quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

A sua voz é o seu maior patrimônio. Cuide dela com carinho: Dicas da Doutora Rebeca.

Este artigo inaugura uma modalidade importante no nosso Blog: aquela que contém dicas de como cuidar de si e dos colegas de trabalho e dos que mais sofrem com as doenças ocupacionais.

Neste artigo publicamos uma orientação segura para os milhões proletários que têm na voz seu principal instrumento de trabalho.

Uma especialista, fonaudióloga, nos informa as causas de alguns problemas de voz e como proceder para minimizar ou resolver as questões na saúde da comunicação mais comuns que estes profissionais  enfrentam.

Boa leitura.


 A Fonoaudiologia e a saúde da comunicação dos Professores

Dra Rebeca Rodrigues

Fonoaudióloga, Mestra e Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana.


O fonoaudiólogo é o profissional responsável pela prevenção, promoção e reabilitação da comunicação da população. A profissão passou a ser reconhecida e regulamentada em 9 de dezembro de 19811. É nesse dia e mês que é comemorado o dia do Fonoaudiólogo. Como fonoaudióloga, posso dizer que você precisará desse profissional por toda a sua vida. 

O Conselho Federal de Fonoaudiologia reconhece as seguintes especialidades da Fonoaudiologia:  Audiologia; Linguagem; Motricidade orofacial; Saúde coletiva; Voz; Disfagia; Fonoaudiologia educacional; Gerontologia; Fonoaudiologia neurofuncional; Fonoaudiologia do trabalho; Neuropsicologia; Fluência2. O profissional Fonoaudiólogo, associado a uma equipe multidisciplinar e integrada, pode ajudar em muitos tipos de orientações, triagens, avaliações e reabilitações voltadas à comunicação.

Com a pandemia de COVID-19, muitos profissionais fonoaudiólogos são necessários, no intuito de avaliar e reabilitar sequelas deixadas pelo coronavírus, tais como, os transtornos da deglutição em pacientes que foram submetidos à intubação orotraqueal, para manejo da disfagia e redução do risco de bronco aspiração na extubação3. Além disso, há discussão sobre a necessidade também de reabilitação vocal em casos de extubação. Há um estudo que demonstrou a prevalência da lesão laríngea proporcional ao tempo que um paciente precisou ficar intubado, resultando em risco de disfonia (76%) e disfagia (49%) após a extubação4. As inúmeras sequelas neurológicas, respiratórias, auditivas, etc. decorrentes do vírus, relacionadas à comunicação, vêm sendo investigadas5,6.

No caso das possíveis alterações de comunicação do Professor, o Fonoaudiólogo pode ajudar, tanto no sentido de tratar as possíveis sequelas de COVID-19 relacionadas à comunicação, quanto para tratar quaisquer outras alterações de comunicação  – voz, audição, fluência, linguagem, etc.

As questões dentro desse público, que trabalha por muitas horas utilizando sua voz, retórica e oratória, por essa razão, estarão mais comumente associadas aos distúrbios vocais7. O fonoaudiólogo responsável por avaliar e reabilitar distúrbios da voz é o especialista em Voz.

Na sociedade atual, aproximadamente um terço das profissões têm a voz como ferramenta básica de trabalho, ou seja, considerável parcela dos nossos trabalhadores é composta por usuários vocais ocupacionais, e que se incluem nesta categoria professores, cantores, atores, operadores de telesserviços, religiosos, políticos, secretárias, advogados, profissionais da saúde, vendedores, entre outros”8. Essas ocupações podem apresentar a combinação de uso prolongado da voz e fatores inapropriados do ambiente, como ruído de fundo, acústica ambiental e qualidade do ar inapropriadas, e da organização do trabalho, ou seja, aspectos referentes à forma, condições e à intensidade com que o trabalho é executado8.

Dentre alguns sintomas vocais, temos a Disfonia, manifestação que compõe o quadro de distúrbio de voz8.  “A Disfonia representa toda e qualquer dificuldade na comunicação oral que impede a produção natural da voz e prejudica diversos aspectos da qualidade de vida”9. Sintomas comuns podem ser cansaço ao falar; rouquidão; pouca resistência ao falar.

É preciso estar atento, pois alterações vocais podem ser sinais de questões mais sérias, como doenças neurológicas (por exemplo, Doença de Parkinson), refluxo gastroesofágico ou até mesmo câncer de laringe. É fundamental trabalharmos a nossa consciência sobre a nossa voz e, diante de qualquer mudança, procurar um profissional. Os sinais de atenção podem ser: rouquidão, ardência, falhas e cansaço para falar por mais de 15 dias sem um motivo aparente (não ocasionados por infecções de garganta, esforço ao falar em situações esporádicas que demandaram maior esforço vocal, como uma apresentação, por exemplo)10. Visto que a voz engloba mobilidade e força da musculatura orofacial, a própria laringe (órgão responsável por muitas funções tais como proteção, respiração, deglutição e produção da voz; as pregas vocais ficam nesse órgão), pulmões, etc, se você não cuidar de sua saúde vocal, isso pode causar muitos danos futuramente e a sensação de que você “está sem voz” e de “cansaço vocal” podem ser frequentes. Nesse caso, procure um profissional fonoaudiólogo especialista no assunto. Você pode estar utilizando sua voz incorretamente, não estar tendo pausas de silêncio e de repouso vocal necessários no trabalho, ou, ainda estar em um ambiente frequentemente ruidoso, que faz com que você precise gritar para ser ouvido, por exemplo.

As principais causas relatadas pelos professores que podem levar a sintomas vocais e até mesmo ao distúrbio de voz podem ser: o uso intensivo da voz, estresse, infecções respiratórias e alergias, esforço ao falar, refluxo gastroesofágico, condições ambientais inadequadas (acústica, ruído interno, ruído externo, umidade, poeira), falta de preparo ou treinamento vocal e hábitos vocais inadequados7,11,12. Vale dizer que o consumo de, por exemplo, bebidas alcoólicas, assim como o tabagismo podem também gerar sérios problemas para a sua saúde vocal13.

Algumas orientações podem ser encontradas nesse guia disponibilizado pela Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia (SBFa), em 2011, “Respostas para perguntas frequentes na área de voz”:

https://www.sbfa.org.br/campanhadavoz/FAQs2011.pdf

e também nesta campanha mais recente do Dia Mundial da Voz (16 de abril), que trouxe “Dicas para ser Amigo da Sua Voz”, disponilizada pela SBFa:

https://www.sbfa.org.br/portal2017/campanhas/voz/

O profissional fonoaudiólogo especialista em voz, através de avaliação e monitoramento, poderá orientar sobre como utilizar sua voz de maneira correta, manejos para melhorar sua saúde vocal, o tempo que você deve descansar sua voz, a necessidade de hidratação (beber água é muito importante), além de exercícios de aquecimento e relaxamento para seu aparelho fonador, assim como ele poderá realizar a análise do ambiente do professor (ruídos locais, qualidade do ar), junto a outros profissionais quando necessários, sugerindo intervenções necessárias ao professor durante sua aula para auxiliar em sua saúde vocal (exercícios para melhorar a sua projeção vocal; utilizar um microfone, por exemplo; ou a redução do ruído ambiente).

É por isso que o profissional Fonoaudiólogo também pode trabalhar nas ações de vigilância em saúde de muitos trabalhadores contratados por empresas, verificando se há algum distúrbio de voz relacionado ao trabalho (DVRT)14. Artigos anteriores têm discutido que “os fatores organizacionais do trabalho, assim como os distúrbios de voz, muito frequentes na docência, carecem de maior atenção da legislação no Brasil”12.

Nesse sentido, devemos lutar e exigir aos setores públicos de nossa comunidade a presença desse profissional para acesso a toda a população local. O fonoaudiólogo dentro de escolas pode ajudar em triagens não só dos alunos, mas, também, dos próprios professores, avaliando e encaminhando para uma posterior reabilitação, quando necessária. Ele pode promover ações de orientação em toda a comunidade, a fim de melhorar a saúde da comunicação de todos.

Dentro do sistema público de saúde, hoje esse profissional pode ser encontrado em Equipes de Saúde da Família, Unidades Básicas de Saúde (UBS), em Centros Especializados em Reabilitação (CER), Núcleo Integrado de Reabilitação (NIR), Programa Saúde na Escola, em Ambulatórios de Reabilitação, Hospitais, em alguns Centros de Atenção Psicossociais (CAPS) e também na área de Vigilância em Saúde do Trabalhador. Vale mencionar que o fonoaudiólogo também pode estar nos espaços de pesquisas, trazendo à Ciência dados sobre a comunicação da população, buscando divulgar discussões e planejando ações diante dos dados apresentados sobre a saúde da comunicação. Ele também pode ser encontrado no setor privado atuando nas suas diversas áreas.

Ainda há poucos fonoaudiólogos contratados em muitos desses espaços públicos, devido à chegada de recursos insuficientes em alguns locais para contratações desse profissional, tão necessário em nosso dia-a-dia.

Caso sinta que possui qualquer questão em sua comunicação (voz, linguagem, audição, motricidade orofacial, leitura/escrita, fluência, fala, deglutição), procure um fonoaudiólogo.

Seja no sistema único de saúde (SUS), seja no setor privado, esse profissional poderá auxiliar e ajudar da melhor forma em sua comunicação.

No SUS, a orientação é ir até a UBS mais próxima à sua região para um encaminhamento a um centro de referência local com um fonoaudiólogo.

 

Referências bibliográficas

1.        Câmara Legislativa. Legislação citada anexada pela coordenação de estudos legislativos - CED. https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=46948#:~:text=Fonoaudiólogo é o profissional%2C com,da fala e da voz. (1981).

2.        Conselho Regional de Fonoaudiologia: 8a região. Áreas da fonoaudiologia. https://crefono8.gov.br/areas-da-fonoaudiologia/.

3.        Conselho Federal de Fonoaudiologia. O fonoaudiólogo no combate à COVID-19. https://www.fonoaudiologia.org.br/o-fonoaudiologo-no-combate-a-covid-19/.

4.        Brodsky, M. B. et al. Laryngeal Injury and Upper Airway Symptoms After Oral Endotracheal Intubation With Mechanical Ventilation During Critical Care. Crit. Care Med. 46, 2010–2017 (2018).

5.        Valles-González, B. Como a covid-19 pode afetar também a linguagem dos doentes recuperados. BBC News Brasil https://www.bbc.com/portuguese/geral-58056572 (2021).

6.        Galli, D. Sequelas Vocais Decorrentes da COVID 19 e Ventilação Mecânica: Experiência de um Ambulatório de Fonoaudiologia no SUS e Clínica Particular. http://www.cvs.saude.sp.gov.br/up/Sequelas vocais da COVID 19 em profissionais da voz _Daniela Galli.pdf (2020).

7.        Fuess, V. L. R. & Lorenz, M. C. Disfonia em professores do ensino municipal: prevalência e fatores de risco. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 69, 807–812 (2003).

8.        Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia – SBFa. Boletim COMVOZ. http://www.sbfa.org.br/portal/pdf/boletimn1_COMVOZ.pdf (2010).

9.        Behlau, M. Minicurso: Raciocínio Clínico na Avaliação e Tratamento das Disfonias. Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia http://www.sbfa.org.br/portal/anais2017/anais_select.php?atividade=8&id_palestrante=2343 (2017).

10.     Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia – SBFa. Sua Voz Diz Muito Sobre Você é o tema da Campanha Amigos da Voz 2021. https://www.sbfa.org.br/portal2017/campanhas/voz/ (2021).

11.     Guimarães, I. Os problemas de voz nos professores: prevalência, causas, efeitos e formas de prevenção. Rev Port Saúde Publica. 22, 33–41 (2004).

12.     Servilha, E. A. M., Leal, R. de O. F. & Hidaka, M. T. U. Riscos ocupacionais na legislação trabalhista brasileira: destaque para aqueles relativos à saúde e à voz do professor. Revista da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia vol. 15 505–513 http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-80342010000400006&lng=pt&tlng=pt (2010).

13.     Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia – SBFa. Respostas para perguntas frequentes na área de voz. https://www.sbfa.org.br/campanhadavoz/FAQs2011.pdf (2011).

14.     Ministério da Saúde. Distúrbio de Voz Relacionado ao Trabalho – DVRT. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/disturbio_voz_relacionado_trabalho_dvrt.pdf (2018).

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