações, que não erra em sua tarefa de proteger o cidadão
honesto e cujos membros são controlados de perto por instituições destinadas a
impedir vacilos e desvios de conduta. Sem dúvida, um corpo de segurança
utópico, inexistente em qualquer lugar do mundo, mas que entra como uma luva no
imaginário do senso comum.
E, aqui,
duas observações se fazem necessárias:
1.
Os
aspectos negativos das ações policiais e os vínculos com o crime de alguns de
seus membros, também são utilizados para afirmar a necessidade de uma polícia
ideal. A desqualificação nunca é motivo para uma análise criteriosa da
realidade que levou a determinado desfecho, mas apenas reafirma, sob outro
enfoque, o refrão utópico apresentado;
2.
Por
sua vez, as apreensões de armas e drogas, as detenções e os flagrantes
comprovam que os agentes de segurança poderiam atingir o patamar ideal se
contassem com mais poder de agir, meios avançados e eficientes.
Nos
sucessos e nos fracassos, o foco da mídia não se afasta dos elementos
imediatos, dando a impressão de que é possível construir uma segurança pública que
se sustenta apenas na força policial.
Ao
excluir, parcial ou totalmente, as relações econômicas e sociais, a situação
real dos territórios que abrigam o caldo de cultura para o desenvolvimento da
criminalidade simplesmente desaparece. Nomes de ruas, bairros e morros se
tornam sinônimo de violência indiscriminada, terra de ninguém, lugar sem lei,
símbolo de risco iminente, a qualquer hora do dia e da noite. Em volta deles, a
parcialidade da mídia cria fantasias, medos, fobias e representações da
realidade que concentram a percepção coletiva nos elementos que sustentam sua
visão de segurança pública. Concretamente, ninguém se pergunta por que, em
determinado lugar, as pessoas se armam e arriscam suas vidas para vender
substâncias ilícitas, quem são os compradores preferenciais dos entorpecentes,
que condições alimentam o crescimento do tráfico nestes ambientes e qual é a
trajetória de quem se envolve com o crime.
A
marginalização e a invisibilidade a que são condenados os moradores das
periferias parecem não guardar nenhuma relação com o reconhecimento, a
valorização, a autoestima, o acesso a recursos materiais e simbólicos proporcionados
pelo tráfico e que servem de passaporte para a visibilidade e o pertencimento
ainda que no ambiente limitado de uma favela. Quem era humilhado e discriminado
a ponto de sentir vergonha ao informar o endereço de residência, no interior da
organização criminosa, ganha respeitabilidade pela arma que carrega e a fama
que o acompanha; tem acesso a bens que antes pertenciam a sonhos distantes,
ainda que isso implique em correr o risco de ter sua vida ceifada por uma morte
prematura e violenta. A fronteira que separa o passar necessidade e ser
marginalizado, apesar de se esfolar num trabalho honesto, do sair do aperto e
obter centelhas de reconhecimento graças ao crime é sempre muito tênue e porosa.
Os mecanismos que permitem atravessá-la em ambas as direções são complexos e
não imediatamente visíveis, mas conhecê-los e tratá-los como questões sociais é
o passo indispensável para privar a criminalidade das condições que hoje
permitem sua expansão.
Neste
contexto, as medidas de segurança pública são apenas parte do processo e, por
sinal, uma parte bem pequena em relação ao tamanho da tarefa. Mas, ampliar o
foco da análise leva a questionar a ordem social, a investigar a rede de
relações que produzem a desigualdade e a marginalização, a atingir os
interesses das elites e a incomodar os setores médios que, com elas, alimentam
o coro da limpeza étnica. Sem resolver questões de fundo, a segurança pública é
e será sempre uma forma de tapar o sol com a peneira, ainda que, de imediato, o
impacto de algumas medidas produza efeitos superficiais cuja duração tem prazo
de vencimento marcado pela capacidade que a criminalidade tem de reorganizar
suas fileiras graças aos meios incessantemente produzidos pela realidade
social.
Sob os
holofotes da mídia, o policial passa de herói a vilão a depender dos
acontecimentos, da realidade que ocultam e do processo pelo qual a
identificação do dedo que aperta o gatilho dispensa qualquer reflexão sobre a
complexidade das questões que explicam o seu gesto. Assim, os traficantes que
dominam os morros, os policiais que matam inocentes, ou se corrompem, são
transformados em bodes expiatórios de um sistema que precisa ocultar os
problemas que ele próprio criou.
Mas isso
não é tudo. À medida que a falta de segurança é sistematicamente vinculada a
uma legislação permissiva, às falhas da polícia e à expansão da criminalidade,
a ideia pela qual “bandido bom é bandido morto” ganha feições de uma
autorização social para matar a fim de evitar que os “maus” ameacem os “bons”.
Ao fazer isso, as imagens e estereótipos criados pela mídia colocam as forças
policiais entre o prego e o martelo por razões que guardam uma relação direta
com o setor da sociedade que está com a palavra. Não faltam pesquisas que, por
motivos opostos, apontam como ruins e malquistos os serviços de segurança
pública de uma mesma cidade. Da classe média pra cima, as queixas se concentram
na insegurança e na ineficiência policial, à medida que falta rigor e
vigilância em relação aos pobres “criminógenos” que circulam pelos bairros onde
os ricos moram ou desfrutam dos momentos de lazer. Do lado oposto, a população
das favelas e periferias se sente discriminada, maltratada e profundamente
insegura diante das atitudes e práticas dos agentes da lei.
A
pergunta natural que nasce desta percepção não guarda relação ao como conciliar
duas posições contrastantes num ideal de segurança pública que só existe no
imaginário coletivo e sim em verificar se há uma diferença substancial nas
saídas apresentadas para a violência por parte de quem está numa situação de
marginalização social.
Uma
pesquisa de opinião conduzida pela UNIFESP em localidades da Grande São Paulo com
altos índices de criminalidade, como Heliópolis, Capão Redondo, Perus,
Guaianazes e Osasco, e publicada no jornal El País em 10 de novembro de 2015,
ajuda a transformar impressões em números. Realizada com homens e mulheres
acima dos 16 anos de idade, a enquete revela que, para 93% dos entrevistados,
são necessárias ações mais duras para combater o crime nesses bairros, sendo
que 90% do total são a favor de aumentar a presença da polícia nas ruas, 74%
votaria num político de linha dura contra o crime e 74,7% apoia a redução da
maioridade penal. E isso apesar de 66,7% acharem que a polícia é violenta,
62,6% reconhecê-la como racista e 60% ser contrário à ideia de que ela deve
matar bandidos. Trocado em miúdos, a vivência diária da relação com a polícia
real não questiona o imaginário semeado e adubado pela mídia, mas apenas os excessos
e as distorções do policiamento em razão dos quais se afasta majoritariamente
do suposto consenso pelo qual bandido bom é bandido morto.
As
saídas costumeiramente apontadas para a segurança pública têm como pressupostos
não só a falta de percepção das raízes sociais da violência, mas a
identificação da sua origem na índole das pessoas e nos problemas familiares
pelos quais passaram, como se esses âmbitos não guardassem nenhuma relação com
o ambiente externo. Por esta visão, a origem do mal estaria no DNA do indivíduo
ou da educação recebida e não no funcionamento da sociedade, sempre apresentado
como natural e mera somatória de obras do acaso.
Preservado
e inocentado o sistema, colocadas suas vítimas no banco dos réus, a resposta
social apoiada pelo senso comum se assemelha à do cachorro que morde a pedra e
não a mão que a atira. O produto da marginalização, da fome e da humilhação que
apela à violência para lançar o seu pedido de socorro, canalizar sua revolta e
buscar espaços de afirmação, ainda que isso o afaste da denúncia das injustiças
sofridas e de possíveis aliados, é mordido com a demanda de ações duras que o
façam recuar ao conformismo de quem tem como perspectiva de vida apenas o ser
feliz na favela onde nasceu. Em troca, pede a um sistema marginalizador que lhe
dê uma chance de sair do anonimato e revelar os próprios talentos num patamar
onde indivíduos esforçados e merecedores, e não a coletividade, ocupam o centro
das atenções. E, como é de se esperar, quando tudo depende fundamentalmente do
indivíduo, não há como e nem porque visualizar o caminho que leva ao fim da
marginalização como causa coletiva.
Quando
migramos dos programas de notícias e documentários para os seriados policiais veiculados
pelas emissoras de TV a cabo, constatamos a presença de algo que vai além dos
elementos apresentados.
Apesar
de serem obras de ficção, o realismo das tramas que se desenrolam na tela se
preocupa em fazer com que o telespectador encontre, em cada capítulo, o retrato
de uma realidade possível graças à proximidade com o ambiente em que se movimentam
seus temores e expectativas. A mescla de habilidades pessoais, raciocínios
lógicos, coleta criteriosa de evidências, competências diferenciadas, respostas
à altura dos desafios e práticas que se descolam das prescrições legais na
condução das investigações leva a um trabalho policial de excelência que, quase
invariavelmente, consegue colocar os criminosos atrás das grades. Aos poucos, assistir
ao seriado passa de uma diversão a uma forma de restaurar no plano simbólico um
mundo no qual a ordem sempre acaba por prevalecer e onde os “maus”, por hábeis
que sejam, vão encontrar alguém capaz de desmascará-los e prendê-los.
Contudo,
este alguém não é mais o ser excepcional, de qualidades extraordinárias e reputação
a toda prova dos filmes e seriados de trinta anos atrás, mas um policial que
alterna momentos de heroísmo e de fragilidade, que comete deslizes, fundamentalmente
fiel aos valores do seu país e da corporação, mas também capaz de violar as
normas para extrair uma confissão e levar a bom termo a investigação na qual
está envolvido. A punição do criminoso é a peça-chave em volta da qual as
falhas são justificadas e os abusos perdoados.
Na serie
televisiva NCIS, por exemplo, Gibbs, a personagem principal, tem esposa e filha
assassinadas pelo integrante de um cartel de drogas que foge para o México a
fim de não ser preso. Inconformado com a impunidade, Gibbs vai atrás dele,
descobre onde se refugia e o mata. Nos capítulos seguintes, encontramos vários
momentos que retomam a discussão sobre o ocorrido deixando o telespectador com
duas pergunta para as quais a trama oferece subliminarmente uma resposta: É
justo que, contrariando frontalmente a lei, Gibbs mate o assassino impune de
seus familiares? Até a que ponto o encarregado pelo Estado de fazer justiça de
acordo com a lei pode violá-la sem ser punido?
A atitude complacente dos colegas de profissão
que visa acobertar o crime, e não demonstra se incomodar com o desvio de
conduta de seu chefe, apoia a ideia pela qual fazer justiça fora dos meios legais,
enquanto resposta proporcional a um crime, pode ser aceita quando as garras da
lei foram incapazes de evitar a impunidade.
A troca
da morte do traficante pelo assassinato de duas pessoas inocentes, sem que
ninguém mais fosse atingido, é considerada aceitável em função da
proporcionalidade que estabelece entre os acontecimentos. Aos poucos, as violações
cometidas pelos policiais dos seriados colocam o telespectador na soleira da
porta que dá acesso a uma “justiça” que não passa pelos tribunais, contraria a
lei e depende da atuação de cada agente, mas que é aceita como forma de eliminar
as ameaças ao cidadão de bem que os caminhos oficiais foram incapazes de deter.
Além
disso, os seriados costumam apresentar a imagem de um policial quase
impermeável ao sofrimento psíquico. Tiroteios, perdas de colegas, ferimentos
que levam o agente à beira da morte, etc, no máximo, deixam nas personagens
sofrimentos passageiros, rapidamente superados em nome do dever, do treinamento
recebido e das novas investigações. Enfim, uma situação em que fraquejar não
passa de um momento transitório e absurdamente breve quando comparado ao
desgaste sofrido. O ser humano que veste o uniforme de policial mostra
capacidades incomuns em relação às de seus semelhantes que, caso fossem uma
condição fundamental para ingressar na carreira, com certeza, esvaziariam as
fileiras da corporação.
Num balanço
geral, podemos dizer que os seriados e as intervenções que predominam na mídia
sustentam a que chamávamos de autorização social para matar, como se este ato
não tivesse consequências negativas para a sociedade e para os próprios
policiais.
Por
isso, a seguir, vamos resgatar os aspectos essenciais das pesquisas às quais
tivemos acesso e que trazem um quadro assustador dos problemas enfrentados
pelos agentes, do treinamento à atuação no âmbito da corporação, e das
consequências diretas no seu equilíbrio emocional.[2]
2. Treinamento, missão e...o impacto com a
realidade
Refletimos
acima sobre os limites de uma política de combate ao crime desvinculada de
respostas abrangentes aos problemas sociais. Situação igualmente complexa vem à
tona sempre que protestos de rua são reprimidos, tenham ocorrido ou não
provocações ou atos de vandalismo.
Sempre
que, ao apresentar suas reivindicações, os movimentos são coagidos, intimidados
ou repelidos a cacetadas, gás lacrimogêneo, etc., o Estado mostra que não irá
titubear no uso da força para restabelecer a ordem de marginalização em volta
da qual organiza a vida em sociedade. O medo de apanhar da polícia, o
questionamento da legitimidade das reivindicações e a criminalização dos
movimentos podem adiar os prazos das novas manifestações, mas não impedir ao
descontentamento atiçado pelas contradições sociais de se concretizar em novas
formas de protesto.
Basta
isso para percebermos que a postura da policia diante dos setores da população
que se mobilizam para reivindicar direitos negados aponta para uma somatória de
fatores raramente visíveis ao senso comum e que, com o tempo, levam parte dos
agentes a se transformarem em monstros ou a perderem o sentido do trabalho. Um
exemplo vai ajudar a visualizar esta realidade.
No
domingo, dia 30 de outubro, o juiz Alex Costa de Oliveira, do Distrito Federal,
autorizou a polícia militar local a lançar mão de técnicas de tortura para
forçar o desalojamento dos prédios ocupados pelos estudantes que protestavam
contra a Proposta de Emenda Constitucional que encolhe os gastos públicos,
incluídos os que se destinam à educação, e a proposta de reforma do ensino
médio enviada ao Congresso pelo governo através da medida provisória 746/2016.
A intervenção do juiz faz com que a Polícia Militar do DF possa lançar mão da privação
do sono (com som em alto volume nas 24 horas do dia), do corte de água, luz e
gás, além de restringir o acesso de familiares e amigos, incluídos os que levam
alimentos aos estudantes. E, se isso já não fosse o bastante, o senhor Alex da
Costa diz que as medidas devem ser aplicadas em cada escola ocupada,
“independentemente da presença de menores”.[3]
Não
sabemos se você teve acesso a esta notícia e qual é a sua reação diante desta
tentativa de criminalizar um movimento social pacífico, mas pedimos que se
coloque por um instante nos sapatos dos policiais encarregados dos
desalojamentos. De um lado, não há como negar que se deve executar o que a
justiça manda. Mas, como morador das regiões periféricas, você tem noção das
precariedades e problemas das escolas do seu bairro, conhece alguém que estuda
nelas, pressente que as coisas podem realmente piorar e que sua ação ajudará a
realidade a caminhar nesta direção.
Como você
se sentiria ao seguir as recomendações do juiz? Seria apenas mais uma situação
indesejável do trabalho policial? A ordem de desalojamento produziria um
conflito entre a sua leitura da realidade e o mandato que deve realizar? Como
administraria a tensão que nasce dele? Conseguiria sufocar sentimentos e
percepções de que há algo errado nisso tudo? Os desdobramentos da sua ação e as
respectivas consequências para alunos e comunidades não arranhariam a sua forma
de ver a profissão?
Repare
que para quem senta na cadeira do juiz, a crença pela qual esta manifestação de
protesto precisa ser dissolvida a fim de restabelecer a ordem, pode fazer todo sentido,
ainda mais que os filhos dele não estudam em escolas públicas do ensino
fundamental e médio, a família passa longe de morar onde você mora, não será o
juiz a viabilizar as medidas recomendadas e nem a lidar com os sentimentos
negativos pelas consequências nefastas que elas podem provocar. Mas para você,
policial, que sentido faz usar práticas de torturas contra estudantes, muitos dos
quais são menores de idade?
Imagine
agora que você endureça a ponto de executar a autorização judicial sem titubear,
pois, afinal, você é um homem da lei, treinado para manter a ordem, o que
implica em fazer cumprir os mandatos judiciais. Sentiria orgulho e satisfação
ao realizar esta missão? A capacidade de silenciar qualquer questionamento que
a sua consciência pode despertar abriria caminhos para a banalização de formas
brutais de agressão no cotidiano do trabalho policial? Usar instrumentos de
tortura contra um movimento pacífico o faria sentir previamente autorizado a
adotar medidas ainda mais duras quando da abordagem ou interrogatório de suspeitos
e criminosos?
É apenas
um exemplo, mas é inegável que situações parecidas se repetem com uma frequência
inesperada. Quantas delas você conseguiria enfrentar sem problemas ao se
colocar diante do divisor de águas que separa o caminho para a brutalidade do
que leva imediatamente a um sofrimento psíquico desgastante? Ainda que
conseguisse optar sempre pelo primeiro, o seu agir nunca questionaria o sentido
do que faz e no qual procura reconhecimento e realização?
São
somente perguntas. E se trata apenas de um exemplo. Mas que elementos o
cotidiano do policial têm em comum com a realidade que esboçamos com essas
questões?
Os
textos e as reportagens consultadas são unânimes em apontar a ideologia que
rege as instituições militares como uma das principais responsáveis pela
brutalidade da violência policial. Ao assumir como próprios o modelo
institucional e a estrutura organizacional do Exército, a polícia militar deixa
de compreender o seu papel como “serviço público” para adotar uma lógica de
atuação baseada na guerra, e, portanto, voltada a eliminar os inimigos num
ambiente onde os suspeitos são alvos de um ataque potencialmente destruidor.
Fortalecido durante a ditadura militar, que encarregava a PM de realizar um
policiamento ostensivo e repressivo para aniquilar os grupos que atentavam
contra ela, o confronto armado continua sendo estimulado como forma de
enfrentar o crime, cuja organização e poder de fogo crescente são usados para
justificar o permanecer desta perspectiva que orienta a ação policial.
À medida
que as instituições são permeadas pela percepção do criminoso como inimigo a
ser destruído, contagiando seus agentes e transformando-os aos poucos em máquinas
de matar ou morrer, o cenário mais provável é o de que se instaure neles um
processo de desumanização cujos efeitos perversos apontam, de um lado, para a
brutalidade no uso da força e, de outro, para patamares de sofrimento psíquico
insuportáveis para os próprios agentes. E não é pra menos. A ideia de segurança
pública como filha única de uma guerra a tudo o que pode ganhar o nome de
“crime” reflete as formas de gestão que a elite brasileira reserva aos
marginalizados que ela própria produziu com suas ações no campo da economia e
da política. A ordem pública que o Estado convoca as polícias a fazer respeitar
se baseia nos interesses de segmentos e espaços sociais determinados, de
estruturas unidas por uma argamassa que mescla aspectos legais propositadamente
vagos à construção de um consenso pelo qual, por exemplo, um pneu incendiado no
protesto de um movimento social emerge como um ato de “vandalismo” e “violação
de um direito coletivo” bem mais grave do que as atrocidades econômicas que
produziram a revolta materializada no fechamento temporário de uma via de
acesso por aquela ação dos moradores.
O
resultado esperado não pode ser outro: uma polícia envolvida em sucessivas e
diferentes cruzadas em defesa de uma sociedade onde a importância dos seres humanos
se define pelo tamanho de suas contas bancárias, realizada por agentes armados
cuja origem social se situa no campo oposto ao da elite, mas que foram
instruídos a suprimir o próprio pensamento e a cumprir ordens. O tipo de
cruzada e o peso da mão de ferro a ser utilizada nos combates guarda uma
relação direta com o momento político, com a possibilidade de lutas sociais
extrapolarem os limites definidos pelas elites, com a distribuição da riqueza
produzida, com o acesso a bens e serviços, além do desgaste da imagem pública
dos governantes de plantão. Seja como for, o agir policial é orientado para
esmagar um conjunto variado de perturbadores (pouco importa se eles são
traficantes, ladrões, homicidas ou lutadores sociais) cuja ação cria obstáculos
ao funcionamento da ordem e ameaça semear o caos da mesma forma em que uma
nuvem carregada traz a tempestade.
O
pressuposto para esta concepção funcionar e produzir os efeitos desejados deita
raízes na necessidade de o policial abrir mão de seus valores e vivências, das
ideias e critérios de análise que possuía antes de ingressar na corporação como
condição para se encaixar no “molde” do qual sairá pronto para ir a campo. Ou
seja, para realizar suas atribuições de soldado numa guerra sem trégua e sem
fim, o agente precisa aprender a olhar para a realidade através de parâmetros
que não são os seus, mas sem os quais não poderá atuar num corpo policial do
Estado. Ao fazer isso, o indivíduo perde a sua subjetividade, precisa suprimir
suas reações diante dos aspectos cotidianos que revelam as monstruosidades da
ordem que se preparou para defender e que estão sob seus próprios olhos nas
casas dos vizinhos, no bairro onde mora, no seu próprio círculo familiar, nos
colegas de farda tratados às vezes como peças descartáveis e diante das
consequências sofridas no exercício da profissão.
A
sobreposição da “personalidade do trabalho” à identidade do sujeito provoca
tensões que o policial raramente consegue equacionar a contento. A sua
disposição e capacidade de suprimir as percepções, as dúvidas, as incertezas,
os contrastes e as contradições que as ações policiais deixam nele têm limites.
A pressão alimentada por este combustível tende a elevar a agressividade, a produzir
desequilíbrios psíquicos, a impedir que o policial possa lidar bem com
sentimentos e emoções e a levá-lo a um isolamento social que, em muitos casos,
inclui o próprio âmbito familiar.
Alguns
exemplos ajudam a visualizar quanto acabamos de apontar. Entre os traços da
personalidade do trabalho, encontramos a suspeita em relação ao outro como peça
importante da ação policial. À medida que, a priori, ninguém pode ser visto
como sem envolvimento com um determinado caso, a desconfiança é um aliado
necessário no exercício do trabalho. O problema está, justamente, em traçar uma
fronteira entre o nível de suspeita adequado às situações enfrentadas e a
suspeição que é a sua deformação neurótica. De fato, não há como “desligar”
este aspecto ao retornar para o ambiente familiar, sair de férias ou nas demais
relações diárias. A suspeita que torna eficaz a atuação do agente molda também o
óculo através do qual ele enxerga a vida fora do trabalho e, aos poucos, se
constitui em mais um elemento que o isola do convívio social. Para compensar
este distanciamento, o policial tende a fortalecer os laços com os membros mais
próximos da corporação e a consolidar determinadas leituras dos acontecimentos
para se convencer do acerto de suas posições. Mas, com o tempo, o círculo de
contatos e relações assim criado se fecha a ponto de não incluir momentos de
convivência com os que estão fora desse meio.
Do mesmo
modo, a busca da objetividade necessária para o desempenho da profissão leva o
agente a classificar problemas e situações na base do “certo” ou “errado”,
desprezando qualquer meio termo. O fato de sua reflexão e construção do
conhecimento não ir além de pares opostos se acentua à medida que ele se vê
como alguém que, ao agir desta forma, resolve os problemas do trabalho e exerce
certo domínio sobre a realidade, mesmo em situações perigosas. Se, de um lado,
a natureza da atividade exige objetividade, de outro, a vida fora do trabalho é
pródiga em momentos que não podem ser enclausurados na lógica do “certo” ou
“errado”, que demandam jogo de cintura, paciência para deixarem os acontecimentos
amadurecerem, flexibilidade para intervir em seu desenvolvimento utilizando
formas de compreensão que superam a divisão da realidade em campos opostos.
Quando a
identidade policial se impõe às de marido, pai, irmão e amigo e o agente se
torna incapaz de dialogar com a leitura do cotidiano que estas exigem, ele
começa a enfrentar atritos que reduzem o nível de sociabilidade no interior do
círculo familiar e do ambiente em que se movimenta fora do trabalho. Ir ao
clube, ao cinema, ao parque com os filhos e a esposa, fazer um churrasco com
amigos que não são da corporação começa sendo difícil e pode se tornar um
evento raro e inviável com o passar do tempo. Ao agravar o isolamento e os
sentimentos de aflição, a realidade vivenciada começa a apresentar uma
sequência de situações que o policial sente não poder dominar ou controlar. Se,
diante desta percepção, ele for aplicar a leitura dos eventos que o cercam na base
do “certo” ou “errado”, a hipótese mais provável é a de que venha a elevar o
nível de cobrança pessoal e alimentar uma crescente sensação de fracasso.
As
dificuldades que os policiais têm de lidar com os problemas pessoais guarda
relação também com o esforço de escamotear as próprias emoções, exigido dos
agentes em serviço. Mas, uma coisa são as prescrições e outra, bem diferente,
as situações do trabalho real. De fato, a rotina de um policial é feita de
imprevistos e demanda que ele passe por momentos que vão de um extremo a outro.
Por exemplo, como deixar de sentir raiva contra alguém que está sendo preso por
estupro ou por matar a esposa de forma covarde? Do mesmo modo, e às vezes horas
depois, será que dá para conter expressões de empatia diante da vítima de um
crime, ainda mais se esta for uma criança?
Mas isso
não é tudo. Mesmo sendo hábil em desativar e dominar as próprias emoções quando
está em serviço, será que o agente consegue “religá-las” ao voltar para o
convívio familiar ou nos momentos de descanso e lazer? Ou será que este
processo vai levá-lo a instaurar relações frias e impessoais e, ao não
conseguir se despir da identidade profissional, fazer com que assuma posturas
autoritárias, agressivas e silenciosas com os próprios familiares? Ver que as
emoções estão fugindo do controle faz o policial entrar em conflito consigo
mesmo, eleva o nível de estresse, aumenta a cobrança em relação à própria
postura, gera frustrações ao perceber a dificuldade de conseguir e pode abrir
as portas a situações de confusão mental.
Por outro lado, o contato frequente com
situações de miséria humana demanda que ele erga uma barreira capaz de
protegê-lo do impacto dos eventos com os quais se depara. Suas defesas contra a
desumanização e o embrutecimento devem ser fortalecidas sempre que a realidade
impacta o equilíbrio emocional, mas, quando a solidariedade e a confiança dos
colegas são a única proteção com a qual pode contar, é possível que os esforços
do agente não sejam suficientes para dar conta desta tarefa.
Numa profissão
que tem o uso da força e da autoridade como meio de ação, a agressividade é um
fator importante na seleção dos futuros policiais. O que se exige do candidato
como pressuposto para entrar na corporação é que tenha um bom nível de
agressividade, que saiba controlá-la e aprenda a canalizá-la, ou seja, que ele
seja capaz de dosá-la de acordo com a situação. Sem dúvida uma tarefa difícil não
só por se tratar de uma atividade onde o risco é companheiro de todas as horas,
mas, sobretudo pelos efeitos da “pedagogia do sofrimento” usada no treinamento
dos futuros agentes.
De
acordo com um levantamento de 2014, apresentado no Fórum Brasileiro de
Segurança Pública, 28% dos policiais entrevistados afirmaram terem sido vítimas
de torturas em treinamentos ou fora deles e 60% narraram situações de
desrespeito ou humilhação por superiores hierárquicos. Privação do sono,
pancadas, tarefas em salas impregnadas de gás lacrimogêneo e pimenta, almoço
misturado com água e consumido com as mãos imundas de terra e pus, humilhações
e assédio moral integram um cardápio de cunho militarista ligado a costumes e
hábitos de um guerreiro que tem no combate bélico a forma prioritária de
proteger a sociedade. A crença que está na base desta opção de treinamento
baseada na violência psicológica, moral e até física, é a de que o corpo e a
mente dos futuros soldados devem ser condicionados para vencer o medo e o
perigo como condição básica para a guerra contra o crime. Longe de reforçar o
valor da comunicação com as pessoas, da solução de problemas e da relação com a
comunidade, os rituais da pedagogia do sofrimento tendem a levar os recrutas a
naturalizarem a truculência e a humilhação como marcas de seus contatos com os
cidadãos.
Último,
mas não menos importante, é o abismo entre a visão heroica da missão, que faz o
policial se sentir uma espécie de salvador e protetor da coletividade, e o
cotidiano vivenciado no trabalho. Alguns dados ajudam a ilustrar quanto
acabamos de afirmar. Em média, no Brasil, ocorrem 56.000 homicídios dolosos por
ano, dos quais apenas 8% são investigados, ao mesmo tempo em que o país tem a
quarta população carcerária do mundo. O aparente paradoxo entre os números da
impunidade e o dos presidiários não se deve apenas às especificidades do
trabalho da Polícia Militar, que está na rua 24 horas por dia e cuja
efetividade se mede pelos flagrantes realizados, mas por uma situação econômica
que alimenta a criminalidade. Em outras palavras, os 92% dos homicídios impunes
não têm como base a incapacidade pessoal de agentes e investigadores e sim o
aumento vertiginoso da criminalidade, das características do seu armamento e
formas de ação que as políticas de segurança pública não vão poder derrotar na
base da repressão ou melhorando efetivos e equipamentos.
Com o
passar do tempo, o acumulo de casos sem solução, as demandas que não param de
crescer e as situações degradantes que adubam a proliferação do crime alimentam
nos policiais a sensação de que o seu esforço não passa de uma tentativa de
enxugar gelo. Sob o peso da realidade, instalam-se neles sentimentos de
frustração, inutilidade e impotência que levam à visão de uma sociedade onde
todos são ruins, provocam um distanciamento do trabalho policial, forçam a adotar
posturas frias para reduzir o impacto de realidades dolorosas e fazem do álcool
e das drogas o caminho mais utilizado para se desligarem do cotidiano.
Os
aspectos que levantamos não permitem apenas compreender o trabalho policial com
maior objetividade, mas também começar a reunir os fatores que elevam a taxa de
suicídios. Será sobre esse tema, sempre difícil de compreender e aceitar, que
esboçaremos as próximas reflexões.
3. O suicídio no caldeirão do sofrimento
psíquico.
A
simples tentativa de tirar a própria vida nos coloca diante do colapso das
esperanças, dos planos e das expectativas que o indivíduo tinha em relação a si
próprio e ao ambiente circunstante. A morte como solução para o sofrimento
psíquico que se avoluma a ponto de apresentá-la como única saída indica a
urgência de uma reflexão profunda. Sob a suposta “fragilidade emocional do
indivíduo” ferve um caldeirão de fatores organizacionais que, ao não serem
corrigidos, continuarão produzindo e ampliando as situações nas quais viver ou
morrer começa a não fazer diferença.
No Brasil,
faltam estatísticas nacionais em relação aos suicídios de policiais e às
tentativas frustradas de cometê-los. A percepção comum aos pesquisadores é de
que muitos casos registrados como mortes de policiais em acidentes e
ocorrências do trabalho não passam de suicídios disfarçados à medida que, em
muitos estados, as famílias dos agentes perdem os direitos legais quando se
comprova que foram eles a tirarem a própria vida. Assim, não se defender ou não
tomar as devidas precauções num conflito armado com os criminosos, se deixar
alvejar ao participar voluntariamente de uma operação, ou expor-se desnecessariamente
ao perigo são exemplos de situações que podem indicar uma intenção suicida.
Afinal,
o que torna os policiais de todas as corporações mais vulneráveis ao suicídio
do que a média da população? Que elementos do cotidiano contribuem para
desestruturar psiquicamente pessoas que foram preparadas para as tarefas da
profissão? Em que medida o treinamento recebido leva o agente a implodir diante
da realidade? Se conviver constantemente com o risco aumenta a vulnerabilidade
do policial, que suporte é oferecido aos agentes que passam por situações
traumáticas? Por si só, estas questões indicam que as respostas não são simples
e exigem visualizar como a organização do trabalho cria situações que
fragilizam a estrutura psíquica dos membros da corporação. Vejamos.
Como em
qualquer profissão, o trabalho policial mescla momentos de reconhecimento,
satisfação, realização pessoal a situações de angústia, incerteza, frustrações,
atritos com colegas e superiores, ocasiões em que respeitar as regras pode
colocar em cheque o andamento de uma investigação, mas violá-las para levá-la a
bom termo significa enfrentar a possibilidade de ser repreendido e punido. Este
vórtice diário mescla situações opostas que forçam os agentes a acertarem
contas com a sua forma de pensar o trabalho, com as normas que regem sua
atuação e com uma realidade cujo grau de imprevisibilidade é capaz de
surpreender até profissionais experientes e gabaritados.
Um
exemplo vai ilustrar quanto acabamos de afirmar.
O intenso
processo que leva os recrutas a passarem da condição de civil à de policial
federal incute uma sensação de força emocional sobre-humana, seja pelo
treinamento das técnicas de defesa pessoal e uso de armamentos, seja pelos
momentos que levam a ver o trabalho como excitante e sempre aberto ao novo. As
práticas desenvolvidas viciam muitos novatos em adrenalina ao mesmo tempo em
que permitem que eles se apropriem das regras que orientarão o trabalho na
corporação e servirão de parâmetro para julgar a sua atuação.
Este
período marca também o início do isolamento do futuro policial federal, à
medida que o candidato provém de várias regiões do país e a Academia Nacional
de Polícia é em Brasília. O regime de semi-internato dura, no mínimo, três
meses ao longo dos quais os alunos devem pernoitar nos alojamentos da Academia,
podendo sair dela apenas nos finais de semana. Mas, devido à distância dos
locais de origem, a maioria dos alunos acaba permanecendo na capital durante o
período da sua formação, o que fragiliza as relações e a integração que o
indivíduo tinha antes de ingressar na corporação. O isolamento se aprofunda
quando os recém-formados são lotados nas regiões norte e centro-oeste, de
fronteira ou nas localidades para as quais é sempre difícil encontrar gente
disposta a ficar e aí permanecerão anos à espera da remoção. Destinado a uma
comunidade que não é a sua, distante dos amigos e da família, o policial
vivencia uma progressiva destruição de suas raízes identitárias e passa a poder
contar apenas com o apoio e a solidariedade que encontra no restrito grupo junto
ao qual irá atuar.
Por sua
vez, o impacto com o trabalho real produz as primeiras frustrações em quem
acaba de sair da Academia. De um lado, o cotidiano da corporação não é sempre
tão excitante e desafiador. Os viciados em adrenalina tendem a ficarem
deprimidos nos momentos em que predominam a calmaria, as tarefas burocráticas
ou rotineiras a ponto de se sentirem desinteressados com tudo o que não guarda
uma relação direta com os desafios do trabalho policial propriamente dito. A
missão assumida deixa de ser divertida e desafiadora enquanto jogo de sabedoria
e habilidades para se tornar um trabalho vazio, irritante, incapaz de gerar
satisfação.
Por
outro lado, a participação em ações que apresentam diferentes graus de risco
nem sempre é coroada pelo reconhecimento esperado. De acordo com os depoimentos
reunidos pelas pesquisas, o clima interno mudou muito ao migrar de uma situação
de confraternização aberta após cada operação bem-sucedida às disputas entre castas
que pressionam os níveis inferiores da pirâmide hierárquica e produzem
situações de rivalidade, conflitos internos, perseguição e assédio moral.
Assim, o cotidiano mescla cada vez mais ações contrastantes que abrem caminhos
para a elevação do sofrimento psíquico.
Mesmo não
sendo um corpo militarizado, a Polícia Federal segue um regime bem próximo ao
das forças armadas e cuja lógica funcional tem a preocupação básica de proteger
a instituição. O zelo pela imagem pública decorre da visibilidade e da
vulnerabilidade da polícia que é vigiada e influenciada pela Justiça, o
Ministério Público, as organizações civis e a mídia. Sob o olhar de atores
sociais que podem desqualificar ou enaltecer o seu desempenho, a organização
formal da corporação procura controlar o comportamento dos agentes por meio da
hierarquia e da disciplina mostrando-se como uma instituição que age de forma
legal, ordenada e racional.
Apesar
de atuar em ambientes marcados por constantes mudanças, situações heterogêneas
e graus diferenciados de risco e imprevisibilidade, o trabalho policial visto
pelo topo da hierarquia revela a crença na capacidade de fazer a corporação
funcionar como um homem só graças às regras que definem a forma de agir dos
agentes. Por outro lado, é fato que algumas normas podem dar origem a abusos
quando de processos administrativos contra um de seus membros. Por exemplo, o
regulamento prevê uma punição para quem “trabalha mal”. O problema está
justamente em definir o que é trabalhar mal, ainda mais quando o risco e a
imprevisibilidade são parte constitutiva do cotidiano dos policiais e podem
gerar situações de dúvida, incerteza e ambiguidade frente às quais será o
próprio agente a fazer a mediação entre o trabalho prescrito e a realidade. À
medida que a resposta depende de quem analisa cada situação, cria-se um clima
no qual a disciplina extrema leva os subordinados a adotarem posturas
defensivas, um padrão rígido de comportamento e a alimentar uma cultura
informal que, na ausência de canais para um diálogo efetivo, pode se contrapor
à formalidade do regulamento.
Assim
como ocorre em todas as profissões, a identidade coletiva produzida por esta
cultura informal é própria de quem lida com o trabalho real e se expressa em
ideias, práticas, vivências, critérios para interpretar e reagir diante da
realidade que traduzem a forma pela qual o trabalho é visto e produzido pelos
seus executores. O patamar de solidariedade e relação que se estabelece no
interior do grupo é fundamental para compensar o isolamento, estimular a
confiança recíproca, proteger de situações desgastantes e faz da confiança nos
colegas a base a partir da qual pensar o trabalho e, sobretudo, os momentos em
que o estrito cumprimento dos regulamentos atrasa, prejudica ou inviabiliza a
sua execução. Longe de constituir um patamar de entendimentos livre de
contradições, infrações e atritos, a organização informal do trabalho privilegia
a iniciativa, a negociação, a adoção de certa margem de liberdade na gestão de
situações conflitantes e a solução de dilemas que demandam respostas imediatas.
Mas, ser parte do grupo implica também em alimentar a sua identidade com a
própria experiência e em agir com lealdade em relação aos demais sob pena de
ser excluído do mesmo, de não contar com a cooperação dos colegas e de
experimentar um isolamento que eleva a sensação de insegurança.
Seja
qual for a opção do agente enquanto indivíduo, há sempre um preço a ser pago em
termos de sofrimento, pois os contrastes, ou a oposição, entre as práticas
originadas pela identidade coletiva e as normas da corporação o colocam entre o
prego e o martelo. Como “homem da lei” ele se sente incomodado ao transgredir a
norma para elevar a eficácia do trabalho. Porém, não transgredir implica na
possibilidade de se sentir excluído por seus pares e correr o risco de não produzir
os resultados esperados. Desrespeitar o regulamento pode levar a sanções
disciplinares. Mas respeitá-lo e reduzir a eficácia da investigação implica na
possibilidade de sofrer pressões hierárquicas em função da falta de resultados.
O conflito entre as normas oficiais, a organização informal e o estar a serviço
da lei alimenta sentimentos ambivalentes em relação à instituição, à sociedade,
aos colegas de profissão e ao próprio trabalho de policiamento, frente ao qual
o agente passa a alternar sentimentos de amor e ódio.
Ao focar
a polícia civil e militar as pesquisas apresentam vários fatores que elevam o
sofrimento psíquico e marcam a distância entre o que é feito e o que é
percebido como necessário. Ser policial significa caminhar lado a lado com o
risco 24 horas por dia, o que implica em viver uma situação de constante
insegurança no exercício da profissão, no trajeto para casa, nas folgas e
momentos de lazer. A vivência concreta de situações de risco e de perda de
colegas em enfrentamentos armados fortalece a presença constante da sensação de
provisoriedade da vida e proximidade da morte.
Ao
renovar-se e atualizar-se diariamente em novas situações, a percepção de viver
à beira do abismo alimenta o estresse e amplifica o medo a ponto de levar os
policiais a vivenciarem um conflito entre a postura que ressalta os atributos
da virilidade, desejada pelas instituições, e o sentimento de medo da morte que
os acompanha. Este enfrentamento no interior de cada agente se amplifica na medida
em que ele se vê numa guerra onde a precariedade dos equipamentos e das
estratégias de ação se depara com a sofisticação dos armamentos e da
organização da criminalidade a ponto de fazer com que a presença de policias em
alguns setores passe a ser vista como uma sentença de morte antecipada. Ainda
que esta situação seja mitigada pela união das equipes nas atividades
cotidianas alguns fatores atuam como elemento de desgaste. Entre eles, sublinhamos:
1.
O
uso abusivo de serviços extras. Pelos dados publicados, três situações
caracterizam o prolongamento da jornada de trabalho. A primeira guarda relação
com a distância entre o batalhão e o local onde o agente irá cumprir o seu
plantão. A segunda é vinculada à ocorrência de eventos que demandam o corte das
folgas e o aumento das horas trabalhadas. A terceira diz respeito ao “bico”, ou
seja, à dupla jornada que o agente assume fora do trabalho como forma de
aumentar a renda familiar. Estima-se que mais da metade dos policiais tenha um
segundo emprego que, como nos casos anteriores, transforma o tempo que deveria
ser destinado ao descanso e à recuperação psíquica, em períodos onde a
exposição ao risco mantém elevados os níveis de estresse.
2.
Treinamento
e tempo de serviço. Não são poucos os casos em que os agentes vão exercer um
trabalho para o qual não foram treinados ou não têm conhecimento prático. Os
eventos que requerem condições extraordinárias de policiamento são um exemplo
desta realidade. É nestes casos que costumam ser escalados para o policiamento
de rua também aqueles agentes que prestam serviços internos. O fato de serem
designados a executarem atividades para as quais não estão habituados e sem ter
familiaridade com o ambiente e a equipe na qual irão atuar faz com que a falta
de entrosamento e o desconhecimento dos lugares onde é possível se proteger em
caso de enfrentamento armado elevem a exposição ao risco. Sem experiência
acumulada, a possibilidade de algo dar errado no manejo de vivências próprias
do cotidiano da profissão cresce sempre que a realidade coloca problemas cujas
respostas não estão nos manuais e sim na capacidade do agente de construir
saídas a partir da prática desenvolvida ao longo dos anos.
3.
A
ausência de espaços para o diálogo. A estrutura hierárquica da corporação é um
dos traços marcantes de sua organização interna e da forma como é pensada a
realização do plano de segurança pública. Abusos por parte dos superiores, como
situações de assédio, perseguição ou transferências de policiais que não
guardam relação com motivos administrativos ou disciplinares costumam gerar um
forte desgaste emocional entre os agentes, ainda mais quando afetam a vida
familiar. Por outro lado, a ausência de diálogo se manifesta na falta de
instâncias coletivas de reflexão e avaliação do trabalho. Falhas ou problemas que
ocorrem no desempenho das ações são tratados apenas nos escalões hierárquicos
superiores sem contar com a contribuição de quem se depara diariamente com eles
e, por isso mesmo, tem plena condição de ajudar a pensar soluções que superem o
caráter reativo, imediatista e focado nos aspectos operacionais do
policiamento.
Do mesmo modo, não há uma política de atenção ao
policial que acaba de vivenciar situações de estresse agudo como um conflito
armado ou a perda de um colega em serviço. Hoje, o normal é o agente voltar ao
trabalho na mesma hora como um super-herói impermeável aos traumas sofridos e
sempre pronto para a próxima missão. Sem contar com o suporte e a compreensão
apropriados, a perda da sensibilidade e a elevação do medo sobem a patamares nos
quais tanto os medicamentos receitados como o refugiar-se no álcool e nas
drogas pouco podem fazer para ajudar a relaxar e conter o desgaste psíquico. A
situação se agrava quando, ao procurar os serviços disponíveis, o agente se
depara com um profissional que é de patente superior. Nele, o policial não vê
um médico, um psiquiatra ou psicólogo, mas um oficial que, ao ouvir seus
relatos, pode puni-lo ou prejudicá-lo. Por outro lado, o acesso à ajuda
especializada fora da corporação costuma esbarrar nos custos elevados das
consultas e dos tratamentos, inacessíveis para os níveis salariais mais baixos.
E, aqui, não precisamos ser especialistas para entender que um policial
emocionalmente desestruturado pode elevar não só a sua exposição ao risco, como
a da equipe e das pessoas presentes no ambiente onde atua.
É
importante sublinhar que os elementos apresentados desde o início foram
separados para facilitar a análise e a compreensão, mas agem simultaneamente no
cotidiano de um agente, com diferentes graus de importância a depender da
frequência e da gravidade das situações vivenciadas, de sua capacidade de
resiliência e do apoio com o qual pode contar. Porém, o simples fato de os
policiais terem uma taxa de suicídio bem superior à média da população indica
que as chances reais de compensar o desgaste psíquico sofrido são inferiores às
que apontam em sentido inverso.
As
pesquisas consultadas sobre tentativas de suicídio por parte de policiais
revelam outros aspectos preocupantes.
A demora
em procurar ajuda especializada, por exemplo, ocorre também em função do mito
do policial herói e guerreiro, construído durante a sua formação. Treinado para
cumprir sua missão sem direito de errar ou titubear, o agente não aceita se
ver, e ser visto, como fraco, fracassado ou como alguém cujo sofrimento rompe
com os valores primordiais da corporação. Esta postura que dificulta o
reconhecimento do próprio processo de adoecimento é fortalecida pelos tabus que
ainda cercam os distúrbios psíquicos e a forma como seus portadores são tratados
por colegas e superiores. Rotulados de “malucos”, mantidos à distância e
tratados com estranhamento após uma tentativa de suicídio, os policiais com
forte desequilíbrio emocional veem sua condição de adoecimento sendo ignorada
ora como forma de defesa de quem sente começar a enfrentar problemas
semelhantes, ora para manter intacta a imagem de guerreiro intrépido veiculada
pela corporação.
Não
bastassem os estereótipos e as dificuldades próprias do tratamento psiquiátrico,
há casos em que a situação do agente que tentou se suicidar é agravada pela
ocorrência de punições arbitrárias. A experiência do Cabo Silva, da Polícia
Militar do Rio de Janeiro, ilustra bem este processo ao contar o que aconteceu
com ele no dia em que voltou ao Batalhão: Fiquei
quinze dias em casa; quando voltei pra trabalhar eu estava trabalhando já com
arma de fogo, normalmente. Não entrei nem em SINA[4].
Quando eu voltei, fiquei seis dias detido no Batalhão, preso. É. Meu tratamento
foi esse. Eu fiquei dois dias hospitalizado e quinze em casa. No 16º dia, eu
voltei à companhia. Me entregaram à tropa e fui punido. Por disparo de arma de
fogo em via pública. Entendeu? Só que tem um erro aí; eu li “Disparo de arma de
fogo em via pública”, quando não há um fixo; o fixo era eu; eu não dei disparo
a esmo; eu era o alvo. Então não foi disparo a esmo, foi um tiro consciente, em
mim mesmo, não foi inconsciente. E fiquei seis dias no Batalhão. Agravou?
Muito. Ao invés da polícia me dar apoio psicológico, me tratar, não; primeiro,
ela me puniu. Por isso que eu não procurei...todos foram...todas as minhas
perguntas que foram feitas, por intermédio da polícia, eu falo que não, e não
vou procurar; o motivo é que eu estava realmente doente; agora vou caminhar com
as minhas próprias pernas, e vou ter que me cuidar, porque? Está me entendendo?
Não tive apoio nenhum, nenhum, nenhum.[5]
Além dos
preconceitos e tabus institucionais, os policiais em situação de
vulnerabilidade psíquica temem perder o acesso à própria arma de fogo e, sem
ela, ver comprometida a própria segurança e a renda mensal. Parte da sua
identidade enquanto policial, a arma é bem mais do que um instrumento de
trabalho, é algo que o faz integrante de uma corporação, de um grupo de pessoas
que combatem a criminalidade. Não menos importante, a liberação para o uso da
arma de fogo enquanto profissional de segurança proporciona o acesso às
bonificações financeiras recebidas pelos agentes que não têm restrições médicas
para o seu manuseio e o trabalho de policiamento ostensivo. Por outro lado, o
acesso à arma 24 horas por dia aumenta o risco de suicídio de quem está emocionalmente
abalado. À medida que o ato de tirar a própria vida tem um forte componente de
impulsividade, o revólver na cintura facilita o acesso ao meio que permite
praticá-lo e, ao que tudo indica, o simbolismo que a arma tem para o policial
faz dela o meio preferido para o gesto suicida.
Em
nossos dias, o suicídio de policiais constitui um fenômeno preocupante. Mergulhar
no cotidiano da profissão para buscar as causas dessas mortes é, ao mesmo
tempo, essencial e profundamente incômodo à medida que traz à luz aspectos da
organização do policiamento que as estruturas do Estado precisam preservar para
garantir a manutenção da ordem de marginalização. O sistema não se importa que
as coisas comecem a não fazer sentido para o agente, mas, à medida que este mesmo
agente se depara com contradições e conflitos pessoais que o levam a perder o
sentido do trabalho, pode enveredar pelo perigoso caminho da desestruturação
psíquica no qual o suicídio é o passo extremo. O atentar contra a própria vida coloca
o dedo em feridas que extrapolam o âmbito pessoal e se transforma em pedido de
socorro que assinala a urgência de mudanças profundas. Por isso, além de
doloroso e inquietante, o suicídio é sempre cercado de fortes resistências à
busca da verdade e dos nexos que permitem romper a barreira das aparências.
Nossas
reflexões chegaram ao fim. Nelas traçamos linhas que permitem entender vários
aspectos do trabalho policial e trazer à luz o que se esconde nas dobras do
cotidiano. O silêncio que mergulha no esquecimento a razão de ser da violência que
nos assusta é o mesmo que prepara cenários futuros mais tenebrosos, mantém
intactos os interesses em jogo na forma atual de pensar e conduzir a segurança
pública e inviabiliza qualquer possibilidade de discutir abertamente a atuação
das forças policiais num pais onde a democracia é sinônimo de eleição, mas não
de compromisso para extirpar os mecanismos que geram desigualdades e injustiças
gritantes.
[1] Dados publicados na matéria de Fernanda da Escóssia, Pesquisas mostram avanço de suicídio entre
policiais brasileiros, divulgada através da página eletrônica da BBC em
português: www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/07/150730_suicidio_policiais_fe_ab
[2] Fundamentalmente, estamos nos referindo aos trabalhos
de: Dayse Miranda (Org.) Por que os
policiais se matam – diagnóstico e prevenção do comportamento suicida na
polícia militar do estado do Rio de Janeiro. Ed. Mórula, Rio de Janeiro,
2016; Tatiane da Costa Almeida, “Quero
morrer do meu próprio veneno” – representações sociais da polícia e do suicídio
entre os alunos dos cursos de formação profissional da Academia Nacional de
Polícia. Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto Universitário de
Lisboa em 2013; Maria Cecília de Souza Minayo, Edinilsa Ramos de Sousa e
Patrícia Constantino, Riscos percebidos e
vitimização de policiais civis e militares na (in)segurança pública. Em: Cadernos de Saúde Pública, Rio de
Janeiro, Novembro de 2007, pg. 2767 a 2779.
[3] O acontecimento provocou indignação mundo afora e
encontrou um bom espaço no cotidiano mexicano La Jornada do dia 02 de novembro
de 2016. Você pode conferir a íntegra da matéria em: http://www.jornada.unam.mx/2016/11/02/mundo/020n2mun
[4] SINA: Serviço Interno Não Armado.
[5] A entrevista está na página 79 do livro de Dayse
Miranda (Org.) Por que os policiais se
matam – diagnóstico e prevenção do comportamento suicida na polícia militar do
estado do Rio de Janeiro.
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