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O Brasil de Bolsonaro: algumas reflexões sobre os dados
econômicos, os discursos e o porquê do governo seguir bem avaliado
Emilio Gennari – Educador Popular
E-mail: epcursos@gmail.com
A imagem de patriota, de homem que
acredita na família e nos valores cristãos, de lutador incansável contra a
corrupção e o crime organizado levou muita gente a crer que o então candidato Jair Bolsonaro
criaria as condições para tirar o povo do sufoco.
Diante dos acontecimentos de 2019,
podemos dizer que sobraram discursos e faltaram resultados, mas, apesar disso a maioria da população
acredita que o país está entrando nos eixos.
Sem esforços reais para conhecer a
visão de mundo dos simples e incapaz de dialogar com eles, a esquerda tateou em
busca de saídas honrosas, cansou o povo com debates sobre temas alheios às
preocupações centrais do seu cotidiano e foi incapaz de sacudir a sociedade do
torpor em que se encontra.
O governo se aproveitou disso para
sair das situações críticas,
frequentemente geradas por seus próprios erros, reorganizou as fileiras,
alimentou os seguidores com polêmicas eletrizantes, atuou para dissolver o que
poderia se tornar uma pedra no sapato e encerrou o ano com uma aprovação que
coloca em maus lençóis quem apostava num desgaste significativo do Presidente
para começar a lutar.
Ao findar o primeiro trimestre de
2020, emerge a impressão amarga de que Bolsonaro consegue fazer as pessoas
acreditarem na verdade que interessa ao governo. Perdido nas polêmicas de
ocasião, o povo ignora os fatos, assimila os sentidos divulgados com a chancela
de quem fala como autoridade e confia no algoz fantasiado de paladino dos
valores cristãos.
Na busca incessante de um antídoto para
os retrocessos que prometem horizontes tenebrosos, a nossa análise parte da
necessidade de entender como age o veneno que está sendo injetado na sociedade
e por que é tão eficiente. Parece pouco, mas é um passo necessário para que se possa estimular a reação.
1. O
caminhar do emprego nos números das estatísticas
Num cenário em que o sentido dos
acontecimentos silencia o que, de fato, ocorreu, a nossa análise busca resgatar
a realidade que se desenha nas estatísticas e nos estudos dos próprios órgãos e
institutos vinculados ao governo.
Vamos começar pelos números do
emprego.
População
|
2018
(em
milhões)
|
2019
(em
milhões)
|
2019-2018
(em %)
|
Força
de trabalho
|
104,4
|
106
|
1,5
|
Pessoas
desocupadas na força de trabalho
|
12,8
|
12,6
|
- 1,7
|
Desalentados
|
4,7
|
4,8
|
1,4
|
Trabalhador
doméstico com carteira assinada
|
1,8
|
1,7
|
- 3,0
|
Trabalhador
doméstico sem carteira assinada
|
4,4
|
4,6
|
4,5
|
Setor
privado – com carteira assinada
|
32,9
|
33,2
|
1,8
|
Setor
privado – sem carteira assinada
|
11,2
|
11.6
|
4,0
|
Trabalhadores
por conta própria
|
23,3
|
24,2
|
4,1
|
Administração
pública, defesa, saúde, educação, etc
|
16,0
|
16,4
|
2,5
|
Fonte:
elaboração própria a partir da apresentação dos dados da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílio (PNAD Contínua) – IBGE (2020).
O quadro 1 revela que, em 2019, os
desocupados diminuíram 1,7%, os empregados do setor privado com carteira
assinada cresceram 1,8% e o funcionalismo público aumentou 2,5% em relação a
2018. Não negamos que seja uma boa notícia. Mas os demais indicadores revelam a
precariedade da recuperação do emprego num cenário em que a força de trabalho
cresceu em mais de um milhão e seiscentas mil pessoas.
Além
do aumento de 1,4% dos que desistiram de procurar emprego e de 4% no número de
trabalhadores do setor privado sem carteira assinada, temos uma redução de 3%
dos empregados domésticos com registro em carteira e um crescimento de 4,5% das
pessoas que fazem este mesmo trabalho sem contar com os direitos previstos pela
legislação.
O número de trabalhadores por conta
própria aumentou em 900.000 pessoas, passando
de 23 milhões e 300 mil para um total de 24 milhões e 200 mil. O fato de
19 milhões e 300 mil deles não terem CNPJ e conseguirem uma renda média
inferior a dos trabalhadores sem carteira assinada prova que estamos diante de
uma opção baseada na necessidade de garantir a sobrevivência e não na
descoberta de nichos de mercado ou de uma suposta vocação empreendedora dos
indivíduos.[2]
Face a esta evolução do emprego, em
2019, a informalidade somou 38,4 milhões de pessoas, 41,1% dos ocupados, um
milhão de pessoas a mais ante 2018.[3]
O aumento predominante das vagas
informais fez com que o rendimento médio mensal do trabalhador fosse de R$
2.330, um crescimento de apenas 0,4%, em relação a 2018.[4] Ter mais pessoas ocupadas elevou em
2,5% o volume de dinheiro mensalmente pago na forma de salários, perfazendo, em
média, um montante de 212 bilhões e 400 milhões de reais. Mas a incerteza
quanto aos ganhos futuros, própria dos empregos precários, fez o consumo das
famílias crescer apenas 1,8% na mesma base de comparação.[5]
Mas isso não é tudo. Uma análise a
partir das estimativas da PNAD-Contínua e da Relação Anual de Informações
Sociais (RAIS), publicada no jornal Folha de São Paulo, mostra que, no segundo
trimestre de 2019, a população com ensino superior completo que estava
desempregada, desalentada ou trabalhando menos horas do que gostaria era de 2
milhões e meio de pessoas. O aumento deste contingente em um milhão e 570 mil
indivíduos em relação ao mesmo período de 2014 questiona a tentativa
persistente de responsabilizar a falta de formação do trabalhador pelo
desemprego de longa duração.[6]
Em relação ao pacote para estimular a
contratação de jovens entre 18 e 29 anos que ainda não tiveram a experiência do
primeiro emprego formal, percebemos que o governo não oferece aos patrões
motivos suficientes para concretizá-la. Apesar de reduzir os encargos sociais
em 34%[7] e prever a possibilidade do trabalho
aos domingos e feriados, esta modalidade de contratação se apresenta como uma
opção cara quando comparada à admissão sem carteira assinada ou de
trabalhadores por conta própria. O fato de a medida provisória incluir a
regionalização da fiscalização do trabalho sem o aumento do número de fiscais,
a ampliação dos prazos para cobranças e verificações, a simplificação das
multas e a implantação da dupla visita para violações leves da legislação
trabalhista deixa entender que a chance de uma empresa ser autuada por admitir
trabalhadores sem carteira assinada ou autônomos como assalariados disfarçados
é ainda menor do que era antes.[8]
Além disso, as razões pelas quais os
jovens não são contratados não guardam relação com os custos do trabalho, e sim
com o fato de não terem uma educação que predispõe o sujeito a se submeter
docilmente às demandas da empresa. Esta peça-chave da empregabilidade costuma
ganhar consistência na idade adulta, quando as obrigações familiares se
encarregam de forçar os indivíduos a mudarem suas posturas e prioridades.
Então para que serve esta nova forma
de contratação?
De um lado, não podemos esquecer que
a MP 905 foi publicada um dia após a libertação do ex-presidente Lula, o que
muitos interpretaram como uma forma de mostrar a preocupação do governo atual
com o social ante os possíveis ataques que viriam do líder petista. A
perspectiva de criar um milhão e 800 mil empregos para jovens que nunca tiveram
um trabalho formal alimenta as esperanças populares independentemente das
possibilidades de ela se concretizar. De outro, a Medida Provisória prevê que
os custos da desoneração, estimados pelo Ministério da Economia em 10 bilhões e
600 milhões de reais, sejam pagos com o desconto de 7,5% sobre o salário
desemprego, a título de contribuição previdenciária do próprio desempregado.
Além de retirar uma fatia considerável
de quem conta com bem pouco para sobreviver, o Ministério da Economia prevê
arrecadar mais do que deixará de entrar nos cofres do Estado com a isenção
oferecida aos patrões. Ao todo, a cobrança que pesa nas costas dos
desempregados deve proporcionar uma entrada de recursos estimada em 12 bilhões
de reais. Trata-se de um dinheiro líquido e certo, à medida que o desconto é
aplicado a quem recebe o salário desemprego e não há como fugir dele.
A diferença entre a arrecadação assim
conseguida e a desoneração da folha de pagamento dos jovens contratados vai
proporcionar ao Estado um ganho de um bilhão e 400 milhões de Reais. Este
montante pode ser bem maior se a quantidade de vagas ficar abaixo do esperado.
Por exemplo, se forem criados apenas 900 mil postos, o ganho de arrecadação com
a taxação do seguro-desemprego será de 6 bilhões e 700 milhões de reais. Parece
incrível, mas quem lucra pode ganhar ainda mais substituindo trabalhadores com
registro em carteira por outros contratados com a isenção prevista pela Medida
Provisória ou sem vínculos formais. Quem está no sufoco em função do desemprego
vai apertar mais um buraco do cinto para repor o montante que o governo deixa
de arrecadar dos patrões. Tira-se de quem não tem para dar a quem tem muito.
No terreno da ação sindical, a
recuperação do emprego com carteira assinada não oferece condições suficientes
para apostar numa retomada das lutas no curto prazo. Além de pequena, o fato de
ocorrer tanto em empresas prestadoras de serviços como em suas contratantes
tende a manter a rotatividade num patamar bastante elevado. Os estudos do
DIEESE indicam que, em 2007, descontados os desligamentos a pedido do
trabalhador, as mortes, as transferências e as aposentadorias, a taxa de
rotatividade em atividades terceirizadas era de 55,2% ao ano, ao passo que, nas
que contratavam as prestadoras de serviços era de 25,8%. Sete anos depois, o
índice nas terceirizadas atingia 57,7% e naquelas que as contratavam 28,8%.[9]
A ampliação da terceirização às
atividades-fim e o processo de “pejotização” da força de trabalho tendem a
elevar ainda mais a rotatividade.[10] As seguidas mudanças na composição
do trabalhador coletivo se somam ao crescimento do individualismo, às
diferenças de jornada, direitos e interesses para dificultar a construção de
laços de solidariedade entre os empregados que estão no mesmo ambiente de
trabalho.
A realidade dos Shoppings Centers é um
bom exemplo de espaço que reúne estes elementos que dificultam a ação coletiva.
Segundo Márcio Pochmann, na cidade de Campinas, a 100 km de São Paulo, os
centros comerciais empregam cerca de 170.000 pessoas, representando 21% do
mercado de trabalho local. [11]
Ao agregar os mais diferentes tipos
de empreendimento, os shoppings abrigam parceiros ou sócios remunerados em função
das vendas efetuadas; terceirizados da limpeza, da vigilância e dos serviços de
manutenção geral; vendedores de ingressos nos cinemas, de roupas de grife ou de
comida rápida; autônomos e empreendedores individuais que atuam em serviços
específicos; motoristas e ajudantes encarregados do transporte e abastecimento
dos estoques, etc.
Reunidos sob o mesmo teto pelas mais diferentes
formas de trabalho e remuneração; por contratos que, em muitos casos, são
individuais; atuando em turnos que dependem da especificidade de cada
atividade; com um grau de rotatividade que varia de acordo com o tipo de
trabalho a ser realizado; submetidos a uma jornada extensa e a um ritmo
esgotante; estes trabalhadores não se conhecem, não dialogam entre si, não são
companheiros e suas demandas não convergem para nenhum objetivo comum.
Problemas não faltam, mas organizar o descontentamento na diversidade das
relações de trabalho para transformá-lo em motivo de luta coletiva demanda
tempo, convivência, interesses comuns. E estes ingredientes são cada vez mais
escassos.
A ausência de uma causa na qual o trabalhador
coletivo se reconhece e pela qual se dispõe a lutar é também um dos fatores que
trava o processo pelo qual é possível tomar consciência da realidade como
produto de pressões e interesses de classe. Pensar e agir juntos estimula a ir
além das aparências, a buscar respostas às perguntas que a luta desperta, a
encontrar as relações entre as histórias de cada um e a estrutura de dominação
que molda e orienta a ordem social, a identificar nos acontecimentos os
objetivos e as responsabilidades dos atores que neles intervêm.
Quando falta esse estímulo, o cotidiano é quase
sempre lido como obra do acaso, produto de forças incontroláveis que definem o
presente e o futuro dos indivíduos e dificilmente coloca a necessidade de uma
compreensão mais ampla da realidade. Sem os estímulos e os questionamentos
vindos do envolvimento na luta, qualquer reflexão sobre justiça social,
exploração, Estado e dominação soa como distante da própria realidade e,
portanto, desnecessária. Esta constatação permite perceber que as mudanças na
legislação trabalhista não deterioram apenas a renda, os contratos e as
condições de trabalho. Ao fragmentar ainda mais o trabalhador coletivo,
fragilizam os elementos que permitem uma retomada das lutas.
Unir quem trabalha no mesmo espaço é uma tarefa
complexa também pelo progressivo abandono das práticas associativas que marcou
as escolhas dos trabalhadores nas últimas décadas. Respeitar os limites fixados
nos acordos coletivos, seguir as orientações das direções sindicais, parar para
ouvir discursos na entrada dos locais de trabalho, participar de assembléias e
fazer greves são tarefas que os assalariados de todas as categorias vêm
considerando como contraproducentes por verem nelas um limite à liberdade
individual de estabelecer acordos com os empregadores, por inviabilizarem as
possibilidades de ascensão na empresa e elevarem o medo de retaliações e
demissões.
Antes mesmo da reforma trabalhista de novembro de
2017, a negociação direta com a empresa, apesar de informal e propensa a
quebrar a proteção proporcionada pelas normas legais, se apresentava ao
indivíduo como uma maneira de resolver dificuldades pessoais, de melhorar sua
posição em relação aos demais e, sobretudo, de obter vantagens às quais não
teria acesso se ficasse no âmbito do que era previsto pela legislação e os
acordos coletivos da categoria. O toma lá dá cá, próprio desta busca, não
costuma levar em conta que a jornada, o ritmo, as metas e as condições de
produção são impostas pela direção da empresa e que agir à margem das normas
legais abre caminhos a toda ordem de problemas e abusos.[12]
Os trabalhadores por conta própria e aqueles que
atuam vinculados a um aplicativo constituem um capítulo à parte. De início,
precisamos lembrar que os primeiros formam um grupo heterogêneo que inclui
profissionais liberais e microempreendedores, vendedores ambulantes,
trabalhadores informais que prestam uma enorme variedade de serviços, etc. Em
muitos deles, é comum a percepção de nunca estarem fazendo o suficiente para se
afirmar e progredir. A auto-imposição de um ritmo acelerado e de condições que
elevam os riscos para a saúde e a incolumidade física, criam situações em que o
trabalhador impõe
a si mesmo uma situação análoga a escravidão e
naturaliza o sofrimento e o risco
como caminho para melhorar de vida.
Entre os trabalhadores vinculados a aplicativos,
parece prevalecer a idéia de estarem agarrados a uma tábua de salvação depois
do naufrágio das possibilidades reais de encontrar um emprego. Ao depender
apenas do próprio esforço e dedicação, independentemente da idade e demais
condições de empregabilidade, a consciência de que é muito trabalho para pouco
ganho é anestesiada pela constatação de que ainda representa uma saída para a
sobrevivência e, em alguns casos, também a esperança de reunir condições para
ter algo melhor num futuro próximo.
Por
incerto e precário que seja, “fazer UBER” ou “ser MEI” representam chances de
se virar sozinho, de não depender de ninguém para ganhar a vida, de decidir
como, quando e por quanto tempo trabalhar ao longo da jornada, de sobreviver
mostrando diariamente o próprio valor. A liberdade de cada um fazer o que sabe,
pode ou deseja, sem nenhum vínculo empregatício aparente tende a se sobrepor à
incerteza gerada pela perda dos direitos legais que protegiam o presente e as
perspectivas de futuro do sujeito.
Bastam
estas breves considerações para perceber que a realidade do trabalho questiona
fortemente a ação sindical baseada em campanhas salariais e na agitação pura e
simples. A fragmentação do trabalhador coletivo diminui a possibilidade real de
as direções representarem efetivamente os interesses dos ocupados e impõe
mudanças urgentes na forma em que as entidades conduzem suas ações.
2. Que país está sendo construído?
No primeiro ano de governo, Bolsonaro
não mostrou nenhum projeto para fazer o país crescer e se desenvolver. Sobraram
declarações pelas quais, a redução do déficit público e a reforma da
previdência alimentariam a confiança dos investidores no país e liberariam mais
recursos para o próprio Estado ajudar o Brasil a crescer. Mas, com os
resultados constantemente aquém do esperado, governo e parlamentares da sua
base de apoio afinaram a retórica para apontar a próxima reforma e os novos
cortes de direitos como passo essencial para atingir as metas desejadas e
fortalecer o país diante da crescente possibilidade de uma nova crise econômica
internacional.
Diante dos números das atividades produtivas,
basta pouco para perceber que a realidade se afasta das miragens projetadas
pelas falas do governo. Em 2019, os investimentos na Formação Bruta de Capital
Fixo e os estoques das empresas representaram apenas 15,1% do PIB, 0,3 ponto
percentual acima do patamar de 2018 e bem longe dos 20,5% registrados em 2014,
quando a economia cresceu 0,5% antes de mergulhar na recessão.[13]
As perspectivas para 2020 não
sinalizam uma melhora consistente deste quadro. Apesar de a reforma da
previdência, aprovada em 2019, liberar recursos orçamentários, os investimentos
federais não apontam nenhuma melhora significativa. Ao contrário, no caso da
infra-estrutura de transporte, fundamental para melhorar a competitividade da
produção nacional e estimular o crescimento econômico, os gastos devem cair de
um montante de 7 bilhões e 680 milhões de Reais, em 2019, para 5 bilhões e 290
milhões de reais, em 2020, o menor valor dos últimos 16 anos.[14]
Outro fator que ajuda a baratear as
mercadorias é a produtividade do trabalho. Segundo cálculos preliminares da
Fundação Getúlio Vargas (FGV), em 2019, o Brasil que, entre 1995 e 2018,
registrou um aumento médio de 1%, perdeu terreno ao amargar uma redução de
0,7%, fundamentalmente em função do precarização do trabalho.[15]
Com o Estado disposto a cortar
direitos trabalhistas, ampliar a terceirização, fazer vista grossa diante das
violações da legislação e cobrir com o manto da legalidade formas de
contratação consideradas informais no período anterior, os empresários preferem
empregar um trabalhador barato e superexplorado a investir na modernização dos
parques tecnológicos. Prova disso é que, no ano passado, o setor de bens de
capital sofreu uma queda de 0,4% em relação a 2018.[16] Ainda que, de imediato, esta opção
permita conter o aumento dos preços e melhorar os lucros, a vantagem
competitiva assim obtida não serve para disputar fatias de mercado com empresas
estrangeiras que investem em novos maquinários.
Quanto menor o gasto na modernização
dos parques tecnológicos, maior é o valor das mercadorias produzidas e mais
difícil é fazer com que possam competir com produtos similares produzidos em
indústrias onde a robotização é de casa. Com o passar do tempo, a desvantagem
do Brasil tende a se ampliar e, para não perder ainda mais terreno, a saída
imediata é uma nova rodada de precarização e cortes de direitos que agravam as
condições de vida da maioria da população.
Sem ampliar as vendas ou diante da
frustração das projeções de lucro, o comércio não eleva as encomendas aos
setores produtivos que, por sua vez, não vêem a necessidade de novos
investimentos. Desta forma, a falta de investimentos e o consumo em marcha
lenta dão vida a um círculo vicioso que obstaculiza as possibilidades de um
crescimento econômico e mantém o desemprego em patamares elevados.
Com o PIB crescendo pouco e nada, a
arrecadação do Estado não gera recursos suficientes para melhorar a
infra-estrutura de forma consistente. A competitividade das mercadorias aqui
produzidas sofre novas quedas e as indústrias diminuem sua capacidade de manter
as fatias de mercado conquistadas.
A balança comercial de 2019 mostra
claramente onde, na economia real, o país é competitivo e onde segue perdendo
terreno. Vejamos:
Quadro 2: Balança comercial de 2019 por tipo de
produto[17]
Itens
|
Exportações em U$ bi (A)
|
(%)
|
Importações em U$ bi (B)
|
(%)
|
Saldo em U$ bi (A-B)
|
Produtos básicos
|
118,181
|
52,76
|
17,544
|
9.89
|
100,637
|
Semimanufaturados
|
28,364
|
12,66
|
8,284
|
4,67
|
20,08
|
Manufaturados
|
77,443
|
34,57
|
151,518
|
85,44
|
- 74,075
|
Total
|
223,998
|
100
|
177,341
|
100
|
46,657
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Ministério da Economia
No campo
das exportações, salta aos olhos que os produtos primários representam a maior
parte das vendas do Brasil ao exterior, seguidos pelos manufaturados e
semimanufaturados. Nas importações, o cenário se inverte. O país traz de fora
produtos manufaturados cujo valor corresponde a mais de 85% do total importado,
enquanto os básicos representam pouco menos de 10%.
Muitos consideram este quadro como o
retrato da vocação do Brasil. Porém, os próprios números do Ministério da
Economia apontam uma realidade bem diferente. Vejamos:
Quadro 3: participação dos produtos básicos,
semimanufaturados e manufaturados nas exportações do Brasil entre 2000 e 2019. [18]
Ano
|
Produtos Básicos (%)
|
Semimanufaturados (%)
|
Manufaturados (%)
|
Operações Especiais (%)
|
2000
|
23
|
15
|
59
|
3
|
2001
|
26
|
14
|
56
|
3
|
2002
|
28
|
15
|
55
|
2
|
2003
|
29
|
15
|
54
|
2
|
2004
|
30
|
14
|
55
|
2
|
2005
|
29
|
13
|
55
|
2
|
2006
|
29
|
14
|
54
|
2
|
2007
|
32
|
14
|
52
|
3
|
2008
|
37
|
14
|
47
|
2
|
2009
|
40
|
13
|
44
|
2
|
2010
|
45
|
14
|
39
|
2
|
2011
|
48
|
14
|
36
|
2
|
2012
|
47
|
14
|
37
|
2
|
2013
|
47
|
13
|
38
|
3
|
2014
|
49
|
13
|
36
|
2
|
2015
|
46
|
14
|
38
|
2
|
2016
|
43
|
15
|
40
|
2
|
2017
|
46
|
14
|
37
|
2
|
2018
|
50
|
13
|
36
|
1
|
2019
|
53
|
13
|
35
|
0
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Ministério da Economia
Percebemos que, em 2000, a participação dos
produtos básicos nas exportações brasileiras não passava de 23% e a de
manufaturados estava em 59%. A política de privilegiar as exportações de
produtos primários, a transferência da fabricação de muitos produtos para o
sudeste asiático e um nível baixo de investimentos industriais elevaram
progressivamente esta porcentagem até o seu patamar mais alto, que, no período
considerado, foi registrado em 2019. Enquanto os semimanufaturados não sofreram
alterações significativas, ao variar entre 13% e 15% do total enviado ao
exterior, os manufaturados perderam 24 pontos percentuais ao cair de 59% para
35%, o índice mais baixo das duas últimas décadas.
Entre os exemplos que ajudam a entender os
paradoxos criados por esta situação temos o caso do petróleo e de seus
derivados. Em
2019, o Brasil exportou pouco mais de 24 bilhões de dólares em petróleo bruto e
importou 6 bilhões e 700 milhões de dólares em óleos combustíveis, 3 bilhões de
dólares em naftas, um bilhão e meio de dólares em uréia, um bilhão e 900
milhões de dólares em polímeros de etileno, propileno e estireno e 453 milhões
de dólares em óleos lubrificantes, o que perfaz um total de mais de 13 bilhões
e meio de dólares somente nesses derivados. [19] Com
isso, não queremos dizer que extrair e exportar petróleo seja uma maldição, e
sim que, ao concentrar os recursos em sua produção sem investir no refino, o
país gasta muito para importar o que não produz, gerando empregos e renda fora
do território nacional.
Ao comentar a opção de apostar na venda de
produtos primários como carro-chefe das exportações, a Secretária Executiva da
Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), Alicia Bárcenas, acredita
que: “À diferença de muitos países asiáticos, a América Latina perdeu dois
trens: o da política industrial e o da inovação, deixando que fossem as forças
do mercado a tomar as decisões. Está claro que esse modelo de desenvolvimento,
sem uma estratégia produtiva se esgotou. Tanto em matéria de economia, como
demonstra o baixo crescimento, como em matéria de distribuição [de renda],
continuamos sendo a região mais desigual do mundo, ou seja, não temos sido
capazes de redistribuir essa aparente expansão”. Para ela, manter em dia a
política fiscal e monetária é importante, mas insuficiente, ainda mais quando
os Estados não diversificam a matriz produtiva do país e o corte extrativista
do modelo econômico em andamento concentra fortemente a riqueza e traz
inovações tecnológicas pontuais.[20]
Ninguém duvida que um superávit da
balança comercial acima dos 46 bilhões e 500 milhões de dólares seja importante
para o país, mas esta quantia de dinheiro oculta os problemas no
desenvolvimento presente e futuro que a secretária da CEPAL aponta em sua
entrevista. A felicidade do agronegócio e das empresas extrativas prepara as
lágrimas de uma população que vai empobrecendo à medida que a renda se
concentra cada vez mais e a dependência de outros países impede a geração de
empregos que aumentariam a sua renda.
A estratégia de alardear dados
econômicos favoráveis como resultado das políticas governamentais não se limita
à balança comercial. Em janeiro deste ano, Bolsonaro citou o relatório da
Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) para
afirmar que, ao passar de 60 bilhões de dólares, em 2018, para 75 bilhões de
dólares, em 2019, os Investimentos Estrangeiros Diretos no Brasil mostram que o
seu governo vem recuperando a confiança dos investidores.[21] Em seus comentários nas redes
sociais, o Presidente omitiu dois elementos incômodos.
O primeiro deles é que parte
significativa desta elevação se deve à privatização da Transportadora Associada
de Gás (TAG) que rendeu cerca de 8 bilhões e 700 milhões de dólares, mais da
metade do aumento dos investimentos de um ano para outro. E este não foi o
único dinheiro que veio do exterior para comprar as estatais colocadas à venda
e que, ao todo, proporcionaram aos caixas do governo um ingresso correspondente
a 23 bilhões e meio de dólares até setembro do ano passado.[22] Do mesmo modo, a venda da TAG não
guarda relação com a confiança que o governo Bolsonaro infunde nos investidores
e sim com o fato de ser uma empresa cobiçada pelo capital externo também nos
governos anteriores e cuja venda era inviabilizada pelo cenário político
existente.
O segundo elemento diz respeito às
metodologias pelas quais a UNCTAD e o Banco Central (BC) do Brasil calculam os
Investimentos Estrangeiros Diretos. Sem enveredar em explicações técnicas,
lembramos apenas que, em agosto de 2019, o BC adotou uma nova maneira de fazer
este cálculo. Os resultados apontam um cenário diferente em relação ao que é
traçado pela UNCTAD.
A fórmula adotada no Brasil faz com
que o volume de IED em 2018, caia de 88 bilhões e 300 milhões de dólares para
78 bilhões e 160 milhões de dólares; e, em 2019, seja de 78 bilhões e 560
milhões de dólares. Ao todo, são três bilhões e meio de dólares a mais em
relação ao montante apontado pela UNCTAD, mas, nas contas do BC, a elevação é
de apenas 400 milhões de dólares em relação a 2018, muito pouco quando
consideramos que esse montante inclui os dólares das privatizações. [23]
Para efeito propagandístico, é óbvio
que Bolsonaro prefere o resultado da UNCTAD. Para manter os pés no chão, vale a
pena não tirar os olhos dos próximos relatórios do Banco Central.
3. Os problemas da economia nos números
do PIB
No início de março, o IBGE divulgou
os dados do Produto Interno Bruto de 2019. Ao ficar na marca de 1,1%, o PIB do
ano passado se coloca abaixo dos que foram apurados em 2017 e 2018, ambos em
1,3%.[24]
Sabendo que o consumo das famílias
representou 64,9% do PIB, em 2019; que o salário mínimo e as aposentadorias não
tiveram aumentos reais em 2020; que o efeito positivo da liberação do FGTS
iniciada no último trimestre de 2019 se esgota em abril deste ano; e que o
governo deve encolher os seus gastos (que representaram 20,3% do PIB), é
difícil imaginar que a economia do país, mesmo antes dos efeitos negativos do
coronavírus, conseguisse sair do crescimento a conta-gotas no qual entrou em
2017.[25]
Esta realidade é confirmada pela
queda da taxa de juros SELIC (hoje em 4,25%) e pela redução dos depósitos
compulsórios das instituições financeiras junto ao Banco Central.[26] Diante das incertezas do cenário
internacional e da falta de estímulos internos para um crescimento sustentado,
encolher a taxa de juros e aumentar o volume de dinheiro a ser emprestado são
medidas que visam levar pessoas e empresas a usar o crédito disponível para
consumir e investir mais. È como se o governo dissesse: por favor, no lugar de
guardar dinheiro em aplicações financeiras que dão pouco e nada, gastem o que
tiverem e aproveitem os juros baixos para se endividarem quanto puderem.
Mas este convite pode não despertar o
interesse desejado. As incertezas quanto à renda disponível e ao crescimento da
demanda não garantem que isso vá ocorrer. Ou seja, baixar os juros e aumentar
as linhas de créditos sem um trabalho formal que ofereça garantias de que as
pessoas terão condições de pagar o que devem e sem que a economia apresente
sinais consistentes de aumento do consumo individual, empresarial e governamental
tende a ter um efeito muito limitado em termos de estímulo econômico.
Mas isso não é tudo. À medida que o
“risco Brasil”, calculado pelos investidores estrangeiros, não é retribuído por
juros compensatórios, a quantidade de dólares que sai do país é bem maior da
que entra. Em 2019, assistimos a uma fuga da moeda estadunidense da ordem de 44
bilhões e 768 milhões, no que se configura como o maior saldo negativo desde a
crise de 1999, quando U$ 16 bilhões e 180 milhões de dólares deixaram a
economia brasileira.[27] Em função disso, entre janeiro e
dezembro do ano passado, o real se desvalorizou 10,41% e a perda de valor segue
aumentando em 2020.[28]
Para o Ministro da Economia, Paulo
Guedes, esta situação veio para ficar à medida que favorece as exportações do
país, reduz as importações, eleva o superávit da balança comercial e estimula
os setores da economia nacional a ampliar a sua produção para atender a fatia
do mercado interno que deixa de ser ocupada pelos importados. Em teoria, o
raciocínio é perfeito, mas a realidade teima em negar a análise do Ministro.
Vejamos por exemplo o caso da indústria.
Em 2019, a exportação de produtos manufaturados caiu 10,07% em relação a
2018. À medida que o Ministério da Economia deixou de divulgar o volume de
produtos exportados, é impossível dizer se a redução dos dólares obtidos com
estas exportações se deve à diminuição das quantidades vendidas a outros países
ou à desvalorização da moeda nacional que leva a receber menos dinheiro pelos
mesmos volumes exportados. No terreno das importações, as compras de
manufaturados caíram apenas 1,69%, bem abaixo do que seria esperado diante da
desvalorização registrada no ano passado.[29]
Sabendo que, em 2019, a produção da
indústria de transformação cresceu apenas 0,1%, e que grande parte deste
resultado pífio se deve ao consumo interno, que papel podemos atribuir à
desvalorização do real?[30]
A nosso ver, a ineficácia da perda de
valor do real no crescimento da indústria nacional pode ser explicada,
fundamentalmente, pelo fato de muitas empresas dependerem de peças e insumos
importados para realizar a sua produção. As mudanças ocorridas a partir dos
anos 90 criaram um cenário no qual é cada vez mais difícil encontrar
fabricantes cujos processos produtivos dependem exclusivamente de máquinas e
matérias-primas 100% brasileiras. Desta forma, fomentar a produção local para
substituir importações encarecidas pela valorização do dólar demanda
investimentos vultuosos e estímulos que superam os que são oriundos da perda de
valor do real que, por sinal, pode ser parcial ou totalmente recuperada ao
longo do tempo.
Para mostrar os efeitos da
desvalorização na indústria local, vamos construir um exemplo usando uma
empresa de balanças eletrônicas que vende o produto dentro e fora do Brasil e
importa metade dos componentes utilizados na sua montagem. Imagine que um lote
de 10 peças seja comercializado por R$ 6.400,00. Em janeiro de 2019, quando o
valor médio do dólar correspondia a R$ 3,65, a empresa recebia um total de U$
1.753.
Em dezembro do mesmo ano, porém, com
o câmbio a R$ 4,03 e mantido o preço em reais, a fábrica embolsaria somente U$
1.600 pelas 10 balanças, U$ 153 a menos em relação a janeiro. Na pratica, isso
significa que para obter a quantidade de dólares conseguida no início do ano, a
empresa precisaria exportar uma peça a mais.
Mas este
não é o único inconveniente. À medida que o dólar ficou mais caro, o fabricante
tem que gastar uma quantia proporcionalmente maior de reais para importar os
componentes de que precisa para montar as balanças. Desta forma, o preço final
em reais vai aumentar de acordo com o peso que estas peças têm no valor do
produto.
Com o
real desvalorizado, as vendas nos mercados externos não seriam prejudicadas, à
medida que o aumento do preço em reais seria compensado pelo valor do dólar. O
fabricante continuaria recebendo menos dólares em relação a janeiro de 2019,
mas as exportações manteriam um preço competitivo.
O
problema é no mercado interno. Com uma balança mais cara saindo dos seus
galpões, a empresa corre o risco de diminuir as vendas no território nacional e
de ver parte dos seus lucros encolherem. Para restabelecer uma situação de
equilíbrio entre aumento dos custos, produção, vendas para o mercado interno,
exportações e lucros só há uma saída imediata: aliar um forte aumento da exploração
do trabalho a uma redução branda dos preços.
Ou seja,
quando a corrente de suprimentos tem elos que saem das fronteiras nacionais, a
política de desvalorizar a moeda para aumentar as exportações e a produção
local acaba resultando em mais uma chicotada no lombo dos trabalhadores e um
tiro no pé dos empresários que vêem suas mercadorias perderem competitividade
no mercado interno em função do aumento dos custos de produção.
4. Relações internacionais: grandes conquistas
ou problemas à vista?
No âmbito das relações internacionais
o estardalhaço em volta dos resultados das visitas oficiais a outros paises e
do acordo comercial entre o Mercosul e a União Européia apontou horizontes que
não resistem a uma análise criteriosa da realidade.
No primeiro encontro com o presidente
dos EUA, Donald Trump, Bolsonaro fez uma série de concessões que, no entender
dele e da equipe econômica traçariam um futuro promissor para o país. Em troca
da promessa de indicar o Brasil como candidato a membro da Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), Bolsonaro isentou os turistas
estadunidenses do visto de entrada no país, sem que os EUA tenham oferecido o
mesmo tratamento aos brasileiros; concordou em importar anualmente 750.000 toneladas
de trigo estadunidense sem cobrar nenhuma tarifa, afetando as exportações da
Argentina que é o principal vendedor de trigo para o Brasil e o maior comprador
dos produtos industrializados aqui produzidos; elevou a cota de importação de
etanol americano isento da tarifa de 20% de 600 para 750 milhões de litros,
contrariando os usineiros que consideram desleal a competição com o preço
oferecido pelos estadunidenses; cedeu o uso da base de lançamento de mísseis de
Alcântara (MA) sem ter nenhum acesso às tecnologias que serão empregadas no
local; e renunciou ao tratamento diferenciado que o Brasil tinha no âmbito da
Organização Mundial do Comércio (OMC) por ser um país em desenvolvimento.
Este tratamento permitia exigir, por
exemplo, que os produtos comprados nas licitações públicas tivessem determinada
porcentagem de componentes produzidos no Brasil. Desta forma, as compras
governamentais estimulavam a produção e a geração de empregos do país. Do mesmo
modo, ser uma economia em desenvolvimento permitia manter tarifas sobre as
importações a fim de proteger as mercadorias nacionais da concorrência dos
países desenvolvidos e contar com prazos mais prolongados para cumprir as
determinações da OMC. Ter renunciado ao
tratamento diferenciado pode prejudicar o comércio, a indústria e o
desenvolvimento do país.
Em troca, Trump elevou o Brasil à
condição de aliado militar estratégico dos EUA fora da Organização do Tratado
do Atlântico Norte (OTAN). Esta relação permite ao Exército brasileiro melhorar
o acesso à tecnologia militar norte-americana, mas implica em aceitar uma maior
influência de Washington na política externa do país e pode arrastá-lo em
conflitos e disputas que interessam, sobretudo, aos EUA.[31]
Além de ter concedido muito a troco
de quase nada, pertencer OCDE tem custos que podem superam os benefícios. De um
lado, integrar este clube de países sediado em Paris melhora a nota das
consultorias internacionais que avaliam quão seguro é transferir dinheiro para
o Brasil e, em função disso, o país aumenta as chances de receber investimentos
externos. De outro, esta espécie de
“selo de qualidade” não sai de graça. Na fase de admissão, que demora de 3 a 5
anos, o Brasil deve demonstrar que aderiu à maior parte das recomendações da
entidade, sobretudo no campo da economia.
A OCDE, por
exemplo, é contrária a controlar as importações e as taxas de câmbio até mesmo
em momentos de crise. Do mesmo modo, não aceita que um país membro limite a
entrada de capital especulativo lançando mão de impostos, algo que o governo
brasileiro usou em 2008 para conter os efeitos da crise econômica internacional
no país. Naquela época, o Imposto sobre Operações Financeiras, aplicado a esse
tipo de investimento que entra e sai sem aviso prévio, foi essencial para
evitar quedas repentinas nas bolsas e desvalorizações da moeda nacional que
produziriam desequilíbrios indesejados para as empresas exportadoras e
importadoras.
Sendo assim, ao integrar a OCDE, o
governo brasileiro tem menos liberdade para gerir sua economia e, apesar de
moldar sua política de acordo com as demandas do Clube, nada garante que o país
receba os investimentos que espera.
Mas os
problemas com a OCDE não se limitam à política econômica a ser adotada e ao
papel do Estado na economia. A decisão do Ministro Dias Toffoli de suspender as
investigações do COAF que, ao beneficiar Flavio Bolsonaro, paralisou as
apurações de outros 900 casos de denúncias de lavagem de dinheiro e desvios de
recursos públicos levou a OCDE a enviar uma missão a Brasília em novembro
passado.
Os
retrocessos constatados no combate à corrupção após a posse do novo governo
fizeram com que os representantes europeus expressassem claramente suas
preocupações ao escrever textualmente: “Apesar de o país ter sido
reconhecido pelo Grupo de Trabalho por seus significativos esforços no combate
à corrupção após sua avaliação anterior, em 2014, há agora preocupações de que
o Brasil, devido às recentes ações tomadas pelos Poderes Legislativo e
Judiciário, corra o risco de retroceder nos progressos feitos, o que pode
comprometer seriamente a capacidade do Brasil de cumprir suas obrigações nos
termos da Convenção. (...) Preocupa-nos o fato de que tudo o que o Brasil
conseguiu na luta contra a corrupção possa agora estar seriamente
comprometido”.[32] Em outras
palavras, mal fomos apresentados à OCDE e já podemos ser barrados por
enfraquecer os mecanismos de luta contra o corrupção, cujo combate sem trégua
foi a principal bandeira da campanha eleitoral de Bolsonaro.
O acordo comercial entre o Mercosul e a
União Européia, assinado em 28 de junho passado, foi outro momento alardeado
como vitória do governo de plantão. A bem da verdade, as primeiras negociações
entre os dois blocos ocorreram em 1999. Após várias idas e vindas, foram
suspensas em 2003 para serem retomadas dez anos depois. Ou seja, trata-se de um
esforço diplomático de longa data, que envolveu todos os países do Mercosul e
não propriamente de algo que se deve ao governo Bolsonaro.
Uma vez aprovado pelos países da
União Européia e do Mercosul, o tratado aumenta as exportações agrícolas de
acordo com as quantidades que seguem: 99.000 ton de carne bovina (peso
carcaça); 180.000 ton de aves; 25.000 ton de suínos; 180.000 ton de açúcar;
650.000 ton de etanol; 105.000 ton de arroz; 1 milhão de ton de milho. Trata-se,
portanto, de uma perspectiva que coloca o agronegócio na linha de frente dos
defensores da sua ratificação.
Ainda que os países europeus aprovem
os termos do acordo, o que parece líquido e certo para os lucros dos
fazendeiros locais pode não se concretizar em função das políticas do governo
atual. De fato, o texto assinado pelos negociadores inclui um item pelo qual as
autoridades públicas dos países da UE têm o direito de agir para proteger seres
humanos, animais e vegetais.
Ou seja, os importadores europeus de
produtos agropecuários podem barrar as exportações de qualquer país do Mercosul
pelo fato de serem oriundas de áreas de desmatamento ou por temerem que em sua
produção tenham sido usados agrotóxicos proibidos em seus territórios. Uma
péssima notícia para o Brasil que, em 2019, teve sua imagem prejudicada pelo
aumento de 30% da área desmatada na Amazônia Legal e pela aprovação a toque de
caixa de 474 agrotóxicos, sendo que, dos 96 ingredientes ativos neles contidos,
28 são proibidos na União Européia.[33]
O acordo retira também impostos
alfandegários de ambos os lados. A União Européia se compromete a eliminar
todas as tarifas que encarecem os manufaturados importados do Mercosul em 10
anos, sendo que cerca de 80% delas serão extintas assim que o acordo entrar em
vigor. No mesmo espaço de tempo, o Mercosul vai reduzir os impostos
alfandegários num processo que deve liberalizar 91% do comércio de
manufaturados com a União Européia. Pelo que foi acordado, as empresas
européias poderão participar das licitações para compras governamentais e para
os investimentos em infraestrutura dos países do Mercosul, em todos os níveis
da administração pública.[34]
A pergunta que está na cabeça dos
empresários brasileiros é uma expressão clara dos seus temores: qual é o grau
de competitividade da indústria nacional para fazer frente à queda dos impostos
de importação e ganhar a concorrência com os europeus nas licitações públicos?
A resposta parece óbvia:
extremamente baixo.
Quanto
as relações com a China nosso principal importador de commodities, os objetivos da visita presidencial ao país, ocorrida no dia 25 de outubro
do ano passado, podem ser assim resumidos: pacificar definitivamente os ânimos
do governo de Pequim ao enterrar de vez as ameaças lançadas na campanha eleitoral,
convidá-lo a investir nos processos de privatização e na infraestrutura do
Brasil, ampliar a pauta de exportações para o gigante asiático.
Em 2019, a balança comercial entre os
dois países foi amplamente favorável ao Brasil, mas os produtos básicos
representam nada menos do que 90% das exportações brasileiras enquanto a
porcentagem de manufaturados não passa de 2%. Por outro lado, 98% das
exportações chinesas para o Brasil são de produtos manufaturados e apenas 2% de
básicos.[35] Com a estimativa de queda do crescimento da economia chinesa, devido aos
efeitos da pandemia, nada garante que 2020 tenha o mesmo resultado do ano
passado.
Diante deste quadro, a tentativa de
ampliar as vendas de industrializados para a China contava com a intenção do
Ministro Paulo Guedes de introduzir a possibilidade de criar uma área de livre
comércio entre os dois países. Ao projetar o que aconteceria após o fim dos
tributos que limitam a entrada no país dos produtos da indústria chinesa -
processo típico da implantação de qualquer tratado desta natureza - o
presidente da Associação de Comércio Exterior, José Augusto de Castro, afirmou
que na situação atual, “seria um suicídio industrial coletivo”, à medida
que os manufaturados brasileiros são, em média, 30% mais caros em relação aos
chineses.[36] Ou seja, a abertura comercial com
Pequim faria com a que os baixos preços das mercadorias vendidas pela China
acabassem inviabilizando a venda no mercado interno do que é produzido nas
indústrias do Brasil, o que levaria ao fechamento de inúmeras fábricas.
Felizmente a idéia não prosperou em
função das regras do Mercosul. Por pertencer a este bloco de países, o Brasil
só poderia negociar a eliminação de tarifas e limitações alfandegárias com
todos os demais membros, e não através de um acordo bilateral.
Entre os dias 28 e 30 do mesmo mês,
Bolsonaro esteve na Arábia Saudita, onde assinou seis documentos, entre acordos
e memorandos. Concretamente, além das facilitações na concessão de vistos para
turismo, trabalho e negócios, o país prometeu investir no Brasil até 10 bilhões
de dólares em projetos sauditas.[37] Dias depois, o Ministro do Comércio
e do Investimento da Arábia, Majid bin Abdullah Al Qasabi, afirmou que a
agricultura era a área à qual se destinaria o maior volume do dinheiro prometido,
à medida que o país importa cerca de 85% da comida consumida pela sua
população.[38] Isso não significa que o Brasil
definirá os projetos que servem para matar a fome dos brasileiros e os árabes
entrarão com o dinheiro, ganhando, obviamente sua parte de lucros e dividendos,
e sim que serão projetos sauditas em território brasileiro para atender às
necessidades e aos interesses de Riad. Mais um país que, com o dinheiro na mão,
vêm aqui para fazer o que seus governantes quiserem a fim de levarem o que puderem.
Em janeiro deste ano, Bolsonaro definiu
como um feito inédito o resultado da viagem à Índia que levou à assinatura de
15 documentos. Além de não citar os protestos contra a sua presença no país por
abrir as “portas para a espoliação corporativa da floresta amazônica”,
por encabeçar um governo corrupto e repressivo e por levar adiante um processo
na OMC que pode arrasar o setor ligado à produção e ao processamento da
cana-de-açúcar na Índia (que emprega 50 milhões de agricultores e 500.000
trabalhadores nas usinas),[39] o Presidente brasileiro esqueceu de
dizer que 8 dos 15 documentos não passam de memorandos de entendimento. Ou
seja, a maior parte dos acordos contém apenas um registro simplificado de
princípios gerais que orientam as relações entre os dois países em determinadas
áreas, mas que não geram nenhum tipo de obrigação no âmbito do direito
internacional.[40] Uma espécie de carta de intenções
sem nenhum compromisso que possa ser cobrado.
Os títulos dos documentos
impressionam pelos termos utilizados, mas o conteúdo deixa muito a desejar.
Vejamos os principais exemplos.
O mais genérico dos acordos é o Plano
de Ação para fortalecer a parceria estratégica entre o Brasil e a Índia.
Apesar das palavras altissonantes, não há no texto nenhuma instância que já não
estivesse presente nos termos da Parceria Estratégica firmada em 2006 durante o
governo Lula. Na prática, Brasil e Índia se comprometem a realizar encontros
bilaterais com alguma frequência priorizando seis áreas temáticas: coordenação
político-estratégica; comércio, investimentos, agricultura, aviação civil e
energia; ciência, tecnologia e inovação, cooperação espacial, meio-ambiente e
cooperação técnica; defesa e segurança; cultura e educação; temas consulares,
saúde, previdência social e cooperação jurídica.
O principal acordo assinado neste
encontro é o de Cooperação e Facilitação de Investimentos. De um lado, empresas
e indivíduos sabem de antemão que não poderão acionar os Estados nos processos
de arbitragem internacional. De outro, o investidor estrangeiro, seja ele
pessoa física ou jurídica, passa a ter uma espécie de representante na Câmara
de Comércio Exterior a quem pode recorrer para prevenir conflitos e mediar
disputas. Com base nestas medidas, o acordo busca aumentar os investimentos recíprocos,
criando um ambiente de maior segurança jurídica. Resta saber até que ponto esta
base será suficiente para driblar os impactos do esfriamento progressivo da
economia mundial na Índia e no Brasil ao longo do próximo período.
O entendimento mais comemorado por
Bolsonaro diz respeito à cooperação no setor da bioenergia, destinado a
aumentar a produção e o uso do etanol na Índia. A perspectiva é a de que o país
adote uma mistura de 10% de etanol nos combustíveis a partir de 2022 e de 20% a
partir de 2030. Ao fazer isso, a Índia encolheria a produção de açúcar para
aumentar a de etanol. Teoricamente, isso reduziria as distorções causadas nos
preços internacionais pelos subsídios do governo de Nova Deli à produção local
de açúcar e, no futuro, o país poderia montar carros flex, o que abriria um
mercado promissor para a tecnologia automobilística brasileira. O caminho para
isso é longo e cheio de obstáculos.
Resumindo, podemos dizer que não
faltam chances de o Brasil receber um volume maior de investimentos e de
melhorar as exportações, mas não nas dimensões em que as afirmações bombásticas
do Presidente deixavam entender e sem contar que os efeitos colaterais podem
superar as vantagens que o governo espera obter.
5. Um rápido balanço de algumas
figuras do governo
Encerrado 2019, algumas reflexões
intrigam quem busca atravessar a barreira das aparências para observar a
realidade que se movimenta à sua sombra.
Tivemos um ano em que a economia
seguiu a passo de lesma; o desemprego diminuiu, sobretudo, graças ao aumento da
precarização do trabalho; a reforma da previdência não reduziu desigualdades,
não eliminou privilégios e levou os trabalhadores a adiarem a idade em que
podem se aposentar num mercado de trabalho que caminha para ampliar a
informalidade e a precarização; o salário mínimo conheceu o fim da política de
aumentos reais; e o que resta das estatais e da legislação trabalhista segue
sob ataque cerrado do Ministério da Economia.
Sempre em 2019, as Universidades
Federais sofreram cortes de recursos e um processo de desqualificação constante
por parte do Presidente e do Ministro da Educação. No dia 12 de dezembro passado, por exemplo,
em Palmas, TO, Bolsonaro classificou estas instituições como lugares onde “se
faz tudo menos estudar”.[41] E isso apesar de o Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, órgão do MEC responsável por
avaliar as instituições de ensino superior, divulgar no mesmo dia um relatório
onde aponta que 56,8% dos cursos avaliados nas Universidades Federais têm notas
entre 4 e 5 (melhor faixa), ante 33,4% das privadas sem fins lucrativos, 30,8%
das universidades públicas estaduais e 28,4% das privadas com fins lucrativos.[42]
Em termos ambientais, o desastre de Brumadinho, as
queimadas descontroladas de amplas áreas de floresta, a contaminação por
derramamento de petróleo no litoral do Nordeste e o papel desempenhado pelos
representantes do país na Conferência sobre o Clima em Madri, na Espanha,
mudaram a imagem internacional do Brasil de liderança no combate ao aquecimento
global para a de nação que ameaça os esforços mundiais de preservação dos
ecossistemas.
Em vários momentos, a preocupação com
a ameaça do comunismo funcionou como fantasma invocado ora para justificar o
aumento dos sofrimentos do povo causado pelas políticas do governo, ora para
que o medo alimentasse o apoio ao Presidente. Lembramos aqui dos profissionais
cubanos que integravam o programa “Mais Médicos” criado pela Presidente Dilma
Roussef para cobrir as vagas que os médicos brasileiros não queriam ocupar em função
das dificuldades que oferecem.
Sem apresentar provas, indícios de
incompetência profissional ou descaso na relação com os pacientes, Bolsonaro
não esperou a posse para cobrir o trabalho dos cubanos com o manto da
desconfiança por atuarem sem ter validado o diploma obtido no país de origem.
Em 1º de agosto de 2019, ao lançar o programa “Médicos para o Brasil”, o
Presidente da República foi mais longe ao usar parte do seu discurso para
criticar o Partido dos Trabalhadores e o programa Mais Médicos que, segundo
ele, tinha o objetivo de formar núcleos de guerrilha comunista no Brasil. Prova
de que nada disso era verdadeiro, os mais de 1800 profissionais cubanos que
resolveram não acatar a decisão do governo de Havana de fazê-los voltar ao país
devem sem recontratados sem revalidação do diploma para preencher as vagas que
permanecem abertas.[43]
As coisas não são diferentes com a
Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. Várias de
suas declarações despertaram riso e levantaram polêmicas. Todos lembramos da
fala em que a Ministra, ao se posicionar contra a chamada ideologia de gênero,
declarou que o governo do presidente Jair Bolsonaro marcava no Brasil “uma nova
era em que menino veste azul e menina veste rosa”. Ou do insulto ao movimento
feminista durante a Conferência da Ação Política Conservadora, no dia 12 de
outubro, ao afirmar: “estou aqui há 24 horas e ninguém me ofereceu ainda um
cigarro de maconha e nenhuma menina introduziu um crucifixo na vagina”.[44]
Situações como estas chamaram a
atenção de muitos, mobilizaram apoiadores e críticos, despertaram risos,
aplausos e condenações, mas, sobretudo, levantaram uma cortina de fumaça que
ofuscou as decisões mais graves do seu Ministério. Estamos nos referindo, por
exemplo, à descontinuidade e à paralisia de diversas políticas públicas
colocadas em andamento nos governos anteriores, às intervenções que, ao
substituir eleições por processos seletivos e revogar o mandato de alguns
conselheiros, buscavam pilotar o trabalho dos Conselhos e das Comissões
Nacionais de Políticas Púbicas, às intervenções que inviabilizaram o trabalho
do Sistema de Prevenção e Combate à Tortura, formado por peritos independentes
que realizavam vistorias em prisões e estabelecimentos onde há privação da
liberdade.[45]
A Comissão criada com o propósito de
reconhecer mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura militar,
localizar corpos e emitir pedidos de indenização de familiares das vítimas, viu
quatro de seus sete integrantes sendo paulatinamente substituídos.
Entre os novos encarregados de levar
adiante os trabalhos, está o Coronel reformado Waslei Antonio Maretti, que
defendeu o Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra no processo em que foi
condenado por tortura. Pelo visto, a ministra que deveria agir para fazer
respeitar os direitos humanos não tem nenhum pudor em admitir para um cargo tão
delicado quem defendeu o militar que não titubeava em torturar mulheres
grávidas introduzindo ratos vivos em suas vaginas.[46]
O caso do Ministro da Justiça, Sérgio
Moro, é mais complexo. Visto como paladino da luta contra a corrupção, foi
colocado em várias saias justas pelo Presidente da República e manteve um
silêncio cúmplice quando da indicação do filho de Bolsonaro para ocupar o cargo
de embaixador do Brasil nos EUA, dos expedientes utilizados para livrar Flavio
Bolsonaro das acusações de participar de atos ilícitos ao lado de Fabrício
Queiroz, da naturalização verbal da prática da “rachadinha” numa fala do
próprio Presidente e na defesa da volta do AI 5 por Eduardo Bolsonaro e Paulo
Guedes.
Sua imagem de juiz íntegro foi
arranhada também pelos diálogos com o Procurador da República, Dalton Dallagnol divulgados pelo site The
Intercept e nos quais aparecia claramente que o desejo de condenar o
ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva superava a vontade de apurar as
acusações num processo honesto e transparente.
Após este breve resgate, vamos
levantar os índices de aprovação registrados em algumas pesquisas, cujos resultados contrariam as expectativas de quem
apostava que o governo seria reprovado a medida que a população ouvisse os
absurdos que dizem os seus membros e enxergasse os efeitos negativos das ações
colocadas em andamento. Entretanto não é isso que os números mostram.
6. A aprovação do governo nas pesquisas de opinião.
Uma pesquisa promovida pela Confederação
Nacional da Indústria aponta que 60% dos 1.914 empresários entrevistados, entre
os dias 2 e 10 de dezembro de 2019, consideravam o governo como ótimo ou bom;
26% como regular e apenas 7% como ruim ou péssimo e 7% não sabiam ou não quiseram responder. [47]
Que o empresariado apóie o governo
Bolsonaro é mais que esperado. Os números que assustam são aqueles que retratam
a opinião das pessoas comuns.
Entre 5 e 7 e dezembro de 2019, o
Datafolha realizou 2.948 entrevistas em 176 cidades do país. O grau de
confiança da pesquisa é de 95% e a sua margem de erro é apenas de 2 pontos
percentuais para mais ou para menos. Ao comparar os resultados obtidos com o
levantamento do mesmo instituto em abril do ano passado, temos os resultados
que seguem:[48]
Quadro 4: Evolução da avaliação do presidente da República, Jair Bolsonaro - Brasil - 2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe/ não quer opinar
|
Abril
|
32%
|
33%
|
30%
|
4%
|
Dezembro
|
30%
|
32%
|
36%
|
1
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
O Quadro
revela que o índice de aprovação do Presidente da República se movimenta dentro
da margem de erro da pesquisa que é de dois pontos percentuais. As avaliações
de ótimo e bom passam de 32% para 30% entre abril e dezembro; o número de
pessoas que considera o seu governo como regular cai apenas um ponto percentual
e o aumento da reprovação em seis pontos percentuais soma a queda de três
pontos no grupo dos que não sabem ou não querem opinar à redução dos que, em
abril, aprovavam o seu governo.
Quadro 5: Evolução
da avaliação do Ministro da Economia, Paulo Guedes - Brasil - 2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe
|
Abril
|
40%
|
38%
|
16%
|
6%
|
Dezembro
|
39%
|
33%
|
23%
|
5%
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
No caso
do Ministro da Economia, constatamos que também a redução de um ponto
percentual nas avaliações de ótimo e bom está dentro da margem de erro da
pesquisa e que o aumento no número dos que desaprovam as políticas
implementadas cresce, sobretudo, com
base na redução dos que, na pesquisa anterior, consideravam regular a sua forma
de conduzir o ministério.
Contudo,
quando consideramos o fato de a economia não oferecer razões de otimismo, é
assustador perceber que a parcela dos que avaliam a sua gestão como boa ou
ótima tenha se mantido praticamente inalterada.
Quadro 6: Evolução
da avaliação do Ministro da Justiça, Sérgio Moro – Brasil - 2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe
|
Abril
|
63%
|
16%
|
19%
|
3%
|
Dezembro
|
53%
|
23%
|
21%
|
3%
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
Apesar de ser o ministro melhor
avaliado, Moro caiu dez pontos percentuais entre os que consideram seu
desempenho como ótimo ou bom, oito dos quais migraram para regular e os dois
restantes aumentaram a reprovação que, apesar disso, se manteve na margem de
erro da pesquisa.
Quadro 7: Evolução da avaliação da Ministra da Família, Mulher e Dir. Humanos,
Damares Alves - Brasil - 2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe
|
Abril
|
44%
|
24%
|
27%
|
4%
|
Dezembro
|
43%
|
27%
|
26%
|
4%
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
A diminuição de um ponto percentual nas
avaliações negativas de Damares Alves surpreendeu os que esperavam um desgaste
da Ministra. A aprovação da sua gestão diminuiu dentro da margem de erro da
pesquisa e os que consideram seu desempenho como regular passaram de 24% para
27%.
Quadro 8: Evolução
da avaliação do Ministro do Meio-Ambiente, Ricardo Salles – Brasil/2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe
|
Abril
|
33%
|
36%
|
21%
|
10%
|
Dezembro
|
27%
|
38%
|
28%
|
7%
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
Ricardo
Salles teve a avaliação de ótimo e bom reduzida em seis pontos percentuais,
enquanto o grupo dos que a tem como ruim e péssima cresceu 7. Apesar disso,
quando consideramos o nível de desgaste a que foi submetido, não dá para negar
que, entre ótimo, bom e regular, caiu somente 3 pontos percentuais, passando de
69 para 65%. De modo que sua avaliação
ficou além do que seria razoável em meio as tragédias ambientais que marcaram o
país no ano passado.
Quadro 9: Evolução
da avaliação do Ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo – Brasil/2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe
|
Abril
|
37%
|
34%
|
19%
|
11%
|
Dezembro
|
33%
|
38%
|
19%
|
10%
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
Menos conhecido em relação aos
anteriores e tratando de questões de política internacional, nem sempre
acessíveis ao conjunto da população, a avaliação negativa de Ernesto Araújo se
manteve estável em 19%, ao passo que a redução de três pontos percentuais
daqueles que consideram o seu desempenho como ótimo e bom se deslocou para o
contingente de quem o avalia como regular.
Quadro 10:
Evolução da avaliação do Ministro da Educação Abraham Weintraub – Brasil - 2019
Mês
|
Ótimo/bom
|
Regular
|
Ruim/péssimo
|
Não sabe
|
Abril
|
30%
|
29%
|
34%
|
6%
|
Dezembro
|
34%
|
31%
|
31%
|
3%
|
Fonte:
elaboração própria a partir dos dados do Datafolha
O caso do Ministro da Educação é, sem
dúvida, o mais intrigante. Apesar de a sua atuação desastrada levar ao maior
protesto registrado em 2019, a pesquisa mostra que a avaliação negativa caiu
três pontos percentuais e que a aprovação como ótimo ou bom cresceu nada menos
do que quatro pontos percentuais.
O que explica estes resultados? È o
que vamos analisar a seguir.
7. A relação do governo com o senso
comum
De acordo com a análise do cientista
político Giuliano da Empoli, as
avaliações positivas do governo de Jair Bolsonaro se devem a uma estratégia de
comunicação bem parecida com a do presidente dos EUA, Donald Trump, e de outros
políticos da atualidade. [49]
Longe de buscar adesões com base em
programas de governo, a direita capta as angústias, os desejos, os motivos de
raiva e de medo que circulam nas redes sociais a fim de delinear os temas que
agitam os sentimentos da maioria. Sobre esta base, formula posições, inflama
paixões e constrói identidades que levam o senso comum a se reconhecer no que
está sendo dito e nas soluções propostas. Estabelecida esta sintonia, as
pessoas tendem a abrir mão de qualquer reflexão crítica, criam expectativas em
relação aos próximos passos e se mantêm atentas para não perder nenhum lance.
Vejamos com um exemplo como isso funciona.
Diante do
aumento da violência, a visão de mundo do senso comum associa o aumento da pena
e o endurecimento do sistema prisional à diminuição da criminalidade. É como se
a idéia de passar certo número de anos na cadeia fosse um fator capaz de
dissuadir alguém da vontade de cometer um ato ilícito. Encontramos esta mesma
compreensão no
pacote contra o crime apresentado pelo Ministro Sérgio Moro e aprovado pelo
Congresso.
Sem entrar no debate das causas da
violência, basta pensar um pouco para perceber que o medo de parar atrás das
grades desaconselharia a opção pelo crime apenas se estivesse associado à
certeza do castigo. Do contrário, a legislação serviria apenas como uma espécie
de ameaça distante e não produziria os efeitos esperados.
A primeira prova do acerto desta
constatação vem da própria história do Código Penal Brasileiro. Criado em 1940,
este conjunto de normas que define os crimes e estabelece as penas
correspondentes foi atualizado ao longo do tempo. Até 2015, este processo levou
à aprovação de 150 leis, sendo que 80% delas previam punições bem mais severas
em relação ao período anterior. Apesar disso, a criminalidade caminhou a passos
largos no que diz respeito ao número e ao tipo de ocorrências.[50]
A segunda vem da eficiência da ação
policial, ou seja, de quantos crimes são solucionados e tem seus executores
devidamente julgados e encarcerados. E é bem aqui que começam os problemas,
tanto no Brasil como em qualquer lugar do mundo. Em 1997, um levantamento
realizado na Inglaterra e no País de Gales mostrava que, em média, apenas 45,2%
dos delitos cometidos chegaram ao conhecimento da polícia e só em 24% a
ocorrência foi registrada nas delegacias. As investigações levaram a um culpado
em 5,5% dos casos, mas apenas em 0,3% os criminosos receberam pena de prisão.[51]
Neste mesmo período, com base em
levantamentos realizados em São Paulo, Túlio Kahan estimou que somente 6,4% de
todos os crimes ocorridos se transformaram em inquérito policial. Na região
metropolitana do Rio de Janeiro, um estudo da Fundação Getulio Vargas mostrou
que, incluindo os crimes violentos, 80% das vítimas não comunicaram a
ocorrência, majoritariamente, por medo da polícia ou por não acreditar nela.[52]
Diante da baixíssima probabilidade
estatística de acabar na cadeia, podemos concluir que ser criminoso é exercer
uma atividade de baixo risco.
A situação melhora quando focamos as
atenções nos casos de morte violenta que, por sua gravidade, dificilmente
deixam de ser notificadas às forças policiais. O relatório das Nações Unidas
sobre Drogas e Crimes, que analisa a realidade de 72 países, mostra que, em
média, 63% dos homicídios registrados nas delegacias policias são esclarecidos
pelo trabalho de investigação e seus autores são denunciados à justiça. No
Brasil, o Monitor da Violência realizou um levantamento da situação de 1.195
casos ocorridos no período de dois anos. Os dados divulgados em setembro de 2019
e apresentaram o cenário que segue:
Quadro 11: Casos
de morte violenta e status do inquérito policial[53]
Status
|
Número
de casos
|
Porcentagem
sobre o total
|
Total de
ocorrências de morte violenta
|
1.195
|
100%
|
Casos concluídos
ou arquivados
|
595
|
49,8%
|
Casos arquivados
sem que o autor fosse encontrado
|
105
|
8,8%
|
Casos em
andamento
|
569
|
47,6%
|
Não informado ou
inquérito não instalado
|
31
|
2,6%
|
Casos em que o
autor não foi identificado
|
501
|
41,9%
|
Inquéritos com
autor identificado
|
492
|
41,2%
|
Suicídios
|
99
|
8,3%
|
Casos em que a
morte ocorreu por intervenção policial
|
67
|
5,6%
|
Casos com um ou
mais suspeitos detidos
|
259
|
21,7%
|
Casos em que os
autores foram a julgamento
|
68
|
5,7%
|
Casos que
resultaram na condenação de ao menos um réu
|
57
|
4,8%
|
Fonte: elaboração
própria a partir dos dados do Monitor da Violência
Tendo como
base as 1.195 ocorrências pesquisadas, percebemos que o autor não foi
identificado em pouco menos de 42% desse total, porcentagem bem próxima a que
indica o número de casos em que o assassino foi identificado.
Para averiguarmos quantos homicídios tiveram seus
autores denunciados na justiça precisamos subtrair o número de suicídios e de
casos em que a morte ocorreu por intervenção policial das 492 ocorrências em
que os inquéritos levaram à identificação do autor. Sendo assim, temos que a
investigação policial conseguiu identificar o assassino em 326 casos, o que
representa apenas 27,3% das ocorrências analisadas.
Mas a condenação e o encarceramento de ao menos um
dos réus apontados nos inquéritos se realizou em apenas 4,8% dos casos. Ou
seja, mesmo nos casos de homicídio, a baixíssima porcentagem de condenados leva
a acreditar que o aumento da pena não seja um fator de dissuasão.
Apresentar esta realidade não significa assumir
uma posição contrária à aplicação de penas severas. Ao reconhecer a
ineficiência do endurecimento do castigo como fator que inibe o crime, o olhar
se dirige aos elementos que deveriam garanti-lo a todos os criminosos. Neste
sentido, o próprio monitor da violência não titubeia em evidenciar que os
principais obstáculos estão na expansão do crime organizado, no fato de a
Polícia Civil não dispor de estruturas e tecnologias que permitiriam aprimorar
suas investigações, na falta de capacitação dos peritos e de integração entre
os sistemas, nas dificuldades de atendimento ao local do crime e de apuração
dos casos que envolvem mortes ocorridas em ações policiais, no baixo
investimento no programa de proteção às testemunhas e na modernização do Código
Penal e da legislação.[54]
Reconhecer esta realidade implica em assumir que os vários níveis de governo
estão bem aquém de oferecer às forças policiais as condições necessárias para
conter o crime com a certeza da aplicação do castigo previsto pela lei.
O vórtice
criado pela manipulação
das emoções impede às pessoas de
colocar em dúvida as afirmações que saem da boca das autoridades e sua adesão a
elas chega a ponto de levantar uma barreira de desconfiança em relação a todos
aqueles que manifestam algum tipo de oposição. À medida que a
simplicidade das falas e dos comentários dos membros do governo cria nas
pessoas a ilusão de terem acesso à verdade sem intermediários, o conteúdo do
que é dito marca o sentido atribuído aos acontecimentos e ritmo das relações
com o público e a mídia.
É justamente em função disso que o
próprio Bolsonaro tem optado por reduzir as intervenções do porta-voz da
Presidência a fim de ele mesmo dar declarações diárias na saída do Palácio da
Alvorada ou através das redes sociais. O caráter frequentemente polêmico e
agressivo das afirmações presidenciais atrai os holofotes da mídia, pauta as
polêmicas e os assuntos a serem discutidos numa sequência de provocações que
impede de chegar a qualquer conclusão consistente.
Graças a este conjunto de ferramentas, a comunicação oficial passa a fabricar
as verdades que interessam ao governo sem qualquer compromisso com a coerência
e com a realidade dos fatos. Com a razão do povo simples aprisionada pela
sintonia que conecta o discurso às emoções do senso comum, fazer política com
mentiras e difamações, com meias verdades ou denunciando posições contrárias
como conspirações torna-se uma atividade que, longe de colocar em risco a
aprovação popular, tem amplas chances de fortalecê-la.
A título de exemplo, imagine a reação
de um trabalhador braçal que mal completou o ensino fundamental e se esfola em
longas jornadas de trabalho diante da informação do Ministro da Educação pela
qual os docentes das universidades federais são “zebras gordas” que, “trabalhando
em regime de dedicação exclusiva, para dar só 8 horas de aula, ganham R$
15.000,000, R$ 20.000,00”.[55]
É claro que o Ministro não esclarece
de que se trata de profissionais próximos à aposentadoria; que estão no cargo
há mais de 30 anos; e, também, não tem nenhuma preocupação em dizer que dar
aula é apenas a parte mais visível do trabalho docente. Nenhuma palavra lembra
do tempo gasto na preparação das próprias aulas, nas pesquisas e atividades de
extensão, no atendimento à comunidade (como no caso dos hospitais
universitários), nas tarefas relativas à orientação dos alunos ou à
participação em bancas de qualificação de projetos e defesa de trabalhos
finais, etc., algo que demanda um volume de trabalho invisível muito superior
ao que é possível constatar quando um docente dá aula.
Repare que a forma como a notícia é anunciada
tende a gerar um sentimento de revolta que impede às pessoas de quererem saber
o que está realmente acontecendo, levando-as a reproduzi-la acriticamente,
possivelmente, com a satisfação de quem ajuda a denunciar algo perverso. De expectador,
o indivíduo se torna ator e se sente parte ativa de uma luta contra o que se
apresenta como um privilégio absurdo. A identificação com a causa contribui
para o compartilhamento irrefletido da notícia que ganha asas à medida que a
população tem as redes sociais como fonte de verdade e a afirmação inicial foi
feita por quem está no papel de autoridade.
O fato de não ter a menor noção do funcionamento
de uma universidade pública e dos elementos que a distinguem de uma privada,
faz com que a raiva impeça de pensar na possibilidade de o próprio ministro
estar manipulando a boa fé alheia com a forma de transmitir a notícia. A
desconfiança que cerca as posições contrárias leva a acreditar que quem critica
o ministro busca defender os privilégios injustos dos quais pode estar se
beneficiado. Neste clima onde as paixões ditam as regras, ninguém precisa
comprovar nada, à medida que as peças parecem se encaixar à perfeição.
Por outro lado, quando o problema
ganha repercussão na mídia nacional, a saída adotada caminha no sentido de
denunciar algum tipo de conspiração contra as ações do governo. As falhas na
atribuição das notas do ENEM são um dos casos emblemáticos. Diante da Comissão
do Senado que o convocou, o Ministro da Educação, afirmou que “desde o
começo, alguns grupos de parlamentares, alguns grupos econômicos e alguns meios
de comunicação hegemônicos adotaram uma linha extremamente terrorista no
processo” e se defendeu dizendo se tratar de um problema que “pode ter,
sim, acontecido no passado”. [56]
Repare que as falas deixam entender a
quem Weintraub está se referindo, apelam subliminarmente às desconfianças que a
própria esquerda sempre levantou contra grupos econômicos e meios de
comunicação e fazem pairar sobre os governos petistas a idéia de que o mesmo
problema pode ter ocorrido sem que o deixassem vir à tona. Sem apresentar
provas que sustentassem suas afirmações e sem esclarecer a origem do problema,
a fala do Ministro fez com que ele passasse de responsável final pelo erro a
vítima de um conluio de forças poderosas.
Por outro lado, o diálogo com o senso
comum conta com uma base de entendimentos que foi se consolidando ao longo das
três últimas décadas. Começamos a analisar esta relação em setembro de 2018,
quando o apoio popular ao então candidato Jair Bolsonaro surpreendia os setores
progressistas.[57] Após o primeiro ano de governo, já é
possível constatar que idéias como a de que “o empresário no Brasil sofre
muito” e “os trabalhadores têm que escolher entre ter direitos e ter
empregos”, encontraram nas pessoas os elementos essenciais para produzir o
que pretendiam sem despertar reações.
No início dos anos 90 o desempenho
empresarial passa a ser assimilado como critério de bem-estar social. Em várias
ocasiões, a convicção pela qual “o país vai bem quando as empresas vão bem”
uniu patrões e trabalhadores nas pressões para os governos reduzirem a carga
tributária a fim de aumentar as vendas e gerar empregos. Contribuir para a
saúde financeira das empresas se tornou sinônimo de cuidar do próprio presente
e assegurar possibilidades de uma renda melhor no futuro próximo. Esta
percepção se fortaleceu com os acordos de Participação nos Lucros e Resultados,
pelos quais o compromisso dos trabalhadores com a produtividade e os lucros
gerava, ao mesmo tempo, a sensação de garantir o próprio emprego e uma fatia
maior na divisão dos ganhos empresariais.
Passo a passo, estes elementos
ajudaram a naturalizar a compreensão pela qual as demandas patronais devem
constituir uma espécie de bússola para as políticas governamentais, à medida
que a rentabilidade das empresas é o passo sem o qual o país não avança e os
trabalhadores perdem boas oportunidades de emprego.
A confiança no empresariado se
fortaleceu a ponto de não sofrer abalos diante da avalanche de acidentes de trabalho,
doenças profissionais e denúncias de assédio que marcaram as estatísticas do
período; passou praticamente incólume pelos processos da Lava Jato nos quais
executivos e diretores de empresas faziam da corrupção de políticos e
governantes um meio para assegurar contratos e engordar os cofres; e desfilou
de cabeça erguida diante dos dados pelos quais a renúncia fiscal promovida
pelos governos e destinada a realizar investimentos na produção, reduzir preços
e gerar empregos havia sido transformada em lucros privados sem benefícios para
a sociedade.
Do lado dos trabalhadores, a percepção do próprio
valor como produtor da riqueza foi amplamente submetida às demandas do capital
e usada para transformar o salário variável em espelho do compromisso do
empregado com a empresa e forma de posicionar o seu desempenho acima da média
do trabalhador coletivo. Além de fortalecer o individualismo e a competição
interna, a lógica do mérito contribuiu para apagar a idéia de justiça social,
consagrou a empregabilidade como peça-chave para ser e se manter empregado e
convenceu a maioria de que o “bom profissional” se garante em qualquer
circunstância graças ao seu esforço e à sua competência.
Sobre esta base, não é difícil
entender porque os lemas bolsonarianos não geraram indignação e revolta, mas se
apresentaram como a continuidade natural de uma percepção cultivada ao longo de
tempo e cujo aprofundamento se fazia necessário diante das condições deixadas
pelos governos anteriores.
8. A moral no lugar da política.
Em nosso estudo de 2018, dizíamos que, na
percepção do senso comum, as crises que atravessam a sociedade são fruto de uma
desordem moral, da falta de respeito, da perda dos valores tradicionais e de
tudo aquilo que é considerado capaz de restabelecer uma suposta ordem natural
das coisas, sinônimo de agir como manda a lei de Deus. È neste contexto que
várias falas dos Ministros fazem todo sentido. Vejamos.
Quando Abraham Weintraub disse que as
universidade federais tinham plantações extensivas de maconha e que seus
laboratórios eram usados na produção de drogas sintéticas,[58] ele não pretendia desencadear
operações policiais contra uma produção de entorpecentes que, de fato, não
existia e não existe. Suas “denúncias”
eram dirigidas a esse senso comum, para o qual não precisa provar nada, e
visavam desqualificar um ambiente onde se produzem conhecimentos que
incomodam os planos do governo, enaltecer o papel do presidente como agente que
veio pôr ordem na casa e legitimar a necessidade de adotar medidas que
restrinjam a liberdade de professores e alunos.
No ensino fundamental e médio, as
situações de indisciplina e as denúncias de agressão contra os docentes
serviram ao governo como motivo para impor a militarização das escolas. No
estado de Goiás, por exemplo, os códigos de conduta enquadram como infrações
leves o uso de “armações de óculos de cores esdrúxulas” e as unhas consideradas
“fora do padrão”. Uso de barba, bigode, costeleta, cabelos tingidos de
forma extravagante, bem como não prestar continência aos agentes ou se recusar
a participar de eventos e desfiles da escola são situações consideradas
transgressões médias. Não zelar pelo bom nome do colégio, manter contato físico
que sugira envolvimento afetivo ou desrespeitar os símbolos nacionais são
falhas que podem levar à expulsão do aluno. [59]
Na Bahia, a militarização das escolas
públicas foi mais longe. Além de vetar o namoro na escola e o acesso a casas de
jogos eletrônicos fora dela, o controle militar atingiu as mensagens postadas
nas redes sociais e limitou o acesso a livros e revistas lidos pelos alunos,
restringindo assim a pluralidade de opiniões e o debate que estas podem gerar.[60]
O Ministério Púbico Federal baiano
(MPF) interveio para alertar que a imposição de padrão estético uniforme aos
estudantes “impacta mais intensamente em indivíduos de grupos minoritários
marginalizados ou alvo de preconceito, que se vêem impedidos de manifestarem as
características de sua personalidade e culturas diferenciadas, especialmente
quanto às identidades étnico-raciais, religiosas e de gênero”.
Aceitável quando a instituição é
tipicamente militar, a restrição ao debate e à pluralidade de opiniões,
viabilizada pelas limitações de acesso ao material impresso, segundo o próprio
MPF, “é incompatível com a democracia e com o próprio ambiente escolar o
qual pressupõe a liberdade de expressão, devendo ser incentivadas as críticas e
o dissenso, naturais ao processo de ensino/aprendizagem”.[61]
E não é para menos. Com a
militarização, a educação deixa de ser destinada a preparar indivíduos
autônomos, que aprendem a valorizar e conviver com diferentes identidades,
crenças, pensamentos, culturas, modos de ser e de viver, para se tornar uma
camisa de força que limita o trabalho docente e leva os alunos a uma
compreensão estreita da realidade.
Estranho, mas verdadeiro, as críticas a
este processo nefasto não contam com um contingente expressivo de pais de
alunos que consideram as normas impostas como fator primordial da educação. De
acordo com a pesquisadora Ana Penido, esta postura deita raízes na ilusão
pela qual os padrões comportamentais mais rigorosos incutirão a disciplina e
protegerão os filhos das grandes questões da adolescência e da juventude, como
o contato com as drogas e a vivência da sexualidade entre outras coisas.[62] Quando a vida revelar os estragos
produzidos nas pessoas, talvez seja tarde demais para pais e docentes se
rebelarem às imposições que ganham terreno no cotidiano dessas escolas.
Em relação à pastora da Igreja
Quadrangular, e hoje ministra da Família, da Mulher e dos Direitos Humanos,
Damares Alves, o esforço para restabelecer uma ordem moral baseada em valores e
posturas cristãos constitui o mote da sua atuação. Mais lembrada pelas
declarações do que pelas políticas colocadas em andamento, a relação que os
grupos progressistas mantêm com ela costuma ser mais pautada pelo deboche do
que pela preocupação de entender o alcance do seu dialogo com a população.
As polêmicas em torno da ideologia de
gênero, das declarações de Damares pelas quais o desenho animado “Frozen - uma
aventura congelante” seria uma conspiração do demônio para alavancar o
lesbianismo, da proposta de criar um canal de denúncias para os pais reclamarem
de professores que, durante as aulas, façam afirmações que atentam “contra a
moral, a religião e a ética da família”, e, mais recentemente, da abstinência
sexual entre os adolescentes como parte das políticas públicas contra a
gravidez precoce, etc. despertaram ironias ferozes e acusações ásperas.[63]
A campanha “Abrace o Marajó”, lançada
em 12 de julho do ano passado, para combater a exploração sexual e a violência
contra crianças, adolescentes, juventude, mulheres e idosos da ilha paraense
oferece uma idéia da forma como a moral se sobrepõe a uma análise criteriosa da
realidade.
Numa das apresentações, Damares diz
textualmente: “Por que os pais exploram? È por causa da fome? Vamos levar
empreendimentos para a ilha do Marajó, vamos atender as necessidades daquele
povo. Uns especialistas chegaram a falar para nós, aqui no gabinete que as
meninas lá são exploradas porque não têm calcinha. Não usam calcinha. São muito
pobres. E perguntaram ‘por que o ministério não faz uma campanha para levar
calcinhas para lá?’ Nós conseguimos um monte. Mas por que levar calcinha? Essa
calcinha vai acabar. Nós temos que levar uma fábrica de calcinhas para a ilha
do Marajó, gerar emprego lá, e as calcinhas saírem baratinhas para as meninas”.[64]
Repare que a relação com a moral e os
bons costumes se destaca na fala da Ministra e oculta completamente as
contradições sociais que geram a fome, vagamente citada por Damares que acusa
os pais de explorarem as crianças.
Do ponto de vista da relação de causa
e efeito, os espíritos mais simples entendem a mensagem como um esforço de
encontrar uma solução rápida e segura: vamos levar calcinhas...uma fábrica
delas...para que saiam baratinhas...e...ao fazer isso, subentende-se que não
haverá mais exploração sexual e violência contra as meninas.
Feito! Sem demoras, respondendo à
causa imediata identificada por especialistas desconhecidos, sem verificar as
relações de poder que geram miséria e embrutecimento humano e se a medida
corrige esta situação, sem ponderar o peso do abandono do Estado, transformando
doadores de calcinhas em obreiros do bem e empresários que montem uma fábrica
delas em anjos.
O afã em atacar a Ministra fez os setores
progressistas esquecerem que assim como as falas dela são capazes de
sensibilizar a população, as expressões de repúdio também precisam dialogar com
o povo simples, a fim de alimentar a sua indignação.
Longe de plantar dúvidas a partir de dados
concretos, de despertar reflexões críticas que mostrasses a possibilidade de o
capeta se disfarçar de anjo para viabilizar políticas e promover um moralismo
que mantêm intactos os interesses dos grupos de poder, o discurso irônico e
agressivo revelou toda a nossa incapacidade de dialogar com o senso comum. O
povo assistiu atônito aos ataques contra a ministra sem que ninguém se
preocupasse em ajudá-lo a vislumbrar o que se esconde nas dobras de posições
que fazem o mundo andar para trás.
No calor das polêmicas em volta da
“ideologia de gênero” e dos direitos das mulheres, os setores progressistas
sequer perceberam que as pessoas comuns não entendem o significado das palavras
“misógino” e “homofóbico”, mas vêem como “pouca vergonha” grande parte das pautas feministas e se unem ao
coral que defende a família nuclear (pai, mãe e filhos nascidos do casamento)
como célula de cuja integridade depende a melhoria de sua vida e a
possibilidade de colocar o país nos trilhos.
Sem querer, o jeito “progressista” de
lidar com Damares acabou colocando-a entre os paladinos do bem, enquanto os
seus críticos foram listados na turma de quem destrói os valores tradicionais,
aposta no caos e age com a perversidade típica de quem defende os interesses do
diabo.
As ironias que pretendiam destruir a
Ministra foram um tiro no pé e nos afastaram de um diálogo franco com o povo
simples. Nossas intervenções não traziam os sons, os cheiros e as perguntas que
dialogam com as imagens da realidade em que se movimentam as pessoas comuns e
acabaram menosprezadas por aqueles aos quais deveriam se dirigir.
No momento em que escrevemos, a
ministra está ganhando de lavada. Segundo a mesma pesquisa, realizada pelo
Datafolha, a atuação dela é considerada ótima ou boa por 46% das pessoas que
têm até o ensino fundamental completo, 56% dos evangélicos e é a integrante do
governo mais bem avaliada entre os que ganham até 2 salários mínimos com 42% de
ótimo ou bom. Diante deste cenário, nossas próximas reflexões vão resgatar mais
elementos da visão de mundo com a qual as elites dialogam com o povo com base
no moralismo e na religião.
9. Deus e o diabo para ocultar a
exploração do homem pelo homem
Vistas como expressão de um
conservadorismo retrógrado, as falas dos ministros e do próprio Bolsonaro
ganham força ao trilhar os caminhos marcados pela compreensão dos problemas
humanos que as igrejas, sobretudo evangélicas
pentecostais, construíram entre os
seus fiéis e simpatizantes.
Enquanto as relações de produção e a
ausência do Estado excluíam os pobres, estas congregações religiosas acolhiam
suas angústias e seus desejos de cura, realizavam rituais nos quais os
indivíduos estavam ao centro das atenções, apontavam a fé e a participação na
igreja como caminhos para o bem e uma vida de felicidade, ofereciam
acolhimento, ouvidos atentos e respostas às indagações dos marginalizados de
sempre. [65]
Sem recursos materiais para viver
dignamente e diante do desespero causado por uma situação de enfermidade, de
crise financeira, de desestruturação familiar, as pessoas deixavam de lado a
racionalidade propugnada pela ciência, pela ordem social e pelo mercado para
transformar o moralismo e a fé no porto seguro onde podiam encontrar a sensação
de segurança que a vida teimava em negar.
Ao oferecer
esperança de cura, apoio afetivo e emocional, ao reorganizar a vida dos fieis,
aumentando a auto-estima e fornecendo motivações para sair da situação em que
se encontravam, as igrejas se tornaram espaços em que um número expressivo de
marginalizados assimilou uma leitura da vida em sociedade para a qual a causa
dos males que afligem as pessoas está na ação constante do demônio.
Longe de
ser visualizada na imagem típica de um capeta com rabo, chifres e cheirando a
enxofre, a
ação demoníaca ganhou as feições dos
problemas que afligem o ser humano. Desejos mundanos, alcoolismo,
prostituição, jogo, uso de drogas, tabagismo, doenças físicas, violência,
pobreza, desemprego, infidelidades conjugais, bruxaria, feitiçaria, inveja,
olho grande, distúrbios psíquicos, insônia, dor de cabeça constante, desmaios,
nervosismo, doenças que os médicos não conseguem descobrir, medo, solidão,
insegurança, mentiras, conflitos, insatisfação pessoal, perturbações mentais,
pesadelos, audição de vozes estranhas e visões, ideação suicida, aborto, etc.
são algumas das formas que revelam a presença do demônio nas pessoas e a
maneira pela qual ele consome suas vidas ao mergulhá-las em todo tipo de
miséria e aflição.
Segundo esta visão, a causa dos males que afligem a sociedade
nunca está nas estruturas sociais historicamente construídas pelos seres
humanos, e sim na ação das forças
sobrenaturais que se apossam dos indivíduos para destruí-los. Por isso, os mais
diferentes rituais de exorcismo são considerados o passo essencial para tirar o
demônio da vida das pessoas e propor a elas a participação ativa nas atividades
da igreja e a adesão à sua proposta de conduta como caminho para pleitear as
bênçãos de Deus. Ninguém precisa lutar para mudar as relações sociais de produção
e a ordem de exploração por elas construída. Deus se encarregará de transformar
a terra num lugar onde corre leite e mel, à medida que homens e mulheres, ao
agirem em nome de Jesus, forem subtraindo tudo o que se encontra sob o poder do
demônio e conquistarem terreno para Deus. [66]
À medida que as pessoas vêem a si
mesmas como soldados que lutam ao lado de Deus contra as forças do mal e suas
manifestações, a razão cede cada vez mais espaço ao fanatismo religioso. Em
nome de Deus, apóia-se alguém que defende a tortura, justifica-se o uso
indiscriminado da força policial para matar quem ela considera criminoso,
transforma-se a discriminação em caminho para calar pessoas e consciências,
coletam-se assinaturas para legalizar um partido que optou por ter como número
o calibre das armas mais usadas no país, apóiam-se medidas que abrem caminho à
repressão como forma privilegiada de conter as contestações às políticas em
curso. Impossível dizer o que tem de cristão nesta negação prática da mensagem
central do evangelho, mas, ao se considerarem soldados de Deus e do seu
Espírito na luta contra o mal, os fiéis assumem a missão de restabelecer a
ordem que consideram divina ao lado de quem promove suas posições e que,
justamente por isso, é impossível que tenha parte com o demônio.
È nesse contexto que, segundo a nossa
análise, devemos entender a força do bordão “O Brasil acima de tudo, Deus
acima de todos!”, repetido à exaustão pelo então candidato Jair Bolsonaro.
Do mesmo modo, lembramos que, em 2 de janeiro de 2019, data da posse do seu
ministério, Damares Alves fez questão de dizer que “o Estado é laico, mas
esta ministra é terrivelmente cristã”, se apresentando assim como alguém
que se dispõe a enfrentar os demônios sob os seus mais diferentes disfarces. E
até o ministro da Economia, Paulo Guedes, aderiu a este mote ao apelidar de “imposto
do pecado” a sua sugestão de aumentar os tributos que incidem sobre os
cigarros, as bebidas alcoólicas e os produtos que contêm açúcar.[67]
O uso político da que se apresenta
como uma missão divina encabeçada pelo Presidente da República e seus ministros
ganha uma de suas feições mais contundentes no anticomunismo militante do
governo. Vejamos, por exemplo, o que escreve o Ministro das Relações
Exteriores, Ernesto Araújo, no texto “Para além do horizonte comunista”,
divulgado na página eletrônica do próprio ministério. Ao alertar para a volta
de uma suposta ameaça comunista nos países da América Latina, o chanceler
brasileiro explica como age o comunismo. Vejamos:[68]
“O socialismo, dentro da loucura
marxista, é apenas um instrumento para chegar ao comunismo, mas isso não
significa que não haja outros. Desde 1989-1991, quando desabou o ‘socialismo
real’, o marxismo vem trabalhando para desenhar novos instrumentos de construção
do comunismo. O principal desses instrumentos é o globalismo (termo que utilizo
numa acepção algo distinta daquela mais corrente que o define como a criação de
uma governança mundial; para mim, diferentemente, o globalismo é a captura da
economia globalizada pelo aparato ideológico marxista através do politicamente
correto, da ideologia de gênero, da obsessão climática, do antinacionalismo).
(...) Então, temos em todo o mundo, a
partir da virada do século, a progressiva construção de uma sociedade que é
liberal apenas na superfície, na aparência de uma economia capitalista com
instituições democráticas e direitos humanos bem bonitinhos, mas que na sua
subestrutura não é nada disso. Debaixo do liberalismo, no porão, os engenheiros
do “ideal comunista” manejam suas alavancas. No porão grassa a corrupção, o
conluio com o crime organizado, a tolerância para com a violência mais brutal,
as drogas (seu tráfico e seu uso), o capitalismo distorcido pelo controle
estatal, a repressão ao pensamento e à livre expressão, o anticristianismo e o
antiespiritualismo, o furioso moralismo materialista, a manipulação da ciência”.
Resumindo, nas palavras do Ministro,
o comunismo é um demônio tão insidioso que é capaz de se infiltrar tanto no
porão da ordem liberal para plantar nela as formas mais perversas de
desmoralização dos valores cristãos e de destruição da vida em sociedade, como
em instituições e órgãos internacionais que se apresentam com o objetivo de
fazer o bem em nome da ciência e ao lutar, veja só, contra as mudanças
climáticas.
Sendo assim, o papel desempenhado
pelo Brasil na cúpula sobre o clima em Madri, realizada em dezembro do ano
passado, obstaculizando com EUA, China, Austrália e Índia, qualquer avanço em
matéria de redução de gases que causam o aquecimento global estaria a serviço
do cristianismo, dos valores mais genuínos do ser humano, seria parte de uma
batalha importante na luta contra o globalismo comunista e em defesa dos
interesses da nação.
O texto do Ministro não é para o povo. Ele visa
alimentar ideologicamente os intelectuais conservadores que estão em contato
com ele (como os pastores das igrejas, os que semeiam medo e incendeiam as
paixões nas redes sociais com suas leituras dos acontecimentos) e precisam de
argumentos para reafirmar a confiança do senso comum nas políticas que vêm
sendo implementadas.
Ao acusar o comunismo de estar em
conluio com o que de mais sórdido uma sociedade pode ter, o ministro vai bem
além de desqualificar e condenar
uma teoria que propõe uma nova ordem social. Suas palavras centram as atenções
das pessoas numa leitura da realidade que impede de ver as relações econômicas
que se materializam nos mecanismos de exploração e concentração de renda, e
são, ao mesmo tempo, berço e adubo das contradições sociais que alimentam os
contingentes de pobres e marginalizados do país.
Se não é possível dizer que o fim da
política de aumento real do salário mínimo, a crescente precarização do
trabalho, as dificuldades de acesso aos benefícios previdenciários, o corte de
3 bilhões de reais nas verbas destinadas ao Programa Bolsa Família trabalham
para ganhar terreno para Deus, o anticomunismo militante em nome dos valores
cristãos e do fim do moralismo materialista funciona como uma espécie de
bandeira que admite todas as canalhices do governo e impede de ver que as
políticas em curso alimentam o contingente de pessoas que se deparam com o dilema de passar fome trabalhando
honestamente ou ter um pouco mais graças ao crime.[69]
O cenário que o trabalho ideológico
do governo Bolsonaro entrega à elite não poderia ser melhor. Agora ela está
muito mais livre para destruir a natureza e para ampliar a exploração dos seres
humanos protegida pela lei e pela falta de fiscalização, e ainda pode
apresentar os jogos de poder que garantem os seus interesses como parte de uma
luta que a coloca do lado do bem.
Longe de ser algo que o tempo se
encarregará de desmascarar sem um trabalho assíduo de quem não tira os olhos da
realidade dos fatos, a construção deste cenário é um passo fundamental diante
de um mundo que caminha rumo a uma nova crise econômica. É neste contexto que
se acirram as pressões para o governo proporcionar caminhos que assegurem a
valorização dos capitais disponíveis esvaziando qualquer política de Estado que
não se destine a esse fim. Quem tem pouco, terá menos ainda e encontrará cada
vez mais dificuldade para garantir uma sobrevivência digna.
Às vítimas deste processo a
conjuntura atual promete a dura tarefa de questionar um consenso social que
apóia medidas coercitivas contra quem se rebela, de enfrentar forças policiais
e milícias estimuladas a eliminar os que consideram inimigos da ordem, de
apelar a poderes de Estado que se omitem inescrupulosamente diante do que reduz
a liberdade de expressão e de condenar as bênçãos que muitas igrejas
distribuirão a quem, em nome de Deus, aponta as armas para calar os pobres.
No momento
em que escrevemos, o abismo entre o
cotidiano no qual se movimenta o povo simples e as bandeiras dos movimentos sociais não pode ser preenchido com projetos eleitorais ou intervenções
pontuais em seu meio. A esquerda fala de pobreza sem ir aos pobres, sem
conhecer a sua realidade e a visão de mundo com a qual a interpretam, sem ações
que dialogam com suas angústias diárias e constroem resistências. Culpar a
religião pelas dificuldades em sermos ouvidos ou, pior ainda, pedir que as
pessoas se afastem dos pastores e
outras lideranças religiosas que moram e atuam nos mesmos bairros são
ações que podem ajudar a encobrir os nossos erros e a adoçar o gosto amargo das
derrotas, mas que, infelizmente, aumentam a nossa distância em relação aos
trabalhadores das periferias.
Mergulhar no seu cotidiano para ouvir
e conhecer o que se vê pelos olhos deles ajudará a encontrar caminhos de
diálogo e de ação que levam o senso comum a querer nos ouvir. Pensar com a
cabeça do povo não significa abrir mão dos fundamentos teóricos que orientam a
nossa leitura da realidade, e sim, aprender a usá-los para dialogar com seus
sentimentos e emoções, para construir perspectivas de ação coletiva que tenham
a concretude de quem fala de pão, de arroz, de feijão, de trabalho, para dar
vida a uma dignidade que não se dobra às investidas do poder.
Brasil, 17 de março de 2020.
[1]
O informe completo encontra-se em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-qgencia-de-noticias/noticias/26741-desemprego-cai-para-11-9-na-media-de-2019-informalidade-e-a-maior-em-4-anos Acesso em 01/02/2020
[2]
No momento em que escrevemos, o IBGE ainda não divulgou a renda média das
várias categorias de ocupados. O último dado disponível se refere a 2018,
quando os trabalhadores por conta própria sem CNPJ recebiam, em média R$
1.285,00, valor inferior aos R$ 1.330,00
do salário médio de um trabalhador da iniciativa privada sem carteira
assinada. Em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-detalhe-de-midia-.html?view=mediaibge&catid=2103&id=2665 Acesso em 22/02/2020.
[3]
Pelos critérios do IBGE, a informalidade é constituída por trabalhadores
sem carteira assinada, trabalhadores domésticos sem carteira assinada, empregadores
sem CNPJ e trabalhadores por conta própria sem CNPJ.
[4]
Em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-qgencia-de-noticias/noticias/26741-desemprego-cai-para-11-9-na-media-de-2019-informalidade-e-a-maior-em-4-anos Acesso em 01/02/2020
[5]
Em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-detalhe-de-midia.html?view=mediaibge&catid=2102&id=3573 Acesso em 11/03/2020
[6]
Dados publicados na matéria de Érica Fraga e Arthur Cagliari, Dobra o número
de pessoas com faculdade sem emprego ou em trabalho precário. Folha de
São Paulo, 10/11/2019. Texto completo em:
https://www.1.folha.uol.com.br/mercado/2019/11/dobra-o-numero-de-pessoas-com-faculdade-sem-emprego-ou-em-trabalho-precario.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa
Acesso em 03/01/2020
[7]
A porcentagem apontada é composta, fundamentalmente, pela isenção da
contribuição patronal de 20% sobre o INSS, isenção de contribuição do sistema S
e salário-educação, contribuição ao FGTS cai de 8% para 2%, multa do FGTS em
demissão sem justa causa pode ser reduzida de 40% para 20%.
[8]
Valor Econômico 11/11/2019
[9]
Em DIEESE. Terceirização e precarização – condições de trabalho e
remuneração em atividades tipicamente terceirizadas e contratantes. São
Paulo, Nota técnica Nº 172, março 2017.
[10]
A reforma trabalhista, aprovada em novembro de 2017, ampliou a terceirização às
atividades-fim das empresas. No caso de uma montadora de veículos, por exemplo,
isso significa que a possibilidade de contratar prestadoras de serviços, antes
restritas a tarefas auxiliares, como vigilância, limpeza, asseio e conservação,
refeições coletivas, etc., pode ser estendida à atividade principal da empresa,
ou seja, para as operações de montagem dos veículos.
No caso da
“pejotização”, em geral, temos a contratação eventual de pessoas físicas, ou de
micro-empreendedores individuais, para atender demandas específicas ou
momentâneas. Os órgãos de mídia, por exemplo, costumam usá-la para fazer a
cobertura jornalística de uma atividade esportiva em regiões onde não têm
emissoras afiliadas. No lugar de arcar com os custos de um funcionário admitido
como temporário ou por tempo indeterminado, optam por contratar os seus
serviços apenas para fazer a cobertura de um determinado evento. Por outro
lado, é bastante comum que, para reduzir os gastos com os direitos sociais, as
empresas demitam funcionários experientes e com patamares salariais elevados
para contratá-los, em seguida, como pessoas jurídicas, pagando apenas pelo
trabalho efetivamente realizado. Apesar de proibida por constituir uma espécie
de assalariamento disfarçado, esta forma de contrato tem tido uma presente
crescente nos locais de trabalho.
Estes dois
mecanismos tendem a elevar a rotatividade e a alterar seguidamente a composição
do trabalhador coletivo
[11]
Em:
http://www.epsjv.fiocruz.br/noticias/entrevista/a-uberizacao-leva-a-intensificacao-do-trabalho-e-da-competicao-entre-os Acesso em 02/12/2019
[12]
Um caso de acordo informal bastante comum diz respeito à realização de horas
extras sem marcação de ponto em troca do pagamento adiantado das mesmas e, às
vezes, com um adicional superior ao que consta do acordo coletivo. Além dos
casos em que a empresa impõe esta condição, os trabalhadores costumam concordar
sem resistências pela possibilidade de ganhar mais e de colocar o dinheiro no
bolso antes do dia de pagamento. O ganho esperado leva a esquecer que o valor
recebido costuma ser inferior à soma da hora trabalhada acrescida pelos
encargos sociais e os adicionais previstos pelas normas legais, e cuja ausência
vai fazer falta no futuro. Além disso, quase ninguém considera que, em caso de
acidente de trabalho ou de trajeto, é impossível provar que o indivíduo estava
na empresa ou retornando para casa após o expediente que o registro de ponto
prova ter sido encerrado horas antes da ocorrência. Quase sempre, o que se
apresentava como um ganho acaba se tornando um tiro no pé.
[13]
Além da compra de máquinas para os
vários setores da economia, a Formação Bruta de Capital Fixo inclui, por
exemplo, os novos galpões industriais, os imóveis comerciais e residenciais
construídos em 2019, as novas escolas, hospitais, postos de saúde, os trechos
das rodovias que foram duplicados ou recapeados, as compras de equipamentos
para as forças armadas, a modernização de portos, aeroportos e ferrovias, os
investimentos públicos e privados em pesquisa e desenvolvimento e os que se
destinam à prospecção e a avaliação dos recursos minerais, etc.
Os dados
completos relativos ao PIB de 2019 e dos anos anteriores encontram-se em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-detalhe-de-midia.html?view=mediaibge&catid=2102&id=3573 Acesso em 11/03/2020.
[14]
Em:
https://cnt.org.br/agencia-cnt/investimento-transporte-em-2020-menor-16-anos Acesso em 02/02/2020.
[15]
Em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2019-12/estudo-da-fgv-aponta-para-baixa-produtividade-no-pais Acesso em 12/03/2020
[16]
Dado divulgado pelo IBGE em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/26780-producao-industrial-recua-0-7-em-dezembro-e-fecha-2019-com-queda-acumulada-de-1-1 Acesso em 04/02/2020
[17]
As tabelas completas encontram-se em:
http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/balanca-comercial-brasileira-acumulado-do-ano Acesso em 29/01/2020
[18]
Ao arredondar as porcentagens que expressam a participação de cada item, o
próprio Ministério da Economia faz com que, em alguns dos anos considerados, a
soma final chegue a apenas a 99% ou atinja 101%. Em: http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/balanca-comercial-brasileira-acumulado-do-ano Acesso em 29/01/2020
[19].
As tabelas completas encontram-se em:
http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/balanca-comercial-brasileira-acumulado-do-ano Acesso em 29/01/2020
[20]
A entrevista foi divulgada pelo jornal El País e encontra-se disponível na
página eletrônica:
https://elpais.com/economia/2020/02/05/actualidad/1580921046_527634.html#?sma=newsletter_america20200208m Acesso em 08/02/2020
[21]
O
relatório completo está disponível no link:
https://unctad.org/em/PublicationsLibrary/diaeiainf2020d1_em.pdf Acesso em 23/02/2020
[22]
Em:
https://exame.abril.com.br/economia/metas-de-privatizacoes-ja-foram-batidas-em-2019-diz-economia/ Acesso em 23/02/2020
[23]
Em
https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/01/27/rombo-das-contas-externas-sobe-para-us-50-bilhoes-em-2019-pior-resultado-em-4-anos.ghtml Acesso em 28/01/2020.
[24]
Em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-detalhe-de-midia.html?view=mediaibge&catid=2102&id=3573 Acesso em 11/03/2020.
[25]
Idem.
[26]
Diariamente, uma parcela do dinheiro depositada pelos correntistas em suas
contas bancárias é recolhida pelo Banco Central e não pode ser utilizada para
fazer empréstimos, constituindo uma reserva obrigatoriamente emprestada ao
governo, por isso tem este nome. Trata-se de um mecanismo que visa reduzir a instabilidade financeira e
ajuda a controlar a inflação. De acordo com o Banco Central, as alterações às
regras de recolhimento, realizadas em fevereiro deste ano, devem aumentar o
volume de crédito disponível no país em 135 bilhões de reais, o que deve
diminuir os juros cobrados nas várias modalidades de empréstimos e
financiamentos. Em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/02/20/bc-anuncia-medidas-que-injetam-r-135-bilhoes-na-economia-a-partir-de-março.ghtml?utm_source=push&utm_medium=app&utm_campaign=pushg1 Acesso em 21/02/2020
[27]
Em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/01/08/saida-de-dolares-do-pais-soma-us-447-bilhoes-em-2019-a-maior-em-38-anos.ghtml Acesso em 11/02/2020.
[28]
A variação anual do real frente ao dólar foi calculado com base no valor médio
do dólar de janeiro (R$ 3,65) e dezembro (R$ 4,03) de 2019 divulgados em:
http://www.yahii.com.br/dolar.html
Acesso em 22/02/2020.
[29]
As porcentagens foram calculadas pelo autor a partir dos dados oficiais
divulgados em:
http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/estatisticas-de-comercio-exterior/balanca-comercial-brasileira-acumulado-do-ano Acesso em 29/01/2020
[30]
Em:
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-detalhe-de-midia.html?view=mediaibge&catid=2102&id=3573 Acesso em 11/03/2020.
[31]
O resumo do encontro com Donald Trump encontra-se em:
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-47630890 Acesso em 31/01/2020
[32]
A íntegra do comunicado em português encontra-se em:
https://www.oecd.org/corruption/anti-bribery/0-brasil-deve-cessar-imediatamente-as-ameaças-a-independencia-e-a-capacidade-das-autoridades-publicas-para-combater-a-corrupcao.htm Acesso em 8/02/2020.
[33]
De acordo com os dados do INPE, em 2019, foram desmatados 9.762 km2
de floresta amazônica e outros 6.483 de Cerrado. Em:
http://educaclima.mma.gov.br/graficos-desmatamento-da-amazonia-e-do-cerrado-em-2019-e-mais-27-novos-graficos-da-sociedade-civil/
Os dados sobre
os agrotóxicos foram divulgados pelo jornal Folha de São Paulo. O número de
ingredientes ativos proibidos na União Européia é de um levantamento do próprio
jornal com base nos que haviam sido aprovados pela ANVISA até 19 de setembro.
Acesso ao texto em:
https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2019/12/numero-de-agrotoxicos-liberados-no-brasil-em-2019-e-o-maior-dos-ultimos-14-anos.shtml
Ambos os
acessos foram realizados em 08/02/2020.
[34]
O texto resumido do acordo encontra-se disponível no site:
http://www.itamaraty.gov.br/images/2019/2019_07_03_-_Resumo_Acordo_Mercosul_UE.pdf Acesso em 31/01/2020
[35]
ESP 16/11/2019
[36]
Em:
https://diariodocomercio.com.br/economia/acordo-com-china-depende-de-parceiros/
Acesso em 31/01/2020
[37]
O resumo dos acordos e entendimentos assinados entre Brasil e Arábia Saudita
encontra-se em:
https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/noticias/2019/10/conheca-acordos-firmados-entre-brasil-e-arabia-saudita Acesso em 31/01/2020
[38]
Em: https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2019/10/31/agricultura-e-principal-destino-dos-us-10-bi-que-arabia-saudita-prometeu.htm Acesso em 31/01/2020
[39]
Maiores informações sobre os protestos em:
https://www.brasildefato.com.br/2020/01/19/agricultores-da-india-protestam-cotra-presença-de-bolsonaro-corrupto-e-repressivo/ Acesso em 08/02/2020
[40]
O conteúdo dos acordos e os principais comentários apresentados a seguir
encontram-se em:
http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticias/2020-01/brasil-e-india-assinam-acordos-em-tecnologia-energia-e-segurança E em:
https://www.brasildefato.com.br/2020/01/25/ponto-a-ponto-conheça-os-15-acordos-firmados-por-bolsonaro-na-india/
Acessos realizados em 30/01/2020.
[41]
A reportagem consta da versão impressa do jornal O Estado de São Paulo do dia
13/12/2019.
[42]
Em FSP, 13/12/2019.
[43]
As declarações referentes à formação dos núcleos guerrilheiros e ao esforço de
desqualificar os serviços prestados por estes profissionais nas regiões mais
afastadas do país podem ser encontradas em:
https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,bolsonaro-diz-que-mais-medicos-tinha-objetivo-de-formar-nucleos-de-guerrilha.70002950683.amp Acesso em 05/01/2020
[44]
Em: https://www.brasil247.com/brasil/nucleo-de-politicas-publicas-para-as-mulheres-rechaca-comentarios-mentirosos-de-damares Acesso em 01/02/2020
[45] Em:
https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/10/25/Quais-as-medidas-concretas-de-Damares-como-ministra Acesso em 20/02/2020
[46]
Idem
[47]
O relatório desta pesquisa de opinião encontra-se em:
https://noticias.portaldaindustria.com.br/noticias/economia/seis-em-cada-dez-industriais-consideram-otimo-ou-bom-o-governo-de-jair-bolsonaro-informa-cni/
Acesso em 06/01/2020
[48]
Em função do arredondamento das porcentagens, em alguns casos, a soma final
chega a apenas a 99% ou atinge 101%. Os
quadros foram produzidos a partir dos gráficos publicados na edição impressa do
jornal Folha de São Paulo em 10/12/2019, pg. A10.
[49]
Estamos nos referindo ao livro de Giuliano da Empoli, Engenheiros do caos –
como as fake news, as teorias da conspiração e os algoritmos estão sendo
utilizados para disseminar ódio, medo e influenciar eleições. Ed. Vestígio,
São Paulo, 2019.
[50]
Em: Daniel Cerqueira e Danilo Santos Cruz Coelho, Redução da idade de
imputabilidade penal, educação e criminalidade, Nota técnica Nº 15, IPEA,
Rio de Janeiro, setembro de 2015. Texto completo em:
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=26248<emid=6 Acesso em 28/01/2020
[51]
Idem.
[52]
Idem
[53]
Dados disponíveis em:
https://g1.globo.com/montor-da-violencia/noticia/2019/09/22/monitor-da-violencia-dois-anos-depois-quase-metde-dos-casos-de-morte-violenta-continua-em-aberto-na-policia.ghtml Acesso em 29/02/2020
[54]
Idem.
[55]
Em: http://noticias.r7.com/educacao/ministro-da-educacao-critica-salario-de-professor-zebra-gorda-27092019 Acesso em 08/01/2020
[56]
Em:
https://g1.globo.com/educação/noticia/2020/02/11/criticado-por-erros-no-enem-ministro-diz-que-grupos-tentaram-impedir-a-realizacao-da-prova.ghtml Acesso em 22/02/2020
[57]
Estamos nos referindo ao nosso texto, publicado em setembro de 2018, com o
título “O que o povo vê em Bolsonaro – Notas de uma reflexão necessária”,
disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1KzIfaGIrVvI1LzRbJqH0_WYn_NJ2uGGB/view?usp=drivesdk
[58]
Em: https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2019/11/casos-de-drogas-citados-por-weintraub-não-tem-elo-com-universidades-federais.shtml
e
https://www.redebrasilatual.com.br/educacao/2019/11/docentes-ufg-stf-abraham-weintraub/
Acesso em 11/01/2020
[59]
Em: Cristiane Sampaio, Como funcionam as escolas que serão militarizadas com
financiamento do governo Bolsonaro. A íntegra do texto encontra-se no
site:
https://www.brasildefato.com.br/2019/11/21/como-funcionam-as-escolas-militarizadas-que-governo-bolsonaro-vai-financiar/
Acesso em 11/01/2020,
[60]
As informações foram extraídas dos sites:
-
https://www.cartacapital.com.br/educacao/mpf-na-bahia-proibe-escolas-militares-de-controlar-vida-dos-estudantes/
-
https://www.redebrasilatual.com.br/educacao/2019/07/escolas-militarizadas-bahia/
Acessos
realizados em 11/01/2020.
[61]
As declarações constam da matéria divulgada no site:
https://www.redebrasilatual.com.br/educacao/2019/07/escolas-militarizadas-bahia/ Acesso em 11/01/2020
[62]
Entrevista extraída de:
https://www.brasildefato.com.br/2019/11/21/como-funcionam-as-escolas-militarizadas-que-governo-bolsonaro-vai-financiar/ Acesso em 11/01/2020
[63]
O acesso a algumas expressões destas polêmicas encontra-se em:
-
https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/relembre-as-polemicas-da-ministra-damares-alves,e39919c669f1a41d9bdc48ec93b867c21a7urtnq.html
-
https://www.brasil247.com/brasil/nucleo-de-politicas-publicas-para-as-mulheres-rechaca-comentarios-mentirosos-de-damares
-
https://matheuspichonelli.blogosfera.uol.com.br/2019/12/19/popularidade-de-damares-alves-precisa-ser-entendida-para-alem-da-caricatura/
-
https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2019/12/damares-privilegia-evangelicos-em-agenda-oficial-de-ministerio.shtml
-
https://istoe.com.br/damares-alves-a-ministra-de-bolsonaro-que-ve-a-vida-em-cor-de-rosa/
-
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/05/12/em-nova-polemica-damares-diz-que-elsa-de-frozen-e-lesbica.htm
-
https://oglobo.globo.com/sociedade/damares-retoma-polemica-sobre-elsa-princesa-de-frozen-ao-reiterar-criticas-ideologia-de-genero-23662734
Todos os acessos foram efetuados em 11/01/2020.
[64]
O vídeo com a fala da Ministra está disponível em:
https://youtu.be/C5ZEbDBNCJ8 Acesso em
13/01/2019.
[65]
Neste sentido, Rubem Alves escreve: “Por trás da opção pela cura divina se
encontra o desespero quanto à cura humana: a inacessibilidade dos agentes de
saúde, o alto custo dos serviços médicos e dos medicamentos, as barreiras
burocráticas que se interpõem entre o doente e a cura. Na cura divina o enfermo
está pelo menos convencido do cuidado pessoal do Grande Médico, em oposição ao
crescente anonimato que caracteriza as relações paciente-médico (especialmente
o paciente pobre)”. Em Rubem Alves, A empresa da cura divina: um
fenômeno religioso? Em: Edênio Valle e José J. Queiroz (Org.) Cultura do
povo, Cortez editora, São Paulo, 1988, 4ª edição, pg. 116.
O documentário
de João Moreira Salles, Santa Cruz, ajuda a entender o processo
de construção e consolidação desta realidade. Disponível em:
https://youtu.be/d-PjHpahJzY
[66]
Nos parágrafos acima, resumimos as principais idéias da visão de mundo das
maiores igrejas evangélicas pentecostais. As mensagens e as formas como são
apresentadas variam a depender das classes sociais dos fieis que freqüentem os
cultos e das diretrizes estabelecidas pelas principais lideranças da igreja. Os
estudos a partir dos quais fundamentamos nossas afirmações são:
- Cristina de
Rezende Rubim, Teologia da Opressão,
Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Antropologia do
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade estadual de Campinas,
Setembro de 1991;
- Ivani
Vasconcelos de Camargo, Rituais de Poder – um estudo comparativo dos rituais
das igrejas pentecostais em São Paulo, Dissertação de Mestrado apresentada
ao Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da
Universidade estadual de Campinas, Maio de 2000;
- Juvêncio
Borges Silva, A Igreja Universal: misticismo e mercado, Dissertação de
Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e
Ciências Humanas da Universidade estadual de Campinas, Agosto de 2000.
[67]
A expressão foi usada no dia 23 de janeiro deste ano, durante o Fórum Econômico
Mundial, em Davos, na Suíça.
Em:
https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/01/23/em-davos-guedes-diz-que-avalia-imposto-sobre-cigarro-alcool-e-produtos-comacucar.ghtml Acesso em 03/03/2020
[68]
O texto completo encontra-se no site:
http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/discursos-artigos-e-entrevistas-categoria/ministro-das-relações-exteriores-artigos/21163-para-alem-do-horizonte-comunista-terca-livre-18-12-2019 Acesso em 14/01/2020
[69]
Em relação ao Programa Bolsa Família é importante lembrar que, em 2019, o
governo cortou 972.000 beneficiários. As vagas por eles deixadas não foram
ocupadas por nenhuma família que engrossou a fila para entrar no programa a
partir de junho do ano passado. Em fevereiro deste ano, o jornal Estado de São
Paulo estimou que a lista de espera contava com cerca de um milhão e meio de
famílias somente entre aquelas que se encontram em situação de extrema pobreza,
ou seja, cuja renda per capita é de, no máximo, R$ 89 mensais. Difícil dizer
quantos deste grupo serão admitidos no Programa, à medida que o orçamento do
Bolsa Família caiu de 32 bilhões e 500 milhões de reais, em 2019, para 29
bilhões e 500 milhões de reais, este ano. Os números apresentados e uma análise
mais detalhada podem ser encontrados em:
https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/02/23/A-fila-do-Bolsa-Fam%C3Adlia.-E-a-redu%C3%A7%C3%A30-de-benefici%C3%A1rios?utm_campaign=anexo&utm_source=anexo Acesso em 03/03/2020.
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