Este artigo inaugura
uma modalidade importante no nosso Blog: aquela que contém dicas de como cuidar
de si e dos colegas de trabalho e dos que mais sofrem com as doenças
ocupacionais.
Neste artigo
publicamos uma orientação segura para os milhões proletários que têm na voz seu
principal instrumento de trabalho.
Uma especialista,
fonaudióloga, nos informa as causas de alguns problemas de voz e como proceder
para minimizar ou resolver as questões na saúde da comunicação mais comuns que
estes profissionais enfrentam.
Boa leitura.
A Fonoaudiologia e a saúde da comunicação dos Professores
Dra Rebeca Rodrigues
Fonoaudióloga, Mestra e Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana.
O fonoaudiólogo é o profissional responsável pela prevenção, promoção e reabilitação da comunicação da população. A profissão passou a ser reconhecida e regulamentada em 9 de dezembro de 19811. É nesse dia e mês que é comemorado o dia do Fonoaudiólogo. Como fonoaudióloga, posso dizer que você precisará desse profissional por toda a sua vida.
O Conselho Federal de Fonoaudiologia reconhece as seguintes especialidades da Fonoaudiologia: Audiologia; Linguagem; Motricidade orofacial; Saúde coletiva; Voz; Disfagia; Fonoaudiologia educacional; Gerontologia; Fonoaudiologia neurofuncional; Fonoaudiologia do trabalho; Neuropsicologia; Fluência2. O profissional Fonoaudiólogo, associado a uma equipe multidisciplinar e integrada, pode ajudar em muitos tipos de orientações, triagens, avaliações e reabilitações voltadas à comunicação.
Com a
pandemia de COVID-19, muitos profissionais fonoaudiólogos são necessários, no
intuito de avaliar e reabilitar sequelas deixadas pelo coronavírus, tais como,
os transtornos da deglutição em pacientes que foram submetidos à intubação
orotraqueal, para manejo da disfagia e redução do risco de bronco aspiração na
extubação3. Além disso, há
discussão sobre a necessidade também de reabilitação vocal em casos de
extubação. Há um estudo que demonstrou a prevalência da lesão laríngea proporcional
ao tempo que um paciente precisou ficar intubado, resultando em risco de
disfonia (76%) e disfagia (49%) após a extubação4. As inúmeras sequelas neurológicas,
respiratórias, auditivas, etc. decorrentes do vírus, relacionadas à comunicação,
vêm sendo investigadas5,6.
No
caso das possíveis alterações de comunicação do Professor, o Fonoaudiólogo pode
ajudar, tanto no sentido de tratar as possíveis sequelas de COVID-19
relacionadas à comunicação, quanto para tratar quaisquer outras alterações de
comunicação – voz, audição, fluência, linguagem, etc.
As
questões dentro desse público, que trabalha por muitas horas utilizando sua
voz, retórica e oratória, por essa razão, estarão mais comumente associadas aos
distúrbios vocais7. O
fonoaudiólogo responsável por avaliar e reabilitar distúrbios da voz é o
especialista em Voz.
“Na
sociedade atual, aproximadamente um terço das profissões têm a voz como
ferramenta básica de trabalho, ou seja, considerável parcela dos nossos
trabalhadores é composta por usuários vocais ocupacionais, e que se incluem
nesta categoria professores, cantores, atores, operadores de telesserviços,
religiosos, políticos, secretárias, advogados, profissionais da saúde,
vendedores, entre outros”8. Essas ocupações podem
apresentar a combinação de uso prolongado da voz e fatores inapropriados do
ambiente, como ruído de fundo, acústica ambiental e qualidade do ar
inapropriadas, e da organização do trabalho, ou seja, aspectos referentes à
forma, condições e à intensidade com que o trabalho é executado8.
Dentre
alguns sintomas vocais, temos a Disfonia, manifestação que compõe o quadro de
distúrbio de voz8. “A Disfonia representa toda e qualquer
dificuldade na comunicação oral que impede a produção natural da voz e
prejudica diversos aspectos da qualidade de vida”9. Sintomas comuns podem
ser cansaço ao falar; rouquidão; pouca resistência ao falar.
É
preciso estar atento, pois alterações vocais podem ser sinais de questões mais
sérias, como doenças neurológicas (por exemplo, Doença de Parkinson), refluxo
gastroesofágico ou até mesmo câncer de laringe. É fundamental trabalharmos a
nossa consciência sobre a nossa voz e, diante de qualquer mudança, procurar um
profissional. Os sinais de atenção podem ser: rouquidão, ardência, falhas e
cansaço para falar por mais de 15 dias sem um motivo aparente (não ocasionados
por infecções de garganta, esforço ao falar em situações esporádicas que
demandaram maior esforço vocal, como uma apresentação, por exemplo)10. Visto que a voz
engloba mobilidade e força da musculatura orofacial, a própria laringe (órgão
responsável por muitas funções tais como proteção, respiração, deglutição e
produção da voz; as pregas vocais ficam nesse órgão), pulmões, etc, se você não
cuidar de sua saúde vocal, isso pode causar muitos danos futuramente e a
sensação de que você “está sem voz” e de “cansaço vocal” podem ser frequentes.
Nesse caso, procure um profissional fonoaudiólogo especialista no assunto. Você
pode estar utilizando sua voz incorretamente, não estar tendo pausas de
silêncio e de repouso vocal necessários no trabalho, ou, ainda estar em um
ambiente frequentemente ruidoso, que faz com que você precise gritar para ser
ouvido, por exemplo.
As
principais causas relatadas pelos professores que podem levar a sintomas vocais
e até mesmo ao distúrbio de voz podem ser: o uso intensivo da voz, estresse,
infecções respiratórias e alergias, esforço ao falar, refluxo gastroesofágico,
condições ambientais inadequadas (acústica, ruído interno, ruído externo,
umidade, poeira), falta de preparo ou treinamento vocal e hábitos vocais inadequados7,11,12. Vale dizer que o
consumo de, por exemplo, bebidas alcoólicas, assim como o tabagismo podem também
gerar sérios problemas para a sua saúde vocal13.
Algumas
orientações podem ser encontradas nesse guia disponibilizado pela Sociedade
Brasileira de Fonoaudiologia (SBFa), em 2011, “Respostas para perguntas
frequentes na área de voz”:
https://www.sbfa.org.br/campanhadavoz/FAQs2011.pdf
e também nesta campanha mais recente do Dia Mundial da Voz (16 de abril), que
trouxe “Dicas para ser Amigo da Sua Voz”, disponilizada pela SBFa:
https://www.sbfa.org.br/portal2017/campanhas/voz/
O profissional
fonoaudiólogo especialista em voz, através de avaliação e monitoramento, poderá
orientar sobre como utilizar sua voz de maneira correta, manejos para melhorar
sua saúde vocal, o tempo que você deve descansar sua voz, a necessidade de
hidratação (beber água é muito importante), além de exercícios de aquecimento e
relaxamento para seu aparelho fonador, assim como ele poderá realizar a análise
do ambiente do professor (ruídos locais, qualidade do ar), junto a outros
profissionais quando necessários, sugerindo intervenções necessárias ao
professor durante sua aula para auxiliar em sua saúde vocal (exercícios para melhorar
a sua projeção vocal; utilizar um microfone, por exemplo; ou a redução do ruído
ambiente).
É por
isso que o profissional Fonoaudiólogo também pode trabalhar nas ações de
vigilância em saúde de muitos trabalhadores contratados por empresas, verificando
se há algum distúrbio de voz relacionado ao trabalho (DVRT)14. Artigos anteriores
têm discutido que “os fatores organizacionais do trabalho, assim como os
distúrbios de voz, muito frequentes na docência, carecem de maior atenção da
legislação no Brasil”12.
Nesse
sentido, devemos lutar e exigir aos setores públicos de nossa comunidade a
presença desse profissional para acesso a toda a população local. O
fonoaudiólogo dentro de escolas pode ajudar em triagens não só dos alunos, mas,
também, dos próprios professores, avaliando e encaminhando para uma posterior
reabilitação, quando necessária. Ele pode promover ações de orientação em toda
a comunidade, a fim de melhorar a saúde da comunicação de todos.
Dentro
do sistema público de saúde, hoje esse profissional pode ser encontrado em Equipes
de Saúde da Família, Unidades Básicas de Saúde (UBS), em Centros Especializados
em Reabilitação (CER), Núcleo Integrado de Reabilitação (NIR), Programa
Saúde na Escola, em Ambulatórios de Reabilitação, Hospitais, em alguns Centros
de Atenção Psicossociais (CAPS) e também na área de Vigilância
em Saúde do Trabalhador. Vale mencionar que o fonoaudiólogo também pode estar
nos espaços de pesquisas, trazendo à Ciência dados sobre a comunicação da
população, buscando divulgar discussões e planejando ações diante dos dados
apresentados sobre a saúde da comunicação. Ele também pode ser encontrado no
setor privado atuando nas suas diversas áreas.
Ainda
há poucos fonoaudiólogos contratados em muitos desses espaços públicos, devido
à chegada de recursos insuficientes em alguns locais para contratações desse
profissional, tão necessário em nosso dia-a-dia.
Caso
sinta que possui qualquer questão em sua comunicação (voz, linguagem, audição,
motricidade orofacial, leitura/escrita, fluência, fala, deglutição), procure um
fonoaudiólogo.
Seja no
sistema único de saúde (SUS), seja no setor privado, esse profissional poderá
auxiliar e ajudar da melhor forma em sua comunicação.
No SUS, a orientação é ir até a UBS mais próxima à sua região para um encaminhamento a um centro de referência local com um fonoaudiólogo.
Referências bibliográficas
1. Câmara Legislativa. Legislação
citada anexada pela coordenação de estudos legislativos - CED.
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=46948#:~:text=Fonoaudiólogo
é o profissional%2C com,da fala e da voz. (1981).
2. Conselho Regional de Fonoaudiologia: 8a
região. Áreas da fonoaudiologia.
https://crefono8.gov.br/areas-da-fonoaudiologia/.
3. Conselho Federal de Fonoaudiologia. O
fonoaudiólogo no combate à COVID-19.
https://www.fonoaudiologia.org.br/o-fonoaudiologo-no-combate-a-covid-19/.
4. Brodsky, M. B. et al. Laryngeal
Injury and Upper Airway Symptoms After Oral Endotracheal Intubation With
Mechanical Ventilation During Critical Care. Crit. Care Med. 46,
2010–2017 (2018).
5. Valles-González, B. Como a covid-19 pode
afetar também a linguagem dos doentes recuperados. BBC News Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/geral-58056572 (2021).
6. Galli, D. Sequelas Vocais Decorrentes da
COVID 19 e Ventilação Mecânica: Experiência de um Ambulatório de Fonoaudiologia
no SUS e Clínica Particular. http://www.cvs.saude.sp.gov.br/up/Sequelas vocais
da COVID 19 em profissionais da voz _Daniela Galli.pdf (2020).
7. Fuess, V. L. R. & Lorenz, M. C.
Disfonia em professores do ensino municipal: prevalência e fatores de risco. Rev.
Bras. Otorrinolaringol. 69, 807–812 (2003).
8. Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia –
SBFa. Boletim COMVOZ. http://www.sbfa.org.br/portal/pdf/boletimn1_COMVOZ.pdf
(2010).
9. Behlau, M. Minicurso: Raciocínio Clínico
na Avaliação e Tratamento das Disfonias. Congresso Brasileiro de
Fonoaudiologia http://www.sbfa.org.br/portal/anais2017/anais_select.php?atividade=8&id_palestrante=2343
(2017).
10. Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia –
SBFa. Sua Voz Diz Muito Sobre Você é o tema da Campanha Amigos da Voz 2021.
https://www.sbfa.org.br/portal2017/campanhas/voz/ (2021).
11. Guimarães, I. Os problemas de voz nos
professores: prevalência, causas, efeitos e formas de prevenção. Rev Port Saúde
Publica. 22, 33–41 (2004).
12. Servilha, E. A. M., Leal, R. de O. F. &
Hidaka, M. T. U. Riscos ocupacionais na legislação trabalhista brasileira:
destaque para aqueles relativos à saúde e à voz do professor. Revista da
Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia vol. 15 505–513
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-80342010000400006&lng=pt&tlng=pt
(2010).
13. Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia –
SBFa. Respostas para perguntas frequentes na área de voz.
https://www.sbfa.org.br/campanhadavoz/FAQs2011.pdf (2011).
14. Ministério da Saúde. Distúrbio de Voz
Relacionado ao Trabalho – DVRT. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/disturbio_voz_relacionado_trabalho_dvrt.pdf
(2018).
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